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Uma reflexão sobre o programa de integridade na nova lei de licitações (lei 14.133/21)

A ampliação e efetividade da cultura de integridade são alguns dos principais objetivos da nova lei de licitações, pois, mais do que nunca, é imprescindível fomentar a cultura de integridade nas relações entre os entes.

4/4/2023

A nova lei geral de licitações (lei 14.133/21) veio para substituir a lei 8.666/93 (e leis correlatas). Embora a nova Lei já esteja em vigor, o artigo 193, inciso II, concedeu um prazo de dois anos de transição até que a antiga lei seja revogada de vez. A rigor, portanto, até abril de 2023 os órgãos públicos poderão optar por utilizar uma ou outra legislação em seus processos, sendo proibida a combinação entre elas.

Diante de diversas dificuldades de implementação neste período transitório, o Tribunal de Contas da União (TCU) avaliou o marco temporal da utilização dessa norma, entendendo que:

“processos licitatórios e os de contratação direta nos quais houve a “opção por licitar ou contratar” seguindo a legislação antiga (leis 8.666/1993, 10.520/02 e 12.462/11) podem continuar obedecendo a essas regras, desde que a opção seja feita até 31 de março de 2023 e a publicação do edital ocorra até 31 de dezembro de 2023.” - ACÓRDÃO 507/23 – TCU – Plenário. Julgado em 22/3/23.

Segundo informações de membros do Parlamento, o governo deve adiar, até março de 2024, a entrada em vigor plena da nova lei de licitações. Portanto, órgãos públicos e empresas terão um intervalo de tempo maior para se adequar às novas regras.

De toda sorte, a lei 14.133/21 contém disposições mais atuais, modernas e que, trazem mais lisura e transparência aos processos de contratação com o poder público. Dentre as novidades da nova legislação temos a previsão da obrigatoriedade de Programas de Integridade para licitações.

Importante registrar os avanços da nova lei de licitações com relação aos aspectos de integridade das empresas licitantes e contratantes, considerado um grande fortalecimento dessa política, que atende às exigências dos órgãos de controle e o poder público como um todo. O que antes era opcional, agora se tornou obrigatório com a previsão de implantação de programa de integridade pela empresa que vencer a licitação.

Da mesma forma, a nova lei traz também outras disposições relacionadas ao Compliance, que antes, ficava a critério de cada órgão responsável pela licitação a determinação da necessidade de Programas de Integridade para participação.

O Programa de Compliance consiste em um mecanismo para identificar, prevenir e mitigar riscos de conformidade, abrangendo, também, prevenção à corrupção (integridade em si), e traz mecanismos de análise de riscos, controles internos, procedimentos, treinamentos, entre outras ferramentas capazes de propagar a ética empresarial.

Mecanismos de integridade passaram a ter mais força após a Lei Anticorrupção (12.846/2013), que prevê a redução de penalidade caso a empresa demonstre que adotava mecanismos de promoção à ética e de prevenção à corrupção.

Nesse sentido, além do fato de o programa de integridade trazer diversos benefícios para as empresas, como a redução de fraudes e a promoção de um ambiente empresarial mais saudável, com a nova Lei de Licitações, o programa de integridade passa a ser requisito obrigatório para as empresas que pretendem manter relação contratual com a Administração Pública, além de outras disposições.

A lei 14.133/21 traz em seu artigo 25, parágrafo 4º, a previsão de que nos editais de contratação de obras, serviços e fornecimento de grande vulto (fornecimento de bens em grande escala) deve haver a obrigatoriedade de existir programa de integridade pela empresa que vencer a licitação para contratações de grande vulto (acima de 200 milhões). Portanto, a empresa deve comprovar, no prazo de 6 meses, a existência do programa. 

Alguns lugares, como o Distrito Federal (Lei 6.112/20180, já traziam em suas legislações a obrigatoriedade da implementação do programa de integridade. Mas tanto a implementação quanto a efetividade dos programas serão analisadas e testadas nas empresas vencedoras das licitações.

