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Reforma tributária aprovada: entenda as mudanças

Após muito tempo de espera e diante de críticas, a Reforma Tributária foi aprovada em segundo turno pela Câmara dos Deputados na última sexta-feira (15).

20/12/2023

Enfim a Proposta de Emenda à Constituição - PEC, número 45 do ano de 2019, que aborda a reforma no sistema tributário relacionado ao consumo, foi aprovada e promulgada.

A Reforma Tributária se materializou a partir de profundas discussões, refletindo um esforço profundo para reformular o complexo sistema tributário brasileiro. Seu principal objetivo é simplificar esse sistema através da unificação de diversos tributos e a simplificação dos processos de incidência, creditamento e concessão de benefícios fiscais.

Embora essa iniciativa tenha como meta tornar a estrutura tributária mais eficiente e transparente, ela também enfrenta desafios e críticas quanto à sua eficácia e ao impacto real que poderá ter no complexo cenário fiscal brasileiro.

É importante ressaltar que estamos diante de uma reforma do consumo que abrange, em âmbito federal, o Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, o Programa de Integração Social - PIS e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS. Em âmbito estadual e municipal, envolve o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN.

Unificação de tributos

O modelo adotado é chamado de IVA Dual, representado pela CBS (Federal) e IBS (Estadual e Municipal), ambos os tributos terão uma série de características em comum, incluindo identidade de fatos geradores, bases de cálculo, hipóteses de não incidência, sujeitos passivos, imunidades, regimes específicos, diferenciados ou favorecidos de tributação, além de regras de não cumulatividade e creditamento.

Base ampla e cálculo por fora

A base ampla dos impostos CBS e IBS significa que eles incidirão sobre operações que envolvam bens materiais (Tangíveis), imateriais (Intangíveis), serviços e direitos, de maneira indistinta, incluindo tanto as operações internas como as de importação.

Além disso, superando uma crítica ao sistema atual, os novos impostos serão calculados "por fora", ou seja, não estarão incluídos no preço do bem ou serviço, mas serão calculados separadamente, via destaque da operação.

Não cumulatividade

Uma das mudanças introduzidas pela reforma é a adoção do princípio da não cumulatividade. Isso permitirá que os contribuintes tomem crédito integral dos impostos pagos nas etapas anteriores da cadeia produtiva, evitando assim a sobreposição de tributos.

Com isso, cada contribuinte ao longo da cadeia arcará apenas com o tributo correspondente ao seu acréscimo de valor, podendo creditar-se do valor já tributado pelos contribuintes anteriores na cadeia, referente a despesas administrativas e custos diretos da atividade fim que tenham destaque dos tributos.

Tributação no destino

Atualmente, o ICMS é recolhido, em parte, ao Estado produtor (origem) e parte ao Estado onde o bem é consumido (destino). O texto aprovado determina, agora, a integral tributação no destino. Isso significa que a arrecadação do imposto ocorrerá no local de consumo do bem ou serviço, com a sugestão de evitar distorções na arrecadação e buscando combater a chamada "guerra fiscal" entre os estados.

Alíquotas

As alíquotas serão determinadas pelo Senado Federal, com fundamentos em cálculos do Tribunal de Contas da União. No entanto, serão estabelecidas em percentuais de referência, permitindo que a União, Estados e Municípios possam adotar percentuais maiores ou menores em comparação com a referência estabelecida.

A proposta inclui uma medida de limitação para a arrecadação dos tributos sobre o consumo. Esse limite é estabelecido como a proporção da carga tributária em relação ao PIB, baseada na média do período entre 2012 e 2021.

Com a aprovação da emenda constitucional, então, cada tributo (CBS e IBS) terá uma Lei Complementar disciplinadora, sendo certo que os entes federados, então, somente poderão legislar sobre sua respectiva alíquota.

Período de transição

Conforme a proposta, o período de transição para a unificação dos tributos terá a duração de oito anos, compreendendo o período entre 2026 e 2033. A partir de 2033, os impostos atualmente vigentes serão extintos.

No início da fase de transição em 2026, a CBS de competência federal terá uma alíquota de 0,9%, enquanto o IVA de competência estadual e municipal terá uma alíquota de 0,1%.

Durante esse período de transição, no ano de 2027, O Imposto Seletivo será Implementado e o Programa de Integração Social - PIS e a COFINS serão extintos e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) será reduzido a zero, com exceção das operações da Zona Franca de Manaus – ZFM.  Ainda em 2027 o IBS será calibrado para 0,2% e a CBS terá uma redução de 0,1%.

Em 2029, ocorrerá uma redução escalonada do ICMS e do Imposto sobre Serviços - ISS, anualmente, na proporção de 1/10, até 2032. Paralelamente, as alíquotas do IBS serão gradualmente aumentadas para equiparar a arrecadação original dos tributos que serão extintos.

Há expectativa de que, ao término do período de transição, as alíquotas da CBS e do IBS, em conjunto, poderão atingir um percentual de 27%, sendo certo que, as alíquotas definidas pelos senadores permanecerão em vigor até que leis federais, estaduais ou municipais estabeleçam as alíquotas dos respectivos novos tributos sob sua responsabilidade.

Benefícios Fiscais e tratamentos diferenciados

É importante ressaltar que os novos tributos serão determinados por quatro tipos de alíquotas: a alíquota padrão (como referência), a alíquota reduzida (com redução de 60% do valor da alíquota padrão), outra alíquota reduzida (com redução de 30% da alíquota padrão) e a alíquota zero.

A emenda aprovada introduz uma redução de 60% nas alíquotas de tributos para uma variedade de bens e serviços essenciais. Isso inclui áreas como educação, saúde, acessibilidade para pessoas com deficiência, medicamentos, e produtos de higiene menstrual.

