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Da economia na constituição de holding patrimonial ante novo entendimento do STF – Tema 796

De maneira geral a constituição de holding objetiva organização, sendo dividida em sete modalidades: (i) mista, (ii) familiar, (iii) pura, (iv) financeira, (v) de controle, (vi) patrimonial, (vii) administrativa.

28/4/2023

A constituição de holding, é prática cada vez mais comum entre os brasileiros, decorrência da desmistificação outrora existente quanto aos elevados custos em sua abertura e manutenção, o que a tornava inviável ou atrativa apenas a vultosos patrimônios.  

De maneira geral a constituição de holding objetiva organização, sendo dividida em sete modalidades: (i) mista, (ii) familiar, (iii) pura, (iv) financeira, (v) de controle, (vi) patrimonial, (vii) administrativa.

Sem o objetivo de esgotar o tema, nos atentaremos neste artigo exclusivamente as modalidades de holding patrimonial e holding familiar, as quais possuem como característica a gestão de bens imóveis, obtendo receita com sua exploração, com foco também em planejamento sucessório, elisão fiscal e proteção patrimonial.

Nesse ponto, sempre se discutiu sobre a dinâmica na integralização dos bens imóveis ao capital da empresa, sobretudo quanto a incidência ou não de ITBI (Imposto sobre a transmissão de bens imóveis), o que causa significativa oneração na estruturação patrimonial em questão, trazendo ensejo a impressão de que o dito planejamento só faria sentido em vultosas fortunas, quando possuídos  inúmeros imóveis, conclusão que não se mostra correta, sobretudo diante da nova interpretação exarada pelo STF no julgamento do RE 796.376/SC, sob a sistemática de repercussão geral (Tema 796).

Antecedendo os esclarecimentos pertinentes quanto as premissas fixadas no julgado, cumpre destacar o disposto no art. 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal, responsável por direcionar todos os debates relativos à incidência ou não do ITBI na integralização do capital de pessoa jurídica, vejamos:

I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;

Assim, em rápida e desatenta leitura do dispositivo constitucional, é possível atribuir a interpretação até então proferida por nossos tribunais e prefeituras em todo território nacional, isto é, que a isenção tratada no art. 156, § 2º, inciso I da CF não abarcaria as empresas que possuam como atividade preponderante a compra e venda de bens imóveis, locação ou arrendamento mercantil, que seria o caso das holdings patrimoniais.

Contudo, acreditando na competência do legislador e atribuição cirúrgica dos enunciados, parte da doutrina sempre defendeu que a respectiva isenção tratada no mencionado dispositivo constitucional possuí como exceção apenas quando ocorrida cisão, fusão, incorporação ou extinção da pessoa jurídica, e o adquirente possuir como atividade preponderante a compra e venda de bens imóveis, locação ou arrendamento mercantil.

Ou seja, a dúvida posta é: (i) Ocorre a incidência de ITBI sempre em que a atividade preponderante da empresa seja compra e venda de bens imóveis, locação ou arrendamento mercantil, ou, (ii) Ocorre a incidência de ITBI apenas quando ocorrer fusão, cisão, incorporação e extinção da personalidade jurídica e o adquirente dos imóveis tenha como atividade preponderante a compra e venda de bens imóveis, locação ou arrendamento mercantil.

A nosso ver, apenas a segunda assertiva confere a devida importância a locução “nesses casos” empregada ao inciso I, § 2º do art. 156 da CF, vinculada propositalmente entre vírgulas, antecedendo as modalidades de extinção da pessoa jurídica, ou seja, a fusão, incorporação e cisão.

Seguindo tal interpretação, o voto vencedor no julgamento do Tema 796, proferido pelo Min. Alexandre de Moraes, “deslisou” propositalmente na tese reverberada, utilizando exatamente desses argumentos para construir sua fundamentação no caso, fixando a tese: “A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado".

Sobre o ponto, é sabido que a discussão enfrentada era distinta, ao passo que não devemos nos importar com a tese fixada, mas sim com os fundamentos utilizados para sua construção, destacando-se trechos do julgado que enfrenta exatamente a questão aqui levantada:

Em outras palavras, a segunda oração contida no inciso I - “ nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil” - revela uma imunidade condicionada à não exploração, pela adquirente, de forma preponderante, da atividade de compra e venda de imóveis, de locação de imóveis ou de arrendamento mercantil. Isso fica muito claro quando se observa que a expressão “nesses casos” não alcança o “outro caso” referido na primeira oração do inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF. (g.n)

Assim, o argumento no sentido de que incide a imunidade em relação ao ITBI, sobre o valor dos bens incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica, em realização de capital, excedente ao valor do capital subscrito, não encontra amparo no inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF/88, pois a ressalva sequer tem relação com a hipótese de integralização de capital.

O Ministro é enfático ao afirmar que: as hipóteses excepcionais ali inscritas não aludem à imunidade prevista na primeira parte do dispositivo. Esta é incondicionada, desde que, por óbvio, refira-se à conferência de bens para integralizar capital subscrito.

Dessa forma, a conclusão exarada, que apresenta mais uma página da longeva discussão sobre o tema, trouxe inquietude aos contribuintes, sobretudo aqueles que pretendem constituir holding patrimonial ou holding familiar, eis que seguindo as premissas determinadas no julgamento do Tema 796, haveria em qualquer hipótese de integralização de capital imunidade de ITBI, mesmo no caso da empresa possuir como atividade preponderante a compra e venda de bens imóveis, locação ou arrendamento mercantil, desde que não seja excedido seu limite, isto é, desde que o capital social respeite o valor dos bens imóveis integralizados.

Por óbvio que a discussão não está encerrada, permeando muitas dúvidas, contudo, ousamos sugerir que a “resvalada” proposital do Min. Alexandre de Morais sobre o assunto busca exatamente a inquietude dos contribuintes e exercitar a tese indicada junto ao poder judiciário, para que oportunamente o tema seja enfrentado de frente pelo Supremo Tribunal Federal, logrando uma pacificação e definição, que esperamos ser favorável aos contribuintes.

Gabriel Lazzari
Advogado no escritório Ratc e Gueogjian Advogados. Pós-graduando em Direito Tributário. Pós-graduando em Direito Penal e Processo Penal.

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