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Laudo de constatação nos crimes contra a ordem econômica?

Direito Penal divide-se em criminalidade cotidiana e delitos econômicos, como "white collar crime". Apesar das diferenças, a verificação da materialidade do crime é comum a ambas as áreas.

9/6/2024

Os juristas que integraram os bancos acadêmicos das últimas duas décadas, aproximadamente, já estão familiarizados com a separação do Direito Penal em duas grandes áreas, denotando a divergência de entendimentos jurisprudenciais e doutrinários aplicados a cada uma delas, vez que uma se refere-se à criminalidade cotidiana – de sangue ou de rua -, e a outra aos delitos econômicos – de colarinho branco.

Neste contexto, um sujeito chamado Edwin Sutherland notabilizou-se por popularizar o termo “white colar crime”, referindo-se aos delitos cometidos pela alta sociedade, notadamente por executivos no exercício da atividade empresarial, em uma referência jocosa as roupas sociais utilizadas no ambiente corporativo.

Desta forma, separou-se o estudo do direito penal, influenciando a prática cotidiana dos operadores da ciência jurídica, vez que o chamado Direito Penal Econômico guarda posicionamentos jurisprudenciais singulares, que divergem daqueles aplicados no âmbito comum para infrações como roubo, furto e homicídio.

Destaca-se, todavia, a interseção necessária que deve ser observada entre as duas práticas, apesar das suas divergências, atinente à verificação da materialidade do crime – isto é, atestar se o fato que viola a lei penal realmente existiu.

Isto porque, no que pese as infrações penais guardarem relações de exclusividade quanto ao seu modo de exteriorização e impacto, ambas demandam um processo de constatação acerca de sua existência.

Melhor explicando, o crime de tráfico de drogas demanda um exame pericial para que seja certificada a natureza do material entorpecente que estaria sendo vendido, com a finalidade de verificar se o que foi apreendido com o suposto criminoso é, realmente, um narcótico.

Os cuidados para averiguar o que de fato é a substância apreendida são imprescindíveis no ordenamento jurídico brasileiro, inclusive para que se efetive a prisão do agente, considerando o risco de se estar diante de rapaduras acondicionadas e vendidas como drogas fossem – como já se sucedeu.

Compreendidos os apontamentos atinentes à constatação da existência do crime, é possível fazer um paralelo do que fora explicado com os crimes econômicos, em especial aquele previsto no art.2º e §1º da lei 8.176/91, que criminaliza a conduta de usurpar – utilizar indevidamente, sem autorização – patrimônio da União.

Aspecto mais técnico acerca do delito em comento é o fato de que a definição de bens que integram o patrimônio da União – os quais poderiam constituir o crime de usurpação – está descrito em outra norma, o art.3º da lei 9.478/97, inserindo combustíveis derivados de petróleo neste rol, o que demanda autorização para a sua extração e circulação.

Nesta linha, nota-se que é crime contra a ordem econômica transportar combustível derivado de petróleo sem autorização, de acordo com o que se extrai das leis que regem a conduta, anteriormente mencionadas.

Outrossim, denota-se que a mesma lógica aplicada ao delito de tráfico de drogas – comercializar drogas – também se verifica no crime em análise – inclusive no que no tocante à exigência de laudo  de constatação para prisão em flagrante -, de forma que seria necessária a perícia competente para aferir se o que fora apreendido com o agente é, de fato, um combustível derivado de petróleo, e não simplesmente um líquido de procedência duvidosa.

Entretanto, verificar se realmente o que está sendo usurpado na conduta é um patrimônio da União não é a disciplina legal adotada pelos Tribunais Superiores, e a lei silencia neste sentido, razão pela qual uma remodelagem faz-se necessária a fim de alinhar as lógicas procedimentais aplicadas no âmbito do Direito Penal Comum e Econômico, no que couber.

Leonardo Tajaribe Jr.
Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM).

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