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Arbitragem combina com locação

Na última Tribuna do Direito, o ilustre advogado Nelson Kojranski afirma, em artigo muito bem fundamentado, que “locação não combina com arbitragem”. Entretanto, ousamos discordar do grande advogado.

17/11/2008


Arbitragem combina com locação

Flávio Pereira Lima*

Priscila Knoll Aymone*

Na última Tribuna do Direito, o ilustre advogado Nelson Kojranski afirma, em artigo muito bem fundamentado, que "locação não combina com arbitragem". Entretanto, ousamos discordar do grande advogado.

A arbitragem vem ganhando cada vez mais espaço no Brasil. Neste movimento de consolidação, desde o reconhecimento de sua constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal (SE AgR 5206-Espanha) e a posterior ratificação da Convenção de Nova Iorque sobre Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras (Decreto n. 4.311/2002 - clique aqui), a jurisprudência recente dos nossos tribunais tem-se posicionado favoravelmente ao instituto.

A ampliação do escopo da arbitragem não significa, como constou do artigo citado, a banalização da Lei de Arbitragem (clique aqui). Na verdade, a definição do objeto passível de submissão aos árbitros é vasta o suficiente, ainda que circunscrita a "direitos patrimoniais disponíveis" (Lei nº. 9.307/96, art. 1o).

Assim sendo, não há empecilhos para que questões locatícias sejam levadas à arbitragem. Os litígios relativos à locação são dotados de patrimonialidade e disponibilidade pela fruição do bem patrimonial apreciável monetariamente. São exemplos típicos de ações relativas à locação, a ação revisional de aluguel, a ação renovatória e a ação de indenização por benfeitorias. Essas ações envolvem questões eminentemente patrimoniais que poderiam ser resolvidas, de forma extremamente eficaz, por meio de arbitragem.

De fato, são várias as vantagens da arbitragem para apreciar essas questões em relação à via judicial. Entre elas, destacam-se a celeridade versus a morosidade do Poder Judiciário (ainda mais para nós paulistas!), a especialidade dos árbitros escolhidos pelas partes para decidir a controvérsia versus a generalidade da justiça estatal e, até mesmo, a economicidade de custos pela escolha da instituição arbitral apropriada para administrar o procedimento arbitral de acordo com sua complexidade.

Note-se ainda que, até para a ação de despejo, com a característica de procedimento especial, parte condenatório, parte executório, a arbitragem vem sendo reconhecida. A viabilidade da arbitragem, neste caso, é possível por tratar-se, primeiramente, de um processo de conhecimento que culminará na sentença condenatória para prosseguir ou não ao despejo e reaver o imóvel. Veja-se que tanto o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (Ap.Cív. 2008.001.42983, j. 2.9.2008) quanto o de Minas Gerais (Ap.Cív. 402.474-6, j. 27.11.2003) já se pronunciaram nesse sentido. Ambos os tribunais negaram o prosseguimento da ação de despejo, objetivando a rescisão do contrato e o pagamento dos aluguéis e acessórios, com base na existência de uma convenção de arbitragem plenamente válida e eficaz no contrato de locação.

Portanto, perfeitamente cabível que tais questões locatícias sejam julgadas por árbitros que proferirão uma sentença condenatória ao final do procedimento. Tal sentença constitui título executivo judicial que será executada perante as cortes estatais, sendo essa a coordenação e cooperação que se espera entre as duas esferas, arbitral e judicial.

É evidente, todavia, que em algumas Jurisdições as ações de despejo podem ser mais rápidas do que o julgamento por arbitragem. Ainda assim, parece-nos possível compatibilizar e harmonizar arbitragem e Poder Judiciário, excluindo-se do escopo da arbitragem as ações de despejo. Desse modo, as ações de despejo seriam propostas perante o Poder Judiciário e as medidas visando a revisão de valores locatícios, renovação de contratos de locação, indenizações, etc, seriam resolvidas por meio de arbitragem.

Por fim, consideramos que a inclusão de cláusulas compromissórias em contratos de locação pode, sim, ser um excelente mecanismo de solução de conflitos. A conclusão do referido artigo, no sentido de que "a pressa é inimiga da perfeição" não se aplica às várias arbitragens que já participamos e que tiveram soluções rápidas, ponderadas e justas. Para nós, por outro lado, vale a lição de Ruy: "Justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta".

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*Sócio do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados

Advogada do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados

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