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Empresas de um mesmo grupo econômico ou cujos sócios em comum tenham relação de parentesco podem participar do mesmo processo licitatório?

Leis sobre licitações não proíbem explicitamente a participação de empresas do mesmo grupo econômico ou com sócios parentes no mesmo certame. O TCU considera que isso não é irregular, a menos que haja fraude comprovada.

23/8/2024

Nem a lei 8.666/93, nem a sua sucessora, a lei 14.133/21 e, muito menos a lei 13.303/16 trataram expressamente sobre a hipótese de, num mesmo certame, estarem a competir empresas de um mesmo grupo econômico ou cujos sócios em comum tenham relação de parentesco.

Diante do vácuo legislativo, repetimos a pergunta do título: Empresas de um mesmo grupo econômico ou cujos sócios em comum tenham relação de parentesco podem participar do mesmo processo licitatório?

Bom, de imediato diga-se que o Tribunal de Contas da União entende que a participação em processo licitatório de empresas do mesmo grupo econômico ou cujos sócios em comum tenham relação de parentesco não constitui, só por si, irregularidade. Neste sentido:

"Não existe vedação legal à participação, no mesmo certame licitatório, de empresas do mesmo grupo econômico ou com sócios em relação de parentesco, embora tal situação possa acarretar quebra de isonomia ente as licitantes. A demonstração de fraude à licitação exige a evidenciação do nexo causal entre a conduta das empresas com sócio sem comum ou em relação de parentesco e a frustração dos princípios e dos objetivos da licitação (...)" (TCU, Acórdão 2.803/16 - Plenário, Representação, relator ministro Substituto André de Carvalho)

No âmbito do Sistema Tribunais de Contas, há TCs dos entes subnacionais que adotam entendimento idêntico ao do TCU, como por exemplo os Tribunais de Contas de Pernambuco e do Mato Grosso do Sul:

"(...) a participação em processo licitatório de empresas do mesmo grupo econômico ou cujos sócios em comum tenham relação de parentesco não constitui, só por si, irregularidade (...) a simples presença de sócios em comum não constitui conduta vedada pelo ordenamento jurídico. Tampouco é elemento suficiente para se concluir pela ocorrência de fraude à licitação (...)" (TCE/PE, Acórdão 984/24 – Segunda Câmara, Processo: 20100162-7, Data da Sessão: 20/6/24, relator: Ruy Ricardo Harten)

“A simples existência de relação comercial, amizade ou parentesco entre sócios de distintas empresas ou sócios em comum não demonstra, automaticamente, a caracterização de fraude pela participação dessas empresas numa mesma licitação, fazendo-se indispensável a demonstração da prática de ato com intuito de frustrar ou fraudar o caráter competitivo da licitação. Inexistindo nas condutas reportadas relevância jurídica compatível com o comprometimento do certame, a denúncia merece improcedência, que enseja o arquivamento do processo” (TCE/MS, Acórdão 2.213/22 – Pleno, Processo: TC/5.696/21, relator: Conselheiro Osmar Domingues Jeronymo)

Saindo do Sistema Tribunal de Contas, o cenário no âmbito do Poder Judiciário não é diferente, conforme se pode ver abaixo:

“I. Não se depura do exame da legislação correlata a existência de vedação apriorística quanto à participação de licitantes com sócios em comum, ou com relação de parentesco, em um mesmo procedimento licitatório. II. Neste jaez, aflora que a alegativa de quebra de isonomia entre os participantes, com prejuízo do caráter competitivo do processo de seleção da proposta, depende de demonstração concreta, colhida do exame da prova documental pré-constituída nos autos. III. Não evidenciada a circunstância da violação a princípios administrativos, ou mesmo frustração da competitividade do procedimento licitatório, não há que se cogitar a anulação do certame.” (TJGO, 5478981.60.2017.8.09.0036, REEXAME NECESSÁRIO E RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL, AMÉLIA MARTINS DE ARAÚJO - (desembargador),1ª Câmara Cível, Publicado em 25/4/19)

