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Breves considerações sobre o procedimento legislativo para a legalização da teoria da distribuição dinâmica do ônus probatório no Direito Processual Civil Brasileiro

Conforme é cediço, o Código de Processo Civil pátrio estipula, em seu artigo 333, que ao autor compete demonstrar o fato constitutivo de seu direito, enquanto que ao réu compete demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo desse direito suscitado.

23/7/2008


Breves considerações sobre o procedimento legislativo para a legalização da teoria da distribuição dinâmica do ônus probatório no Direito Processual Civil Brasileiro

Fábio Korenblum*

Conforme é cediço, o Código de Processo Civil (clique aqui) pátrio estipula, em seu artigo 333, que ao autor compete demonstrar o fato constitutivo de seu direito, enquanto que ao réu compete demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo desse direito suscitado.

Em uma visão geral, podemos destacar que esta é a regra geral de distribuição do encargo probatório.

A acepção de tal regra presume que o autor deverá provar os fatos que constituem o seu pretenso direito, mas não a não existência daqueles que impedem a sua constituição, determinam a sua modificação ou sua extinção. Por outro lado, ao réu está imputada a condição de demonstrar a existência de fatos impeditivos, extintivos ou modificativos do direito demandado pelo autor, capaz de afastar a pretensão autoral.

Ressalte-se, ainda, que em conformidade com a regra de distribuição estática do ônus probatório, pode o juiz de ofício determinar a realização de provas, determinação esta que deve obedecer às regras sobre o ônus de sua produção, conforme preconizado no artigo 333 do Código de Processo Civil.

Tal assertiva demonstra a faculdade que o juiz possui para determinar a realização de determinada prova no curso dos autos, apenas e tão somente para a hipótese em que o mesmo se encontre em estado de dúvida, em conformidade com o disposto no artigo 130 do Código de Processo Civil.

Hodiernamente, porém, a visão estática da distribuição do onus probandi vem sido enfraquecida. Estamos diante de uma situação em que a distribuição do ônus probatório deve ser analisada de acordo com o caso concreto.

Em que pese atualmente nos depararmos com diversas hipóteses em que os magistrados, ao se encontrarem diante de uma situação com desequilíbrio de condições probatórias entre as partes, motivadamente (artigo 93, IX CRFB/88 - clique aqui), decidem por alterar a regra de distribuição do ônus da prova ao caso concreto, em tais ocasiões, observamos que o ônus probatório recai sobre a parte que dispuser das melhores condições de provar os fatos submetidos a julgamento.

Observa-se, assim, que a atividade instrutória por parte do julgador tende a diminuir as hipóteses em que seja necessário recorrer às normas de distribuição. Portanto, quando além das partes, o próprio magistrado aplica esforços para a obtenção da prova, a possibilidade de esclarecimentos se mostra superior e, assim, vem a diminuir a necessidade de se recorrer para a distribuição dos encargos do artigo 333 do Código Processual Civil.

Diante da situação fática, doutrinariamente percebeu-se a necessidade de se evitar a existência de julgamentos injustos. Diversos foram os estudos que entendiam pela atribuição do ônus probatório àquele que possui melhores condições de produzi-la, de acordo com o caso concreto. Eis a Teoria da Distribuição Dinâmica do Ônus da Prova.

Ressalte-se, ainda, que a terminologia "dinâmica" utilizada para nomear tal teoria se funda na concepção de que ela visa se adequar aos casos particulares, com o fito de opô-la a uma idéia estática igual para todas as hipóteses, sem observância às circunstâncias especiais.

Atento às alterações existentes, através da qual se vislumbrou que não apenas a doutrina, mas também a própria jurisprudência vem se inclinando para a aceitação da Teoria Dinâmica de Distribuição do Ônus da Prova, o legislador pátrio pretende, agora, legalizar a mencionada teoria.

Para tanto, atualmente está em tramitação junto à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº. 3.015/2008, que propõe, de acordo com o artigo 2º do mencionado projeto, a alteração da redação do disposto no artigo 333 do Código de Processo Civil, para os seguintes termos:

"Art. 333. O ônus da prova incumbe:

I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

§ 1º É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:

I – recair sobre direito indispensável da parte;

II – tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.

§ 2º É facultado ao juiz, diante da complexidade do caso, estabelecer a incumbência do ônus da prova de acordo com o caso concreto." (grifos do autor)

Observa-se, de acordo com a redação do § 2º do dispositivo acima destacado, o perfilhamento do legislador à consagração da Teoria da Distribuição Dinâmica do Ônus Probatório, criando o permissivo legal ao estabelecimento da distribuição das provas de acordo com cada caso concreto.

Notadamente, merece ser traçada uma ressalva à justificação colacionada pelo legislador para a inserção do normativo em nossa legislação. Conforme ressaltado pelo mesmo, são as regras de ônus da prova regras de julgamento, ou seja, aplicadas no momento em que o juiz julgará cada causa.

Diante de tal assertiva, entendo que a nova regra ora estudada deve ser observada como regra procedimental, através da qual o magistrado não poderá aplicar tal regra apenas quando da prolação de sentença. Ao contrário, deverá o julgador, no curso da instrução probatória, apontar o responsável pela produção da prova. Assim, viabilizada à parte a produção da prova em momento oportuno, a esta será permitido o pleno exercício de tal produção, o que seria impossibilitado caso tal regra pudesse vir a ser aplicada apenas quando da prolação da sentença, fator este que acarretaria em manifesta afronta ao exercício da ampla defesa.

Com relação à tramitação do mencionado Projeto de Lei nº 3.015/2008, este se encontra atualmente aguardando parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), uma vez que não foram apresentadas emendas ao Projeto.

Conquanto não aprovado o Projeto de Lei, certo é que, diante do dirigismo processual do qual está investido o magistrado, para a busca da obtenção da verdade real no curso dos processos, a mencionada teoria pode ser aplicada na prática, através da interpretação conjunta do disposto nos artigo 5º, caput, XXXV e LIV, da CRFB/1988 e nos artigos 14, 16, 17, 18, 125, I e III, 339, 340, 342, 345, 355, todos do Código de Processo Civil, corolários dos Princípios da Igualdade, Lealdade, Boa-Fé e Veracidade, Solidariedade com o Órgão Judicial, Devido Processo Legal e Acesso à Justiça.

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*Advogado do setor de Juizados Especiais Cíveis e Relações de Consumo do escritório Siqueira Castro Advogados










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