Na imprensa, nas empresas, nas universidades, nos grupos de WhatsApp, nos eventos, nenhum assunto tem sido mais debatido do que o tema 935 do STF. Mas o que é ele?
O STF havia julgado o caso de possibilidade ou não de fixação de contribuição assistencial, prevista no art. 513 da CLT, para os não associados aos sindicatos, e considerado que feriria a liberdade de associação.
A decisão era: “É inconstitucional a instituição, por acordo, convenção coletiva ou sentença normativa, de contribuições que se imponham compulsoriamente a empregados da categoria não sindicalizados.”
No entanto, após vários anos com essa tese firmada, e considerando que a decisão não havia transitado em julgado, ou seja, ainda poderia haver algum recurso, ela foi modificada, com o intuito claro e declarado de conseguir receita aos sindicatos. E, ainda que os ministros do STF tivessem o intuito de favorecer os sindicatos profissionais, haverá interpretações de que favorecerá patronais também, pois o art. 513 da CLT aplica-se a qualquer sindicato, seja de empregados, seja de empregadores. Além disso, impor somente aos empregados tiraria o equilíbrio entre entidades sindicais, que o STF justamente não queria que houvesse.
10×0 para a confusão.
E então, na busca de receitas sindicais aos sindicatos dos trabalhadores1, a decisão virou: “É constitucional a instituição, por acordo ou convenção coletivos, de contribuições assistenciais a serem impostas a todos os empregados da categoria, ainda que não sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição.”
E o RH e o departamento de relações sindicais com isso?
Primeiro, a questão não decidida de forma clara: sindicatos patronais. Esse assunto terá que ser analisado pelas empresas com seus jurídicos internos ou externos. E verificar a posição que assumirão – há muita discussão em vista.
Mas em relação aos profissionais, a questão é clara… será?
A decisão não foi publicada e, portanto, não sabemos se no acórdão haverá alguma modulação dos seus efeitos, ou ainda que não tenha, se haverá outros embargos de declaração, talvez do MPT (quem sabe? Possível, mas não provável) para que o efeito seja modulado.
Traduzindo? Modular os efeitos significa o seguinte: dizer desde quando essa decisão vale.
Mas decisão judicial não vale só após publicada?
Não para declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade, porque ela declara que algo vale ou não desde sempre, portanto, se o STF não disser que seu acórdão vale desde a publicação, todo mundo poderá estar devendo 5 anos de contribuição, e vai ter que discutir na Justiça (advogados contenciosos agradecem empenhados) a validade ou não dessa cobrança, e como descontar dos empregados que continuam nas empresas (poderão ou não?).
Mas esse é mais um assunto para jurídico da empresa porque cada caso é um caso, e são muitos detalhes jurídicos a serem analisados, partindo da existência de um instrumento coletivo – condição essencial para a cobrança, e sua validade ou não.
Bom, então, o que eu estou fazendo aqui? Por que esse artigo?
Justamente para que, nos casos futuros, não haja ilegalidades nesses instrumentos.
Todos terão que ser muito cuidadosos.
E nisso entram o RH e as relações sindicais, especialmente nos acordos coletivos, pois são eles os negociadores diretos, e devem tomar todos os cuidados para legalidade deles e de seu conteúdo.
Se na negociação de data base, as empresas devem estar atentas às votações de seus sindicatos e tentar ao máximo descobrir onde e quando serão as assembleias e delas participar (hello, sindicatos! Hora de rever estatutos que tiram direito de voto aos não associados – um ponto para a nulidade do instrumento), nos acordos coletivos, elas são signatárias de um instrumento negociado por elas, e, portanto, devem tomar o cuidado, que os sindicatos patronais devem tomar nas CCTs, que é de verificar se o que a outra parte -empregados representados por sindicatos – decide, foi decidido conforme a lei.
Lembre-se: acordo coletivo, como o nome diz, é feito com a coletividade de empregados, portanto não é um contrato entre empresa e sindicato.
Então, o primeiro passo é de jamais, em tempo algum, assinar um acordo sem que haja uma assembleia regular de votação pelos empregados representados por um sindicato regular.