Nesse sentido, nada mais relevante (e assim fez a NLLC) do que federalizar a obrigatoriedade do programa, que servirá como uma forma de garantia de eficiência e integridade e como um mecanismo de combate à desvios, fraude e corrupção.

As atuais previsões são bastantes relevantes, e as empresas que contratam com a Administração Pública deverão ter uma atenção rigorosa para cumprirem fiel e corretamente as suas disposições.

O programa de integridade consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes.

Vale lembrar que os programas de integridade formam um conjunto de atos e disciplinas que auxiliam no cumprimento de normas, regulamentos, políticas e diretrizes.

Com a implementação preventiva, evita-se a existência de desvios, irregularidades e inconformidades, e cria mecanismos para fomentar as boas práticas na empresa ou instituição. A finalidade é reestruturar a gestão e a cultura da empresa, estabelecendo um padrão de cultura ética, moral e de integridade.

O primeiro questionamento que se faz é: com a nova lei, todas as empresas que quisessem contratar com o poder público federal teriam que ter programas de compliance?

De acordo com o 25, §4, a obrigatoriedade da implementação do programa de integridade é para empresas que vão participar de licitações de grande vulto, com valor de 200 milhões de reais.

Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento.

(...)

§ 4º Nas contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto, o edital deverá prever a obrigatoriedade de implantação de programa de integridade pelo licitante vencedor, no prazo de 6 (seis) meses, contado da celebração do contrato, conforme regulamento que disporá sobre as medidas a serem adotadas, a forma de comprovação e as penalidades pelo seu descumprimento.

Portanto, a exigência não é para todas as empresas licitantes e mesmo aquelas que vão firmar contratos de grande vulto, ainda têm o prazo de 6 meses, a partir da assinatura do contrato, pra desenvolver o programa de integridade.

Esse ponto chama atenção porque alguns estados e municípios já regulamentaram essa questão. Como dito, o Governo do Distrito Federal, nos termos da lei 6.112/18 e do decreto 40.388/20 já traz a obrigatoriedade de Programas de Integridade nas empresas que possuem contratações iguais ou superiores à R$ 5 milhões de reais.

Tal disposição confronta o artigo 25 da Nova lei de Licitações e Contratos torna obrigatória a implementação de programa de integridade pelo licitante vencedor, nos contratos cujos valores estimados superam R$200 duzentos milhões de reais. 

A Constituição Federal, em seu art. 24 § 4º traz que “A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário”.

Ou seja, se há norma federal (geral), como a nova lei de licitações, suspende-se a eficácia da lei estadual, como a lei 6.112 do DF. Então, no Distrito Federal, o programa de integridade, que é obrigatório para contratos acima de 5 milhões, somente poderá ser exigido para contratos acima de 200 milhões.

Se essa interpretação prevalecer, haverá um retrocesso nas questões de integridade, não somente no DF, mas, possivelmente, em todos os estados e municípios que tornaram obrigatório o programa de compliance.

Relembra-se que essa obrigatoriedade é para “contratos de grande vulto”, e a perspectiva da ideia de “grande vulto” deve ser analisada caso a caso, pois somos um país continental, que apresenta relevantes variações.

O valor estimado na lei federal, para exigir programa de integridade para contratos acima de 200 milhões, pode fugir à realidade de milhares de municípios e isso causará a ampliação de riscos e insegurança para gestores públicos e o enfraquecimento das questões éticas e de integridade. Além do que afronta o próprio art. 5º da NLLC, que estima a observância do interesse público, probidade administrativa, eficácia, planejamento e segurança jurídica.

Outro ponto que chama atenção é que o legislador quis foi trazer um incentivo à criação de mecanismos de combate à corrupção, prevenção a riscos que possam afetar a imagem do Poder Público e da empresa contratada.

Mas o programa de integridade não pode ser feito com o único objetivo de atender à exigência legal. Ele tem que ter qualidade, tem que ser efetivo, eficiente, até para cumprir o propósito da sua implementação.

