O Tribunal Penal Internacional
Dentro desse espírito foi criado em julho de 1998, pelo Tratado de Roma, o Tribunal Penal Internacional, que tem como função o julgamento de crimes contra a humanidade, quais sejam, genocídio, crimes de guerra, dentre outros.
A idéia de um Tribunal Penal Internacional já foi acatada por 138 Estados, sendo necessário para sua entrada em vigor que, no mínimo, 60 países ratificassem seu Estatuto, o que já aconteceu. A Corte Internacional terá sede em Holanda, e será composta por 18 países. Com o início dos trabalhos do TPI não será mais necessário a criação de Tribunais ad hoc, terminando com as discussões em torno da legitimidade desses tribunais.
Alguns dos institutos previstos pelo TPI que causam maior polêmica são: a entrega de nacionais, a possibilidade de prisão perpétua e a imprescritibilidade de alguns crimes.
No caso brasileiro, a própria soberania nacional, estaria em jogo, uma vez que nossa Constituição Federal é totalmente contrária à entrega de nacionais e a possibilidade de prisão perpétua e, com relação à imprescritibilidade dos crimes, só a admite nos crimes de racismo e a ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.
É certo que tanto a Constituição Federal Brasileira como o TPI, privilegiam a proteção aos direito humanos, porém esse conflito de normas impede a plena aplicação dos termos do tratado, muito embora o Brasil tenha ratificado seu inteiro teor, mesmo porque, não admitia qualquer ressalva para sua aceitação.
O artigo 88 do Estatuto obriga os Estados-partes a criar meios, de aplicação de todas as “formas de cooperação” previstas em seu bojo, entretanto, não há no Direito Pátrio, possibilidade de cumprimento dessas formas de cooperação, já que a Constituição, em seu art. 5º, LI, proíbe expressamente a extradição de brasileiros.
Por não ser, o Tribunal Internacional um Estado, defendem alguns, que a entrega não seria feita a uma nação, mas sim a uma entidade distinta, aceita pelos Estados-membros e dessa maneira, não atentatória à soberania nacional1. Porém, nossa constituição é clara, não permite o julgamento de brasileiros, por crimes praticados dentro do território nacional, fora de nossa jurisdição.
Contudo, não é somente com relação à entrega de nacionais que consiste a impossibilidade de ratificação do TPI pelo Brasil. A questão da prisão perpétua, também impede a ratificação do inteiro teor do Tratado. Esse instituto não pode ser aceito pelo Brasil, uma vez que nossa Carta Magna, proíbe a aplicação de penas que atinjam a dignidade da pessoa humana ou que lesionem a constituição físico-psíquica dos condenados (art. 5o, XLVII, “b” – C. F.). Os defensores da competência internacional, contudo, sustentam que a pena não seria imposta por nações, mas sim por uma instituição de órbita superior de jurisdição, que a competência não alcançaria2.
Com relação à prescrição, é de se tê-la como um instituto historicamente consagrado no Direito Brasileiro, que garante a segurança exigida pelo sistema jurídico nacional, impedindo que o Estado ou a vítima promova a persecução criminal quando bem entenderem. A única exceção a este instituto está nos crimes de racismo, ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático, sendo devidamente explicitados pela Constituição Federal (art. 5o, XLII e XLIV C.F.). Difícil, também, a aceitação da restrição de sua aplicabilidade na esfera internacional.
Desta maneira, os institutos aqui discutidos, para que sejam adequados aos interesses da Corte Internacional, deveriam passar, antes, por uma reforma constitucional, o que não é possível uma vez que se trata de cláusulas pétreas, que não podem ser suprimidas ou revistas nem mesmo por emendas constitucionais (art. 60, § 4o, inciso IV da Constituição Federal).
O estabelecido no Estatuto do Tribunal Internacional, sob uma visão liberal, fere os princípios garantistas norteadores de nossa Constituição, o § 2o do art. 5o da Constituição Federal, garante a possibilidade de se ampliar o rol de direitos e garantias através de tratados internacionais e não de suprimi-los.
A adequação de tais institutos caracterizaria um retrocesso de todas as conquistas da humanidade, e em particular, dos brasileiros, que sangraram para que pudéssemos alcançar o estágio de garantias que nos encontramos, que pode ainda não ser o ideal, porém, é melhor do que foi proposto pelo TPI.
A idéia de um Tribunal Penal Internacional deve ser respeitada, contudo, melhor desenvolvida, para que, um dia, tenhamos um direito universal, sem que se corra o risco de agredir a soberania dos Estados. O Direito Penal Internacional deve ser consagrado, desde que, no entanto, se respeitem os ditames do ordenamento nacional.
Bibliografia:
BITTENCOURT, Cezar Roberto. Prisão Perpétua e o Princípio de Humanidade. www.ceccrim.hpg.ig.com.br
GOMES, Luiz Flávio. Tribunal Penal Internacional: Mais um sonho do século XXI. www.direitocriminal.com.br
STEINER, Sylvia Helena F..O Tribunal Penal Internacional. www.direitocriminal.com.br
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1 “Verifique-se que da obrigação de entregar pessoas à Corte resulta outra das discussões que vêm sendo travadas em nossos meios acadêmicos e oficiais. A discussão centra-se em haver ou não identidade entre o instituto da entrega de pessoas à Corte e o de extradição de pessoas a outros Estados. Há disposição constitucional expressa no sentido de que não podem os brasileiros ser extraditados, nos termos do art. 5º, inc. LI. Pelos termos expressos do Estatuto, extradição e entrega não se confundem, tanto que, havendo concorrência entre ambos, a Segunda prefere à primeira (art. 90,2).” STEINER, Sylvia Helena F.. O Tribunal Penal Internacional. Disponível no site www.direitocriminal.com.br
2 “O art. 77 do Estatuto prevê que a Corte poderá impor aos condenados pena de reclusão, por um determinado período que não pode exceder a trinta anos, ou pena de prisão perpétua... grande é o debate sobre a compatibilidade de tal previsão estatutária com a disposição constitucional inscrita no art. 5º, inc. XLVII, `a', que proíbe a prisão perpétua... é também princípio inscrito no texto constitucional o de que o país se rege, no plano internacional, pela prevalência dos direitos humanos. Cogitar-se da hipótese de que a vedação constitucional dirige-se apenas ao legislador interno, não impedindo assim a submissão do país e de seus nacionais às previsões de uma Corte supranacional, não é de ser afastado de plano. As normas de direito penal da Constituição regulam o sistema punitivo interno. Dá a exata medida do que o constituinte vê como justa retribuição. Não se projeta, assim, para outros sistemas penais aos quais se vincule por força de compromissos internacionais.” Idem, ibdem.
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* Advogado criminalista – especialista em direito penal pela escola superior do ministério público – esmp - pós-graduado em direito penal econômico pela universidade de coimbra – portugal - sp - orientador do núcleo de desenvolvimento acadêmico e da comissão de segurança pública - OAB/AP, professor universitário e membro do escritório D’urso & Borges Advogados Associados
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