O inconstitucional cargo de juiz de direito em segundo grau
J. S. Fagundes Cunha*
Alega a Impetrante, no writ, a nulidade do julgamento do apelo pelo Tribunal de origem, haja vista que a Sessão de Julgamento foi majoritariamente composta por juízes convocados, ferindo frontalmente o princípio do juiz natural.
Requer, assim, liminarmente, a expedição de salvo-conduto em favor do Paciente e, no mérito, a concessão da ordem para anular o "julgamento do v. acórdão nº. 5143 da 3ª Câmara Criminal do TJ/PR, para que outro venha a ser realizado por Câmara composta, majoritariamente, por desembargadores titulares".
A liminar pleiteada foi indeferida.
O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem, em parecer que guarda o seguinte sumário, ad litteratim: "Penal e Processual penal. Hábeas corpus. Paciente condenado pelo juízo criminal de 1º grau. Decisão mantida pelo Tribunal de Justiça. Presença de juízes estaduais de 1ª instância na composição da Câmara Criminal Julgadora. Possibilidade. Inexistência de violação ao princípio do juiz natural. Magistrados de carreira. Regulamentação pelo Código de Organização Judiciária. Parecer pela denegação da ordem."
O julgamento foi ementado conforme segue:
Habeas Corpus nº. 101.232 - PR (2008/0046627-4)
Ementa
Habeas Corpus. Processual Penal. Crimes de quadrilha ou bando, receptação e porte ilegal de arma de fogo. Condenação e<_st13a_personname productid="Em Primeiro Grau. Julgamento" w:st="on">m Primeiro Grau. Julgamento de recurso de apelação interposto pela defesa. Desprovimento. Órgão Colegiado. Composição majoritária por juízes convocados. Violação ao princípio do juiz natural. Precedentes.1. Embora não exista impedimento à convocação, autorizada por lei complementar estadual, de Juízes de primeiro grau para compor órgão julgador do Tribunal de Justiça, não pode o órgão revisor ser formado majoritariamente por Juízes convocados, sob pena de violação ao princípio do Juiz Natural.
2. É dos Desembargadores titulares a jurisdição sobre os recursos criminais de competência do Tribunal de Justiça Estadual. A Constituição Federal admite a composição de órgão revisor formado por Juízes de primeiro grau somente para o julgamento dos recursos que versarem sobre crimes de menor complexidade e infrações de menor potencial ofensivo, de competência da Turma Recursal dos Juizados Especiais.
3. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
4. Ordem concedida para anular o julgamento do recurso de apelação, determinando novo julgamento por Câmara composta majoritariamente por Desembargadores titulares. A teor do art. 580 do Código de Processo Penal, estendo os efeitos da decisão aos demais co-réus apelantes.`
O voto da Ministra Laurita Vaz entendeu que a ordem merece concessão. O que acarreta preocupação em relação a precedentes é a fundamentação.
De fato, como afirma o parecer ministerial, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal tem decidido que não ofende o princípio do Juiz Natural a convocação, autorizada por lei complementar estadual, de Juízes de primeiro grau para compor órgão julgador do Tribunal de Justiça Estadual.
Nesse sentido, destacou o seguinte precedente do Pretório Excelso:
"Habeas corpus. Princípio do juiz natural. Relator substituído por Juiz Convocado sem observância de nova distribuição. Precedentes da Corte. 1. O princípio do juiz natural não apenas veda a instituição de tribunais e juízos de exceção, como também impõe que as causas sejam processadas e julgadas pelo órgão jurisdicional previamente determinado a partir de critérios constitucionais de repartição taxativa de competência, excluída qualquer alternativa à discricionariedade. 2. A convocação de Juízes de 1º grau de jurisdição para substituir Desembargadores não malfere o princípio constitucional do juiz natural, autorizado no âmbito da Justiça Federal pela Lei nº. 9.788/99 (clique aqui) 3. O fato de o processo ter sido relatado por um Juiz Convocado para auxiliar o Tribunal no julgamento dos feitos e não pelo Desembargador Federal a quem originariamente distribuído tampouco afronta o princípio do juiz natural. 4. Nos órgãos colegiados, a distribuição dos feitos entre relatores constitui, em favor do jurisdicionado, imperativo de impessoalidade que, na hipótese vertente, foi alcançada com o primeiro sorteio. Demais disso, não se vislumbra, no ato de designação do Juiz Convocado, nenhum traço de discricionariedade capaz de comprometer a imparcialidade da decisão que veio a ser exarada pelo órgão colegiado competente. 5. Habeas corpus denegado."
