I - Introdução
As reformas tributárias têm sido um tema recorrente na agenda econômica global, prometendo eficiência, equidade e crescimento. No entanto, a distância entre a teoria e a prática muitas vezes se revela um abismo intransponível. Esta resenha propõe uma análise crítica das tendências globais de reforma tributária, com foco especial no caso brasileiro, questionando a eficácia e a aplicabilidade dessas reformas em contextos diversos.
II - O mito da convergência global
A OCDE tem promovido ativamente a ideia de uma convergência global em direção a sistemas tributários "ideais". Contudo, essa visão frequentemente ignora as disparidades econômicas e sociais entre nações. A redução generalizada de alíquotas corporativas, por exemplo, pode ser benéfica para economias avançadas, mas potencialmente prejudicial para países em desenvolvimento que dependem crucialmente dessa receita.
III - América Latina: O desafio da desigualdade
Na América Latina, incluindo o Brasil, as reformas tributárias enfrentam o desafio adicional de combatera desigualdade histórica. A região apresenta:
- Coeficiente de Gini médio de 0,46;
- 40% da força de trabalho no setor informal;
- Sistemas tributários regressivos.
Nesse contexto, a simples importação de modelos da OCDE pode exacerbar, em vez de resolver, problemas estruturais.
IV - O caso brasileiro: Complexidade como sintoma, não causa
O sistema tributário brasileiro é notoriamente complexo, com mais de 60 tributos diferentes. No entanto, argumenta-se aqui que essa complexidade é um sintoma de problemas mais profundos, não sua causa principal. A complexidade reflete:
- Federalismo fiscal desequilibrado;
- Desigualdades regionais persistentes;
- Conflitos de interesse entre grupos econômicos.
A simplificação, embora necessária, não é suficiente para abordar essas questões fundamentais.
V - Crítica às propostas atuais
As propostas de reforma no Brasil, como a unificação de impostos em um IVA, são passos na direção certa, mas insuficientes. Elas falham em:
- Abordar adequadamente a tributação da riqueza;
- Propor uma verdadeira progressividade fiscal;
- Considerar os impactos distributivos a longo prazo.
VI - Uma visão alternativa
Propõe-se aqui uma abordagem mais holística e contextualizada:
- Reforma progressiva: Implementar uma estrutura verdadeiramente progressiva, incluindo impostos sobre grandes fortunas e heranças, por região (alguns continentes sim, outros, não).
- Federalismo cooperativo: Redesenhar o pacto federativo fiscal para reduzir disparidades regionais.
- Formalização inteligente: Criar incentivos para a formalização da economia, sem penalizar pequenos empreendedores.
- Tributação verde: Introduzir impostos ambientais significativos, alinhados com metas de sustentabilidade.
- Tecnologia fiscal: Investir em tecnologia para simplificar a conformidade e combater a evasão fiscal.
VII - Considerações
As reformas tributárias são necessárias, mas devem ser pensadas além dos modelos padronizados da OCDE. O Brasil, assim como outros países em desenvolvimento, precisa de uma abordagem que considere suas especificidades históricas, sociais e econômicas. Só assim poderemos construir um sistema tributário que não apenas arrecade eficientemente, mas também contribua para uma sociedade mais justa e sustentável. A verdadeira reforma não está apenas na simplificação ou na convergência com padrões internacionais, mas na coragem de repensar fundamentalmente o papel da tributação no desenvolvimento nacional. É hora de uma visão mais ousada e transformadora, que vá além dos ajustes incrementais e aborde as raízes da desigualdade e da ineficiência econômica.