O CARF - Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, órgão colegiado administrativo vinculado ao Ministério da Fazenda, desempenha um papel crucial no julgamento de recursos contra decisões proferidas em primeira instância sobre a aplicação da legislação tributária. Historicamente, o CARF caracterizou-se pela composição paritária de seus membros, com igual número de conselheiros representando tanto os contribuintes quanto a Fazenda Nacional.
A mecânica do "voto de qualidade", onde o voto de desempate cabia ao Presidente do colegiado, um representante da Fazenda, foi instituída pela MP 449/08, incorporada ao art. 25, § 9º do decreto 70.235/72. Essa prática, por longo tempo, gerou controvérsias, sendo percebida como uma vantagem processual conferida ao Fisco, em detrimento da equidade entre as partes.
A questão do voto de qualidade e sua consonância com os princípios da justiça e imparcialidade no julgamento administrativo tributário foi amplamente debatida no meio jurídico. Em 14/4/20, uma mudança legislativa significativa ocorreu com a promulgação da lei 13.988/20, que inseriu o art. 19-E na lei 10.522/02. Este artigo estabeleceu que, em casos de empate nos julgamentos do CARF, a decisão deveria ser resolvida em favor do contribuinte, eliminando assim o voto de qualidade pró-Fazenda.
Essa alteração legislativa não apenas refletiu um movimento de reequilíbrio nas relações entre contribuintes e Fazenda Nacional mas também inaugurou um novo capítulo no contencioso administrativo tributário federal. O fim do voto de qualidade foi recebido por uns como uma medida de fortalecimento da segurança jurídica e da imparcialidade dos julgamentos administrativos, enquanto outros viram na mudança um potencial risco à arrecadação tributária e ao combate à sonegação fiscal.
A ADI 6.403 constitui um marco na discussão sobre o voto de qualidade no CARF. Ingressada pelo PSB - Partido Socialista Brasileiro, a ADI questiona a constitucionalidade da lei 13.988/20, que aboliu o voto de desempate proferido pelo presidente das turmas do CARF, tradicionalmente um representante da Fazenda Nacional, em casos de empate nos julgamentos do conselho.
Essa legislação, ao modificar o critério de desempate, estipulou que, na ocorrência de empates em julgamentos de processos administrativos de determinação e exigência do crédito tributário, a decisão será resolvida em favor do contribuinte, eliminando o chamado "voto de qualidade". A alteração legislativa foi vista por alguns setores como um avanço na direção da equidade e da justiça fiscal, ao passo que foi criticada por outros, que a interpretaram como potencialmente prejudicial à arrecadação tributária e ao combate à sonegação fiscal.
O cerne da controvérsia jurídica subjacente à ADI 6.403 gira em torno de várias questões constitucionais, incluindo a alegação de violação ao princípio da separação dos poderes, ao devido processo legislativo, e à reserva de lei complementar para tratar de normas gerais em matéria tributária. Ademais, discute-se a adequação da medida em face dos princípios da capacidade contributiva e da isonomia tributária.
A ADI 6.403 coloca em xeque não apenas aspectos técnicos do processo administrativo tributário, mas também princípios fundamentais do direito tributário e da administração pública. O questionamento perante o STF evidencia a complexidade das relações entre o Estado, na figura da Fazenda Pública, e os contribuintes, sob a ótica da legalidade, da legitimidade e da justiça das decisões administrativas tributárias.
A mudança normativa e seu impacto - A lei 13.988/20 e o fim do voto de qualidade
Essa prática histórica do voto de qualidade foi instituída com o objetivo de solucionar impasses em casos de empate nas decisões do CARF, entretanto, gerava críticas por parte dos contribuintes e de especialistas em direito tributário, que viam nesse mecanismo uma predisposição favorável aos interesses fiscais do Estado.
A alteração promovida pela lei 13.988/20 veio após intensos debates sobre a necessidade de garantir maior equidade e imparcialidade nos julgamentos administrativos tributários. Com a nova legislação, em situações de empate nas votações do CARF, a decisão é agora resolvida em favor do contribuinte, ao invés de seguir a antiga regra do voto de desempate pelo representante da Fazenda Nacional. Esse movimento legislativo foi interpretado como uma medida de fortalecimento dos princípios de justiça fiscal e segurança jurídica, alinhando o Brasil a práticas internacionais de resolução de disputas tributárias.
A inclusão do art. 19-E na lei 10.522/02, por meio da lei 13.988/20, não apenas modificou a regra de desempate, mas também suscitou discussões sobre o impacto dessa mudança na arrecadação tributária e na dinâmica de litígios fiscais no país. Críticos da medida expressaram preocupações com possíveis perdas na arrecadação federal e um incentivo ao aumento do contencioso tributário, argumentando que a nova regra poderia encorajar contribuintes a adotar posturas mais litigiosas, antecipando um possível resultado favorável em caso de empate nos julgamentos.
Por outro lado, defensores da lei 13.988/20 argumentam que a eliminação do voto de qualidade corrige uma assimetria anteriormente existente no processo administrativo tributário, proporcionando um ambiente de julgamento mais equânime e transparente. Adicionalmente, sustentam que a medida pode contribuir para a redução da litigiosidade tributária de longo prazo, ao incentivar a Fazenda Nacional a apresentar casos com maior solidez jurídica, sabendo que não poderá contar automaticamente com um voto de desempate a seu favor.
Repercussões da MP 1.160/23: Uma nova era para o CARF?
A MP 1.160/23, ao restaurar o voto de qualidade proferido por representantes da Fazenda Nacional, reacende debates acerca da equidade e da imparcialidade no processo administrativo fiscal. A medida é justificada pelo governo como um esforço para garantir a eficiência na arrecadação tributária e combater a sonegação fiscal. No entanto, essa justificativa enfrenta resistências por parte de contribuintes e especialistas em direito tributário, que veem na medida um retrocesso em termos de justiça fiscal e segurança jurídica.
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