(HC 86.889/SP,1ª Turma, Rel. Min. Menezes Direito,DJU de 15/2/08)
Todavia, o presente habeas corpus trata de situação fática diversa, o que afasta a incidência do mencionado entendimento.
É sabida a atuação de três Desembargadores nos órgãos fracionados dos Tribunais de Justiça, encarregados de apreciarem o recurso de apelação.
No caso, a Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, embora presidida por Desembargador, era composta somente por Juízes convocados. Assim, quando do julgamento do apelo defensivo, atuaram um Desembargador (Presidente sem voto) e dois Juízes de primeira instância, sendo que estes funcionaram como relator e revisor, examinando o processo, formando convencimento e prolatando os votos.
Ora, a despeito de não haver impedimento à convocação de Juízes de primeiro grau para atuarem no Tribunal de Justiça, a composição majoritária da Câmara por juízes convocados afronta o princípio do juiz natural.
Com efeito, assevera o voto, que nos termos dos artigos 93, inciso III, e 94, c.c. art. 98, inciso I, da Constituição Federal (clique aqui), a jurisdição para o julgamento de recursos de competência do Tribunal de Justiça pertence aos Desembargadores titulares. A própria Carta Magna restringe a competência de órgão revisor formado por Juízes de primeiro grau, ao julgamento recursos que versarem sobre crimes de menor complexidade e infrações de menor potencial ofensivo, no âmbito da Turma Recursal dos Juizados Especiais.
Confira-se:
"Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;"
Nesse sentido, já se pronunciou este Superior Tribunal de Justiça:
"Processual Penal. Habeas Corpus. Câmara formada majoritariamente por juízes de Primeiro Grau convocados. Violação ao princípio do Juiz Natural. Ocorrência. Recurso <_st13a_personname productid="Em Sentido Estrito. Julgamento." w:st="on">em sentido estrito. Julgamento. Falta de intimação pessoal do Defensor Público. Nulidade. Ocorrência. Ordem Concedida.
1. Nulos são os julgamentos de recursos proferidos por Câmara composta, majoritariamente, por juízes de primeiro grau, por violação ao princípio do juiz natural e aos artigos 93, III, 94 e 98, I, da CF.
2. É nulo o julgamento do recurso em sentido estrito em que não houve a intimação pessoal do defensor público.
3. Ordem concedida para anular o julgamento."
(HC 72941/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura, DJ de 19/11/07.)
"- Penal. Habeas Corpus. Tribunal De Justiça. Órgão Fracionário Insuficientemente Composto. Nulidade. Embargos Infringentes. Apelação.
- Nulos são os julgamentos de recursos proferidos por Turma composta, majoritariamente, por juízes de Primeiro Grau.
- Ordem concedida."
(HC 9405/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Rel. p/ Acórdão Min. William Patterson, DJ de 18/6/01.)
Ante o exposto, concedida a ordem para anular o julgamento do recurso de apelação, determinando novo julgamento por Câmara composta majoritariamente por Desembargadores titulares. A teor do art. 580 do Código de Processo Penal, estendo os efeitos da decisão aos demais co-réus apelantes, com a ressalva da vedação da reformatio in pejus indireta, quanto ao apelante Alexandre de Macedo Carvalho.
Diante de tal quadro, em breve reflexão, o cargo de Juiz de Direito Substituto <_st13a_personname productid="em Segundo Grau" w:st="on">em Segundo Grau se me afigura inconstitucional.
Se o julgamento <_st13a_personname productid="em Segundo Grau" w:st="on">em Segundo Grau é, em princípio, privativo dos Desembargadores, consoante os critérios constitucionais de preenchimento dos cargos, alternadamente por merecimento e por antiguidade, por promoção, o cargo deveria ser de Desembargador Substituto, como soe acontecer com os Juízes Substitutos (em entrância inicial ou primeira entrância), Juízes de Direitos Substitutos (comarcas de entrância final) e, por conseqüência Desembargadores Substitutos.
O preenchimento do cargo de Juiz de Direito Substituto por remoção não atende os requisitos legais, posto que muitos deixam de concorrer, cientes de que os Juízes de Direito Substitutos <_st13a_personname productid="em Segundo Grau" w:st="on">em Segundo Grau tem um gabinete sem condições adequadas, recebendo distribuição quando em substituição, com uma expressiva produtividade.
Os princípios constitucionais que norteiam o preenchimento de cargo de Desembargador, que é quem deve ser o juiz natural de Segunda Instância e, por conseqüência, como soe acontecer <_st13a_personname productid="em Primeira Instância" w:st="on">em Primeira Instância, o substituto deve ser da mesma entrância.
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*Juiz de Direito <_st13a_personname productid="em Segundo Grau" w:st="on">em Segundo Grau do TJ/PR
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