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Os novos princípios do sistema tributário nacional e a reforma tributária

A reforma tributária introduziu 6 novos princípios no Sistema Tributário Nacional, refletindo a evolução do relacionamento entre Estado e contribuintes, visando à justiça fiscal e à proteção ambiental. Essa mudança reflete a transição de um sistema baseado na autoridade estatal para um mais democrático e transparente.

11/6/2024

Dentre as diversas inovações trazidas pela reforma tributária, temos uma bastante interessante, e que está relacionada com a organização e posicionamento das normas no ordenamento jurídico fiscal: A criação de 6 novos princípios no Sistema Tributário Nacional, em matérias bastante sensíveis aos contribuintes e a sociedade contemporânea. Contudo, para melhor compreendermos a importância da inserção dos referidos princípios no art. 145, parágrafos terceiro e quarto da Constituição Federal, pela Emenda Constitucional 132, de 20/12/23, precisamos observar como se consolidou a legislação tributária ao longo dos anos.

Nosso Código Tributário Nacional, veiculado pela lei 5.172, de 25/10/66, foi elaborado durante o período militar, refletindo em seu conteúdo, um relacionamento formal e baseado na autoridade do Poder Público em face dos contribuintes. Tal situação começou a ganhar novos ares com a Constituição Federal, promulgada em 5/10/88, a qual tornou o Brasil um Estado Democrático de Direito, dotado de objetivos fundamentais como por exemplo, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais.

A Constituição Federal inaugurou um novo regime para a atividade produtiva reconhecendo também a função social da empresa, em seu art. 170, inciso III, que se condensa em sua responsabilidade na contribuição para a sociedade além do lucro. A atividade empresarial, desta maneira, se vincula a promoção da igualdade, a criação de empregos, o respeito ao meio ambiente, de uma forma leal e ética. A reforma tributária possui, portanto, impactos diretos na atividade empresarial e nas relações da iniciativa privada com a administração fazendária.

Com a redemocratização, o relacionamento entre Fisco e os contribuintes, em especial com o empresariado, começou a se modificar, e a tributação começou a ser encarada como uma das bases da democracia, pois é com os recursos obtidos junto a população e às empresas, que o Estado mantém as suas atividades e disponibiliza serviços públicos. O diálogo entre segurança jurídica e princípios tipicamente de proteção do cidadão, tais como a isonomia e a capacidade contributiva, ganha corpo na jurisprudência e na legislação.

A inserção de 6 novos princípios no texto constitucional, assim, reflete a tendência cada vez maior de racionalizar a atividade arrecadatória estatal, tornando-a como uma contrapartida natural ao exercício dos direitos e fruição de serviços, tais como segurança pública, saúde, educação, dentre outros, insculpidos na carta cidadã.

Muito embora o CTN, em seus incisos II e III do art. 108, fizessem menção aos princípios gerais de Direito tributário e de direito público, e o art. 109 mencionasse os princípios gerais de direito privado, não havia uma indicação expressa e literal, tal como ocorre com a nova redação do parágrafo terceiro do art. 145 da Constituição Federal. O referido dispositivo de nossa Carta Magna passou a afirmar textualmente que o Sistema Tributário Nacional deve observar os princípios da simplicidade, da transparência, da justiça tributária, da cooperação e da defesa do meio ambiente, e seu parágrafo quarto afirma que as alterações na legislação tributária buscarão atenuar efeitos regressivos. Trata-se de inovação do texto constitucional, não repetida no CTN.

Portanto, além dos já tradicionais princípios tributários da legalidade, isonomia, capacidade contributiva, irretroatividade da lei tributária, anterioridade, e do não-confisco, a EC 132/23 inseriu no parágrafo terceiro do art. 145 de nossa Constituição Federal os novos princípios da simplicidade, da transparência, da justiça tributária, da cooperação e da defesa do meio ambiente, e o da atenuação dos efeitos regressivos, no parágrafo quarto. É importante destacarmos que os novos princípios, mais do que normas jurídicas, veiculam compromissos do Sistema Tributário Nacional com uma atividade arrecadatória mais eficiente, transparente e inclusiva, com fortes traços de inclusão e consenso junto aos contribuintes. Vejamos de maneira breve o conteúdo de cada um deles.