A exigência do programa de integridade é para contratos de grande vulto, ou seja, acima de 200 milhões de reais. Se a empresa não tem programa implementado, como ela vai conseguir implementar e efetivar em 6 meses? Dentro desse prazo e praticamente impossível se implementar e tornar efetivo o programa. Dependendo do porte da empresa, a implementação efetiva de um programa de compliance gira em torno de 1 ano.

E quais seriam os motivos de adesão a um programa de integridade, se não é exigido para todas as empresas, por que devem aderir ao programa de integridade? A ideia do legislador é de criar uma cultura de integridade e não de impor mais um requisito para cumprir o edital.

Como dito, essa cultura não deve ficar só nas empresas com contratos de grande vulto, mas também para as médias e pequenas empresas, pois, mais cedo ou mais tarde, a exigência virá.

Hoje o mercado já começou a se adaptar às novas leis e diretrizes de integridade, e percebem que mudar a política e cultura da empresa traz uma série de benefícios e melhorias para o negócio.

Não só as empresas que tendem a participar de licitações e contratar com o Poder Público, mas também aquelas que tem relações comerciais com outras empresas nacionais e estrangeiras, devem adotar a postura de integridade.

Feito da maneira correta, funcionará como um fator que garante a continuidade e competitividade do negócio, trazendo reflexos positivos na gestão da empresa.

E com a adesão ao programa de integridade, a empresa passará a ter mecanismos de apuração e observância das principais legislações do país.

Cita-se, dentre elas: a lei Anticorrupção (lei 12.846 de 1º de agosto de 2013 e decreto 8.420 de 18 de março de 2015); a Lei do Acesso à Informação (lei 12.527, de 18 de novembro de 2011); a lei de Conflito de Interesses (lei 12.813, de 16 de maio de 2013), a Política Nacional de Inteligência (decreto 8.793 de 29 de junho de 2016), a lei 9.613 de 03 de março de 98 (Lei da lavagem de dinheiro); lei 8.429 de 2 de junho de 1992 (lei de Improbidade Administrativa); lei 13.303 de 30 de junho de 2016 (lei das Estatais);  a lei Geral de Proteção de Dados (lei 13.709, de 14 de agosto de 2018, bem como Acordos de leniência, colaboração premiada e acordos internacionais.

Outro ponto importante sobre a nova lei de licitações é que a existência de programa de compliance funciona como Critério de desempate. O artigo 60, inciso IV, prevê que, em caso de empate entre duas ou mais propostas, o quarto critério a ser aplicado para desempatar o certame, será, justamente, o programa de integridade.

Art. 60. Em caso de empate entre duas ou mais propostas, serão utilizados os seguintes critérios de desempate, nesta ordem:

(...)

IV - desenvolvimento pelo licitante de programa de integridade, conforme orientações dos órgãos de controle.

As empresas que tiverem um programa de compliance sério, rígido e ativo sairão na frente dos demais concorrentes num processo licitatório, seja ele por qual modalidade for.

Não somente relacionado ao poder público, mas também nas relações privadas, cada vez mais, as empresas procuram firmar parcerias com entidades sérias. O chamado "due diligence", que é um processo de coleta de informações sobre uma empresa antes de serem firmados negócios, salta aos olhos quando se depara com uma cultura de integridade já implementada.

Dessa forma, a adesão ao programa, a Empresa melhorará a sua governança e gestão, aumentando a segurança dos processos e negócios, melhorando sua imagem institucional perante os parceiros privados e perante os órgãos de controle, o que acaba diminuindo custos e gastos das transações e erros e retrabalhos.

Na iniciativa privada, há o fortalecimento institucional da marca, com o aumento do valor de mercado da instituição, atração de mais investimentos e oportunidades de negócios com empresas nacionais e internacionais.

E como seria possível blindar as empresas, futuras licitantes ou contratantes com o poder público? A existência de um efetivo programa de compliance é garantidora de direitos e prerrogativas, sendo um fator diferencial e atenuante.

Com o advento da lei 12.846/13, que dispõe sobre a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, vê-se que as pessoas jurídicas serão responsabilizadas objetivamente, nos âmbitos administrativo e civil, pelos atos lesivos praticados em seu interesse ou benefício.