Todavia, cabe registrar que a participação de empresas distintas com sócios em comum já foi objeto de algumas ressalvas por parte do TCU, como por exemplo quando das hipóteses de convite ou de dispensa de licitação:

“a legislação que regula a realização de procedimentos licitatórios não veda explicitamente a participação de empresas com sócios em comum. Todavia, este Tribunal já considerou irregular a participação de empresas com sócios comuns em licitações nos seguintes casos: quando da realização de convites; quando da contratação por dispensa de licitação; quando existe relação entre as licitantes e a empresa responsável pela elaboração do projeto executivo; quando uma empresa é contratada para fiscalizar o serviço prestado por outra, cujos sócios sejam os mesmos” (TCU, Acórdão 297/09 - Plenário, Representação, relator ministro Marcos Vinicios Vilaça)

No âmbito das orientações proferidas pelo Poder Executivo, trazemos à consideração o entendimento da Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco no sentido de que a apuração da existência de fraude em razão da participação em processo licitatório de empresas do mesmo grupo econômico ou cujos sócios em comum, há de ser feita caso a caso e apurada pelos responsáveis pela condução dos procedimentos licitatórios:

"Conforme tese desenvolvida no Parecer PGE 937/17, lastreado na jurisprudência do TCU (Acórdãos 526/13 e 2.341/11—Plenário), dada a ausência de previsão legal, os editais de licitação não podem impedir, a priori, a participação de licitantes com sócio em comum ou de integrantes de um mesmo grupo econômico. A vedação prévia à participação simultânea de empresas pertencentes a sócios comuns somente se mostra legítima, à luz dos princípios da Administração, nos casos em que referida atuação puder alijar do certame outros potenciais participantes (como na hipótese de Convite e das contratações diretas, quando solicitadas propostas em universo reduzido de possíveis fornecedores), bem com nos casos em que haja relação societária entre as licitantes e a empresa responsável pela elaboração do projeto executivo ou na contratação de uma das empresas do grupo para fiscalizar serviço prestado por outra. Em caso de efetiva participação, numa mesma licitação, de empresas com sócios comuns ou integrantes de grupo econômico, isso, por si só, não configura ilegalidade ou conluio. Tal fato, todavia, ser cuidadosamente avaliado, não de forma isolada, mas juntamente com outros fatores que possam ser reputados como indícios de fraude à licitação. Nesse sentido, recomendou esta Procuradoria Geral do Estado, no bojo do citado parecer: 'Para apuração de eventual existência de conluio por integrantes de um dado grupo econômico, formalizado ou não, devem os responsáveis pela condução dos procedimentos licitatórios – na linha recomendada pelo TCU no Acórdão 2.341/11 – verificar a composição societária dos licitantes (a fim de verificar se há grupo econômico de direito), bem como os respectivos endereços (físico/virtual), telefones, procuradores e outras circunstâncias indicativas da existência de grupo econômico de fato (utilização de mesmo contador e/ou mesmo responsável técnico, utilização de documentos emitidos pelos mesmos profissionais, indicação de procuradores/representantes em comum, relação de parentesco entre sócios, apresentação de lances originários de um mesmo endereço IP), avaliando tais circunstâncias em conjunto com outros fatores que fatores que possam indicar atuação fraudulenta (tais como desistência de proposta, não entrega de documentos simples para ‘forçar’ inabilitação, enquadramento indevido como ME/EPP para vencer cotas exclusivas/reservadas, apresentação de atestados de qualificação técnica fornecidos por integrantes do mesmo grupo etc.)'. (Precedente: Parecer PGE 937/17)" (Vide Boletim Informativo de Licitações e Contratos 02/18)

Assim, respondendo ao questionamento feito no título, podemos concluir o seguinte: desde que inexistam outros elementos além da participação por si só em processo licitatório de empresas do mesmo grupo econômico ou cujos sócios em comum tenham relação de parentesco (algo que precisa ser apurado pelos responsáveis pela condução do processo de licitação), não haverá ilegalidade no certame.

Aldem Johnston Barbosa Araújo
Advogado em Mello Pimentel Advocacia. Membro da Comissão de Direito à Infraestrutura da OAB/PE. Especialista em Direito Público.

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