Além disso, abrange alimentos, transporte público, produtos agropecuários, e bens culturais e artísticos. A medida também se estende a setores estratégicos como a segurança nacional e a segurança da informação.

Há também uma redução de 30% nas alíquotas de tributos para serviços profissionais fiscalizados por conselhos e para atividades de natureza intelectual, científica, literária ou artística, motivada pela alta utilização de mão de obra nesses setores, custo que não dá direito a crédito na nova sistemática.

Foi definido também que a lei complementar poderá conceder isenção para serviços de transporte e redução a zero das alíquotas para dispositivos médicos e medicamentos, produtos hortícolas e setor da educação, este último, em relação somente ao CBS.

Imposto seletivo

Também foi aprovada a criação de um Imposto Seletivo, de responsabilidade federal, que incidirá sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como cigarros e bebidas alcoólicas.

A proposta legislativa estabelece que, durante o período de transição, o imposto seletivo será integrado à base de cálculo de importantes tributos como o IBS e o CBS, assim como do ICMS e do ISS.

Este imposto seletivo será um tributo monofásico, calculado separadamente, com alíquotas determinadas pelo Congresso Nacional. Além disso, a regulamentação e administração desse imposto serão realizadas por meio de lei ordinária.

Regimes específicos de tributação

O texto abre a possibilidade de regulamentação via lei Complementar para a criação de regimes específicos de tributação para determinados setores, visando atender às peculiaridades e necessidades de cada atividade econômica.

Para combustíveis e lubrificantes, estabelece alíquotas uniformes em todo o território nacional, diferenciadas por produto. Prevê a proibição de apropriação de créditos de combustíveis e lubrificantes quando destinados à distribuição, comercialização ou revenda, mas permite o crédito nas aquisições desses produtos por sujeitos passivos do imposto.

Já para serviços financeiros, Operações com Bens Imóveis, Planos de Assistência à Saúde e Concursos de Prognósticos, permite a alteração em alíquotas, regras para crédito do tributo e bases de cálculo. Admite a não-cumulatividade e a possibilidade de alíquotas uniformes em todo o território nacional, além da opção de não-cobrança no destino.

Para as cooperativas, oferece a possibilidade do imposto não incidir sobre operações entre cooperativas e seus associados, e entre sociedades cooperativas entre si. Apresenta um regime diferenciado de aproveitamento de créditos.

No ramo de Serviços de Hotelaria, Parques de Diversão e Temáticos, Agências de Viagens e Turismo, Bares e Restaurantes, Sociedades Anônimas de Futebol e Aviação Regional, |permite alteração em alíquotas, bases de cálculo e regras de crédito do imposto, com a admissão de não-cumulatividade.

Por fim, para as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte o texto propõe a apuração dos tributos via regime único, vedando a apropriação de créditos, mas permite a apropriação de crédito pelo adquirente não optante do regime único, em montante equivalente ao cobrado do contribuinte.

Estes regimes específicos refletem um esforço para acomodar as necessidades de diferentes segmentos econômicos, buscando equilíbrio entre a eficiência tributária e o suporte ao desenvolvimento de setores vitais da economia.

Comitê Gestor

De acordo com uma nova disposição, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios passarão a administrar de maneira integrada e exclusiva as competências relativas ao IBS através do Comitê Gestor do IBS. Este comitê, atuando dentro dos parâmetros definidos pela Constituição e por lei complementar, terá responsabilidades específicas, incluindo a criação de um regulamento único para uniformizar a interpretação e aplicação da legislação do imposto.

Além disso, o Comitê Gestor será encarregado de arrecadar o imposto, realizar as compensações necessárias e distribuir o produto da arrecadação entre os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Também estará à frente da decisão de controvérsias administrativas relacionadas ao imposto.

Importante destacar que o Comitê Gestor do IBS será uma entidade pública operando sob um regime especial, o que lhe conferirá independência técnica, administrativa, orçamentária e financeira, garantindo autonomia na execução de suas funções e decisões.

A importância do compliance e desafios que virão

À medida que novas regras são implementadas, é crucial que as empresas se preparem para lidar com as complexidades do novo sistema tributário. Os contribuintes devem estar preparados para atualizar seus sistemas de contabilidade e sistema de apuração de tributos, a fim de garantir a conformidade com as novas regras fiscais.

Além disso, pode ser necessário investir em treinamento para a equipe responsável pela área tributária, a fim de garantir que eles estejam familiarizados com as mudanças e sejam capazes de aplicá-las corretamente, desde o regime de transição até a implementação total.

Todos iremos enfrentar um grande desafio relacionado ao compliance tributário, especialmente durante o longo período de transição. Será necessário lidar simultaneamente com a modalidade atual de recolhimento de tributos e suas obrigações acessórias, além de se adaptarem aos novos requisitos que serão implementados.

Isso inclui a compreensão e aplicação de novas bases de cálculo, a adoção de uma sistemática diferente para a tomada de créditos fiscais e o cumprimento de obrigações acessórias distintas. É importante ressaltar que esse desafio ocorrerá em paralelo ao sistema tributário atual, que por si só já é bastante complexo.

Neste momento, é imprescindível garantir o monitoramento de obrigações acessórias, controle de compensações e certidões negativas, análise de perfil de compras e vendas e de possibilidade de tomada de crédito.

Por fim, é importante ressaltar que as alterações ocorreram em âmbito constitucional e leis complementares virão para regulamentá-las nos próximos 180 dias.

Marcílio Vieira
Advogado com mais de 12 anos de experiência, pós graduado em direito tributário pela Milton Campos, especialista em gestão fiscal pela PUC/BH e mestrando em Contabilidade pela FUCAPE Business School.

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