Importante salientar que a responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilidade individual dos seus dirigentes ou administradores.

O Decreto Regulamentador 8.420/15, primeiro a regulamentar a Lei Anticorrupção, elencou diversos aspectos como os critérios para cálculo da multa, regras para celebração de acordos de leniência, formas de avaliação de programas de integridade, entre outros.

Caso tais normativos não sejam observados, a empresa fica passível de penalidades e responsabilização administrativa e civil pela prática de atos lesivos de seus funcionários.

As sanções variavam de multa de 0,1% até 20% do faturamento bruto; reparação integral do dano; publicação extraordinária da decisão condenatória; perdimento dos bens; suspensão temporária das atividades; dissolução compulsória da pessoa jurídica; impedimento de recebimento de incentivos e financiamentos públicos.

Em 12/7/22, após nove anos de vigência da Lei Anticorrupção, foi publicado um novo Decreto que altera a sua regulamentação (decreto 11.129/22).

Especificamente com relação à integridade, o decreto 8420/15 trazia que, em uma eventual penalidade de multa, a sanção poderia ser reduzida de 1% a 4% caso a empresa possuísse programa de integridade. Já com o novo Decreto 11.129/22, o percentual aumentou para até 5%.

Portanto, o novo Decreto reforça a necessidade das empresas de instaurarem programas de integridade e criarem uma cultura interna que vise a adoção de boas práticas e condutas éticas.

Foi incluído no escopo dos objetivos a ideia de prevenção, que não constava no decreto anterior. Outro ponto de destaque foi a retirada do inciso XVI do decreto 8420/15, que versava sobre a transparência da pessoa jurídica quanto a doações para candidatos e partidos políticos, o que é consoante ao art. 5º da lei 14.133, que determina a observância da transparência no trato com a coisa pública:

Art. 5º Na aplicação desta lei, serão observados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da eficiência, do interesse público, da probidade administrativa, da igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia, da segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do julgamento objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável, assim como as disposições do decreto-lei  4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).

O que já era previsto desde o decreto 8.420/15, passou também a ser positivado na lei 14.133/21: a existência de programa de compliance será observada em eventual aplicação de penalidade.

De acordo com o artigo 156, serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas previstas na nova lei as seguintes sanções: 1) advertência; 2) multa; 3) impedimento de licitar; e 4) declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.

Art. 156. Serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas previstas nesta lei as seguintes sanções:

§ 1º Na aplicação das sanções serão considerados:

(...)

V - a implantação ou o aperfeiçoamento de programa de integridade, conforme normas e orientações dos órgãos de controle.

E o §1º, inciso V, diz que na aplicação das sanções será considerada a implantação ou o aperfeiçoamento de programa de integridade. Portanto, ter estruturado um programa de compliance efetivo será um fator positivo a ser considerado na imposição de sanções.

Aumento do prazo de proibição de contratar com entes públicos, das penas dos crimes licitatórios e desconsideração da personalidade jurídica

Importante registrar que a nova Lei de Licitações majorou o prazo de proibição de contratar com entes públicos. A partir de agora, essa sanção poderá impedir o responsável de licitar ou contratar no âmbito da Administração Pública direta e indireta de todos os entes federativos, pelo prazo mínimo de três anos e máximo de seis anos (artigo 156, §5º):

§ 5º A sanção prevista no inciso IV do caput deste artigo será aplicada ao responsável pelas infrações administrativas previstas nos incisos VIII, IX, X, XI e XII do caput do art. 155 desta lei, bem como pelas infrações administrativas previstas nos incisos II, III, IV, V, VI e VII do caput do referido artigo que justifiquem a imposição de penalidade mais grave que a sanção referida no § 4º deste artigo, e impedirá o responsável de licitar ou contratar no âmbito da Administração Pública direta e indireta de todos os entes federativos, pelo prazo mínimo de 3 (três) anos e máximo de 6 (seis) anos.

Antes o prazo de suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, não poderia ser superior a 2 (dois) anos. Se não tivesse disposição específica, a "administração era só a local".

