O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou com veto parcial a Lei Complementar 204/23, que veda a incidência do ICMS nos casos de transferência de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, bem como regulou a transferência dos créditos de ICMS relativos às operações e prestações anteriores por meio da alteração do artigo 12 da Lei Complementar 87/96 - Lei Kandir.
O texto, que teve origem no Projeto de Lei Complementar - PLP 116/23, de autoria do Senado, confirma o entendimento do STF na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 49, que impediu a cobrança de ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, uma vez que não há negócio jurídico/operação apto a ensejar a ocorrência do fato gerador do referido tributo.
Além disso, a norma também autoriza a empresa a aproveitar o crédito relativo às operações anteriores quando ocorrer transferência interestadual para igual CNPJ. Dessa forma, o crédito deverá ser assegurado nas seguintes hipóteses:
- pela unidade federada de destino, por meio de transferência de créditos, limitados às alíquotas interestaduais em vigor, que serão aplicadas sobre o valor atribuído à transferência realizada; e
- pela unidade federada de origem, em caso de diferença positiva entre os créditos decorrentes das operações anteriores e os transferidos ao estabelecimento de destino.
Vale lembrar que as alíquotas interestaduais de ICMS são de 7% para operações com destino ao Espírito Santo e estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste; e de 12% para operações com destino aos estados das regiões Sul e Sudeste (exceto Espírito Santo). Portanto, se houver diferença positiva entre os créditos anteriores acumulados e a alíquota interestadual, ela deverá ser garantida pela unidade federada de origem da respectiva mercadoria.
Como se vê, ainda que não tenha sido mencionado de forma expressa a nova redação da Lei Complementar obriga a transferência de créditos de ICMS para o Estado de destino, mantendo-se somente na origem o saldo correspondente à eventual diferença entre a alíquota da operação anterior e a da saída interestadual.
Sendo assim, após tantas idas e vindas e mesmo depois da consolidação jurisprudencial sobre o assunto, nos parece que voltamos à estaca zero, a medida em que o tema acerca da obrigatoriedade da transferência dos créditos continuará a dar ensejo a questionamentos judiciais, principalmente nos casos em que o Estado de destino possua algum benefício fiscal que desconsidere os créditos anteriores.
Isto porque, no julgamento da ADC 49 o Supremo Tribunal Federal tratou a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos do mesmo contribuinte como uma faculdade do contribuinte, e não uma obrigação, conforme dispõe o já mencionado Convênio 178/23.
Dessa forma, neste momento, ainda não é possível saber qual será a postura dos Estados, uma vez que segundo o Confaz tal definição acerca da transferência competirá a estes e ainda não houve a internalização das respectivas regras de transferência por cada Estado. Assim, enquanto não ocorrer tal definição, continua valendo a Nota Orientativa da RFB de 6/12/23, que disciplina a necessidade de o contribuinte realizar o destaque do imposto no campo de ICMS, tal como era feito no passado.
Por fim, sobre o veto parcial praticado pelo Executivo da Lei Complementar 204/23, trata-se do trecho do projeto que permitiria às empresas equiparar as operações de transferência de mercadorias com isenção de ICMS àquelas que geram pagamento do imposto. Ao justificar o veto, o Executivo alegou que a medida contraria o interesse público ao trazer insegurança jurídica, dificultar a fiscalização tributária e elevar a probabilidade de ocorrência de sonegação fiscal.
Dessa forma, uma vez mais, nos parece prudente que tais recentes disposições sejam analisadas com bastante parcimônia para que sejam evitados recolhimentos indevidos.