Portanto:
1. Verifique se o sindicato é regular e tem diretoria eleita. Você deve pesquisar o CNES do sindicato, coloque seu CNPJ no link: http://www3.mte.gov.br/cnes/ConsultaProcesso.asp
Se não houver diretoria eleita, o sindicato não pode atuar, e você tem que buscar a federação, ou a confederação, pesquisando sempre ambas.
Verifique a necessidade de o acordo ser feito por sindicatos de categorias diferenciadas, dependendo de que empregados estarão envolvidos.
Lembre-se que o sindicato tem uma competência territorial, fora dele o acordo não vale, portanto, acordo de matriz não serve para filiais se essas bases forem diferentes e vice-versa.
E para a assembleia, você deve tomar aos seguintes cuidados:
1. Ter um edital emitido pelo sindicato com a matéria ser votada, dia e hora da assembleia;
2. Lista de presença;
3. Votação conforme o estatuto dos sindicatos – voto secreto ou não;
4. Apuração dos votos;
5. Elaboração de ata que deve conter o que foi decidido e por quantos votos;
6. Assinatura da Ata.
E depois disso:
1. Elaboração do acordo coletivo;
2. Assinatura pelas partes;
3. E (ainda que os TRTS achem que não) o registro no Mediador o que facilita o controle, porque se o sindicato não for regular e você esqueceu do item “A” acima, não vai registrar), e o Medidor exige ata, e o registro no SEI tem pedido a lista de presença.
Portanto, o Mediador é uma forma de você checar se tomou todos os cuidados.
Desconfie de acordos não registrados.
AH!! E meu sigilo? Para documentos sigilosos, o acordo pode mencioná-los, como um anexo em poder dos sindicatos e das empresas, assinados por ambos, e não anexados por sigilo, mas arquivado no sindicato e na empresa.
Bom, e o que tudo isso tem a ver com o tema 935?
As dicas acima servem para qualquer matéria negociada, mas para a questão das contribuições, se elas forem ser fixadas no ACT, então:
1. Elas devem constar do edital
2. Elas devem constar na ata de assembleias
3. A forma de oposição deve ser muito clara e escrita na ata de assembleia
4. A oposição não deve ser dificuldade pelo sindicato
5. A oposição não deve ser facilitada pela empresa
E por fim, a pergunta de um milhão de dólares, de cuja confusão o STF faz parte (hello ADIn 57942): a empresa pode descontar sem autorização do empregado?
Não matem o mensageiro, mas essa questão é polêmica e vai gerar muitos problemas.
Uma porque o STF disse que pode fixar contribuição obrigatória via oposição, mas não disse que pode descontar sem autorização do empregado.
A CLT diz que não pode no artigo 545, especificamente para qualquer contribuição aos sindicatos:
Art. 545. Os empregadores ficam obrigados a descontar da folha de pagamento dos seus empregados, desde que por eles devidamente autorizados, as contribuições devidas ao sindicato, quando por este notificados.
A CLT diz que não no art.: 611-B, XXVI:
XXVI – liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;
As decisões do STF sempre foram no sentido de que tais autorizações são individuais e não assemblear… veremos.
Então, mais um cuidado: estabelecer nos acordos coletivos que o empregado que não se opuser ao desconto já o autoriza.
Muitos outros cuidados deverão ser tomados a cada caso, e nas negociações de data base, seja por empresas, seja por sindicatos que quiserem ter instrumentos com validade jurídica.
Então, uma dica é, na dúvida, consulte seu jurídico.
Vamos evitar problemas.
Pelo menos os que podemos evitar.
-----------------------------------------------
1 Disponível em: https://www.justicaemfoco.com.br/descnoticia.php?id=145902&nome=explicacoes_do_votovista_do_ministro_barroso_e_posicionamento_do_ministro_gilmar_mendes_no_sentido_da_constitucionalidade_da_contribuicao_assistencial
2 Segundo o ministro, desde a Constituição de 1988 houve uma diminuição do tradicional “sistema de cabresto”, instituído pelo Estado Novo em 1937, tanto no nível do Estado perante os sindicatos, quanto no dos sindicatos sobre os trabalhadores. Nesse sentido, em sua avaliação, a Reforma Trabalhista busca a evolução de um sistema sindical centralizador, arcaico e paternalista para um modelo mais moderno, baseado na liberdade. “Se o empregador tem a opção de se filiar a um sindicato, ele também tem a opção de se não se filiar, de não recolher essa contribuição”, disse (…). Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=382819