A remuneração dos sócios é um dos temas que mais geram conflitos em um escritório de advocacia. Claro, pois os ganhos recebidos por esses profissionais dizem muito sobre o que a firma valoriza, mexe com a noção de autoestima e poder de cada um, e cria um senso de justiça (ou ausência dela) entre todos que atuam na banca.
Paradoxalmente, em muitas das firmas que conhecemos esse tema é tratado de modo superficial. Os sócios majoritários tomam como base os modelos que viram em outros escritórios, fazem pequenos ajustes e oficializam. “Quem quer, quer, quem não quer que vá embora”, disse o titular de uma banca que assessoramos. O problema, nesse caso, é que o modelo de remuneração gerava alguns profissionais bem remunerados e com motivação, vários ganhando pouco e acomodados, outros tantos insatisfeitos, procurando oportunidades melhores no mercado.
Será esse o caso também em sua banca? Se sim, como resolvê-lo?
Não é fácil construir um modelo de remuneração de sócios que seja ótimo. Mas, com alguns princípios corretos, uma metodologia consistente e uma boa relação de confianças entre os membros da banca, é possível evitar boa parte das desavenças que normalmente permeiam esse assunto. Em tempo, em muitas discussões entre os sócios a remuneração parece ser o mote principal da desavença, quando é apenas o pretexto para a briga. Eles não se confiam mutuamente e brigariam de qualquer modo por qualquer outro tema.
Comecemos pelos princípios. Nossa experiência mostra que um bom modelo de remuneração de sócios deve respeitar, pelos menos, as quatro máximas que seguem:
1. refletir o que é mais importante para a banca, hoje e nos próximos 3 ou 5 anos;
2. ser simples e com variáveis passíveis de serem controladas;
3. ser construído em discussões amplas com os principais sócios da firma;
4. estabelecer de modo claro um prazo para revisão (3 a 5 anos).
Parece óbvio dizer que o modelo de remuneração deve espelhar o que é importante para a firma, mas não é. A tentação de pegar um modelo pronto ou “de mercado” pode levar a erros. O essencial é que os sócios discutam no planejamento estratégico da firma o que de fato vai ser crítico para o crescimento nos próximos anos, isolem essas variáveis, e usem-nas para definir o modelo de remuneração.
Por exemplo, em um grande escritório que atuamos, depois de intensos debates concluiu-se que dois objetivos deveriam ser perseguidos a ferro e fogo pelos sócios: aumentar a captação de novos clientes e melhorar a margem de resultados das áreas. Com isso em mente, o modelo de remuneração de sócios privilegiou essas duas variáveis, mantendo-se os ganhos fixos relativamente baixos e intensificando os ganhos de cada sócio à medida que atingissem as metas de captação e de lucratividade do setor.
No caso citado, é fácil perceber o quanto a eleição dessas duas variáveis simplificou o modelo. Afinal, tanto o valor de receitas captadas, quando a lucratividade oriunda das áreas já eram mensuradas. Apenas não se dava a elas importância estratégica que passaram a ter quando foram vinculadas aos ganhos de cada sócio.
Outro aspecto muitas vezes mal resolvido na construção do modelo de remuneração de sócios diz respeito à forma como os eles o concebem. Não raro, o fundador do escritório conversa com alguns amigos, reúne-se com seu gerente financeiro, faz uma série de malabarismos com os números e sai dali com uma fórmula de ganho. Em seguida, convoca uma reunião em que apresenta para todos e diz triunfante: tivemos uma excelente reunião. Todos gostaram.
Naturalmente, isso não é verdade. A maioria das pessoas não se sentiram à vontade para exprimir o que pensavam sobre o modelo durante a reunião. Logo, irão procurar entendê-lo em conversas particulares com outros profissionais ou, o que é pior, vão falar mal dele (mesmo sem tê-lo entendido!), matando um dos principais objetivos de um modelo de remuneração: estimular que as pessoas tenham comportamentos compatíveis com os objetivos da firma em longo prazo.
Quando criamos um modelo de remuneração de sócios, nós o fazemos junto com as pessoas e não para elas. É preciso discutir o que se espera com o sistema, as variáveis mais importantes para o escritório, quais as regras que o nortearão, etc. Isso toma tempo, advogam alguns. É verdade. Mas há uma regra básica na administração: “quem não participa, não se compromete”. E essa participação cria um senso de confiança no modelo e um grande engajamento com o projeto de crescimento da firma, algo essencial para despertar a motivação de todos.
Por fim, mesmo os modelos de remuneração mais bem arquitetados não possuem vida eterna. Pelo contrário, eles devem ser modificados de tempos em tempo, tanto quanto se modificam os objetivos e as características da firma. Disso decorre que os escritórios mais jovens ou aqueles que crescem rápido tendem a estabelecer um tempo menor para a revisão do modelo. Algo como dois ou três anos. Ao contrário, uma firma há muito tempo no mercado e com atuação estável talvez possa se dar ao luxo de revisá-lo a cada 5 anos.
Sempre que essas revisões forem feitas, repete-se o ritual: discute-se com todos os envolvidos o que é importante para a firma, as variáveis que deverão passar a nortear o modelo e, a partir disso, reveem-se as regras para os ganhos dos sócios. Fazendo isso, o que se vê é que os sócios passam a ter um entendimento cada vez mais claro do que é importante para a firma e uma confiança cada vez mais sólida em todos que a compõem. Os conflitos entre líderes diminuem muito.