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O cancelamento da transação tributária não impede nova adesão imediata

A lei 13.988/20 trata da transação tributária entre fisco e contribuinte. A rescisão da transação ocorre por descumprimento das condições ou cláusulas e impede nova transação por 2 anos. Porém, o cancelamento da transação não impõe essa sanção, permitindo nova transação imediatamente.

16/5/2024

No plano federal, a lei 13.988/20 dispõe sobre a transação tributária a ser realizada entre fisco e contribuinte.

Os incisos I e VII do art. 4º dessa lei estabelecem, respectivamente, que implica a rescisão da transação (I) o descumprimento das condições, das cláusulas ou dos compromissos assumidos, e (VII) a inobservância de quaisquer disposições desta lei ou do edital.

A consequência da rescisão da transação é o impedimento, pelo prazo de 2 anos, de formalização de nova transação, ainda que relativa a débitos distintos, conforme § 4º do art. 4º da lei 13.988/20.

Embora a rescisão da transação provoque a sanção acima, o cancelamento da transação parece não atrair a mesma consequência, especialmente no que diz respeito à transação por adesão.

Por essa perspectiva, contribuintes com transação por adesão cancelada podem celebrar nova transação imediatamente após o cancelamento, independentemente do transcurso do prazo de 2 anos.

No plano infralegal, alguns elementos sinalizam que os efeitos da rescisão da transação distinguem-se dos efeitos do cancelamento da transação.

A esse respeito, o Edital PGDAU 2, de 10/5/24, que versa sobre a transação por adesão, estabelece duas etapas para a liquidação do passivo.

A primeira etapa envolve o pagamento parcelado de entrada, calculada a partir de determinado percentual incidente sobre o montante total do débito, sem reduções.

A segunda etapa envolve o pagamento parcelado do saldo restante, podendo haver reduções de juros e multas.

De acordo com o art. 11 do Edital PGDAU 2/24,1 a não quitação da entrada ou o inadimplemento de 3 prestações consecutivas ou alternadas provoca o cancelamento do pedido de transação.

O inciso II do art. 12 desse Edital prevê que o não pagamento de 3 prestações consecutivas ou alternadas do “saldo devedor” negociado acarreta a rescisão da transação.

Ou seja, enquanto o não pagamento de parcelas da entrada provoca o cancelamento do pedido da transação, o não pagamento de parcelas do saldo devedor acarreta a rescisão da transação.

Como se vê, o cancelamento do “pedido de transação” impede a celebração da transação. E, se a transação sequer foi celebrada, não há acordo algum a ser rescindido.

Nessa lógica, pelo desenho normativo atual, o cancelamento do pedido de transação não deve atrair a sanção que impede o contribuinte de transacionar novamente antes do decurso do prazo de dois anos contado da “rescisão da transação”.

A sistemática que envolve a transação corrobora essa conclusão.

O art. 171 do CTN - Código Tributário Nacional autoriza fisco e contribuinte a celebrarem transação, “mediante concessões mútuas”.

A principal concessão do Fisco parece estar contida na redução dos juros, multa e encargo legal do passivo transacionado, não obstante seja ofertado um alargamento do prazo de pagamento, substancialmente maior que o ordinariamente concedido.

Porém, na etapa inicial da transação por adesão, que envolve o pagamento da “entrada” calculada a partir de determinado percentual incidente sobre o montante total do débito, não há reduções, e sim mero pagamento parcelado em até 6 ou 12 vezes, conforme o caso.

Desse modo, se o contribuinte romper o compromisso de quitar em parcelas o valor da entrada, que não envolve reduções, e sim mero parcelamento, não terá sido contemplado com as benesses da transação, genuinamente concebida para reduzir os juros e a multa.

Ou seja, o pagamento da entrada parece representar apenas um parcelamento preliminar, não constituindo, por si só, a transação final acordada.

Também por isso, o contribuinte, cujo pedido de transação tenha sido cancelado por inadimplemento das parcelas da entrada, não se submete à sanção de que trata o § 4º do art. 4º da lei 13.988/20, que impede a formalização de nova transação antes do decurso do prazo de 2 anos.

Nesse contexto, caso um não pagamento das parcelas da entrada esteja impedindo a operacionalização de nova transação por adesão, pode ser oportuno adotar as providências destinadas a remover esse obstáculo, quer administrativamente, quer judicialmente.

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1 O mesmo racional é aplicado aos Editais anteriores.

Aurélio Longo Guerzoni
Sócio do Guerzoni Advogados, com atuação em direito tributário desde 2008. É especialista (2013) e mestre (2020) em direito tributário pela FGV/SP.

Odassi Guerzoni Filho
Sócio do Guerzoni Advogados, ex-Conselheiro do CARF, ex-Delegado da Receita Federal e ex-Auditor Fiscal da Receita Federal.

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