O princípio da simplicidade determina que tanto a criação de tributos, quanto a fiscalização das obrigações tributárias principais e acessórias, devem se pautar pela clareza e pela praticidade, ou seja: É essencial sempre facilitar o cumprimento dos deveres dos contribuintes, buscando ao máximo as formas menos onerosas e menos complexas possíveis de atuação.

A ideia de transparência não é nova na Administração Pública, já sendo objeto de tutela em diversos ramos do direito, não se limitando a divulgação de informações orçamentárias ou de políticas públicas. Trata-se, principalmente, de conferir legitimidade a todas as medidas do Poder Público diminuindo a distância entre a população e o Estado. 

No âmbito tributário, o novo princípio da transparência possui estrito relacionamento com a facilitação do acesso às melhores práticas fiscais, à legislação tributária e à disponibilização de informações sobre benefícios fiscais e sobre as obrigações principais e acessórias.

Já o princípio da justiça tributária determina que o processo de arrecadação fiscal deve se mostrar justo e isonômico para todos os contribuintes e para a Fazenda Pública, observando critérios de igualdade, capacidade contributiva e não confisco. John Rawls já se debruçou sobre esta matéria, a afirmar que um sistema tributário justo é aquele que estimula a dispersão da riqueza e evita acumulações de capital e renda consideradas excessivas, preservando assim a justiça social e o desenvolvimento econômico intergeracional.

Por sua vez, o princípio da cooperação conduz o relacionamento entre contribuintes e Fisco em direção a consensualidade na resolução de conflitos, reduzindo os traços adversarias da resolução de litígios. A Fazenda Pública, em um contexto de cooperação com os particulares, busca reduzir sensivelmente sua característica autoridade punitivista e assumir uma posição de colaboração de forma horizontal com as empresas. Em especial em atividades tais como a redução da carga tributária, eficiência fiscal e respeito mútuo na disponibilização de informações.

A sustentabilidade e a preservação do ecossistema ganham papel de destaque em matéria fiscal com o princípio da proteção ao meio ambiente, dotado de elevados graus de extrafiscalidade. O referido princípio busca incentivar a proteção ao meio ambiente sustentável, bem como o desestímulo a quaisquer práticas danosas aos recursos naturais e aos biossistemas.

O princípio da proteção ao meio ambiente será implementado na prática por meio de medidas como a tributação específica de atividades ou produtos prejudiciais ao meio ambiente, com o incentivo fiscal a práticas ambientalmente sustentáveis, com a desoneração fiscal de produtos ecológicos, bem como com a cobrança de taxas e pela extração de recursos naturais, ou por impactos causados ao meio ambiente.

Por fim, no parágrafo quarto temos a inserção do princípio da atenuação dos efeitos regressivos, que em matéria fiscal busca mitigar os traços de alguns tributos cuja incidência tende a onerar mais gravosamente contribuintes de menor renda, o que deve ser evitado com a reforma tributária.

A grande expectativa do meio jurídico e do empresariado em relação a reforma tributária, no fim das contas, é que na prática a tributação da atividade produtiva seja simplificada e os custos reduzidos. Caso a vontade do legislador ao trazer os valores representados pelos novos princípios inseridos no texto constitucional venha a se concretizar no dia a dia, estaremos no caminho certo. 

Paulo Roberto Vigna
Advogado, sócio do escritório Vigna Advogados Associados e da VignaTax Consultoria Fiscal e Tributária, Mestre em Relações Sociais do Direito, com MBA em Gestão de Empresas pela FGV.

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