Agora, a suspensão pode ser de até 3 anos e a inidoneidade impede de licitar ou contratar no âmbito da Administração Pública direta e indireta de todos os entes federativos, pelo prazo mínimo de 3 (três) anos e máximo de 6 (seis) anos.

Os crimes licitatórios foram inseridos no Código Penal e tiveram suas penalidades aumentadas. Esses crimes estão esculpidos no artigo 178 da nova Lei de Licitações: a) Contratação direta ilegal Art. 337-E; Frustração do caráter competitivo de licitação (Art. 337-F.; Patrocínio de contratação indevida (Art. 337-G); Modificação ou pagamento irregular em contrato administrativo (Art. 337-H); Perturbação de processo licitatório (Art. 337-I); Violação de sigilo em licitação (Art. 337-J); Afastamento de licitante (Art. 337-K); Fraude em licitação ou contrato (Art. 337-L); Contratação inidônea (Art. 337-M); Impedimento indevido (Art. 337-N); Omissão grave de dado ou de informação por projetista (Art. 337-O).

Além disso, o Art. 337-P dispõe que a pena de multa cominada aos crimes seguirá a metodologia de cálculo prevista na nova LLC e não poderá ser inferior a 2% do valor do contrato licitado ou celebrado com contratação direta.

A lei também trouxe a possibilidade de fazer a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar o patrimônio dos administradores e sócios, pessoa jurídica sucessora e até empresas coligadas que atuem no mesmo ramo, conforme artigo 160:

 "A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão patrimonial, e, nesse caso, todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica serão estendidos aos seus administradores e sócios com poderes de administração, a pessoa jurídica sucessora ou a empresa do mesmo ramo com relação de coligação ou controle, de fato ou de direito, com o sancionado, observados, em todos os casos, o contraditório, a ampla defesa e a obrigatoriedade de análise jurídica prévia".

E a principal forma de não incorrer em crimes em licitações e contratos e nem de ter atingido o patrimônio dos sócios/administradores é criando uma cultura de integridade, através de programas de compliance.

Outro ponto que merece destaque é o artigo 163, que admite a reabilitação do licitante ou contratado perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, exigidos, cumulativamente: 1) reparação integral do dano causado à Administração Pública; 2) pagamento da multa; 3) transcurso do prazo mínimo de um ano da aplicação da penalidade, no caso de impedimento de licitar e contratar, ou de três anos da aplicação da penalidade, no caso de declaração de inidoneidade; 4) cumprimento das condições de reabilitação definidas no ato punitivo; e 5) análise jurídica prévia, com posicionamento conclusivo quanto ao cumprimento dos requisitos definidos no artigo 163.

Art. 163. É admitida a reabilitação do licitante ou contratado perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, exigidos, cumulativamente:

(...)

Parágrafo único. A sanção pelas infrações previstas nos incisos VIII e XII do caput do art. 155 desta lei exigirá, como condição de reabilitação do licitante ou contratado, a implantação ou aperfeiçoamento de programa de integridade pelo responsável.

Quando o licitante declarado inidôneo comprova que superou os motivos da punição, ele pode pedir a reabilitação. E para conseguir essa reabilitação, é exigida a implantação ou aperfeiçoamento de programa de integridade pelo responsável.

Portanto, veja que, de fato, a implementação de um programa de compliance passou a ser, mais do que nunca, imprescindível para as empresas que atuam junto ao setor público.

Da mesma forma, perante o setor privado, a reputação da empresa perante os parceiros melhora quando são adotados mecanismos de prevenção, detecção e saneamento de desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados pela empresa.

Diante de tudo o que fora exposto, o ponto chave desse artigo é a inovação trazida com relação à integridade e conformidade. Anteriormente à lei, inexistia a obrigatoriedade das empresas licitantes em terem um programa de integridade.

Com a nova lei, mais do que existir o programa, ele tem que ser efetivo, de modo que ela possa demonstrar sua capacidade de prevenir, detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira e de fomentar e manter uma cultura de integridade em seu ambiente organizacional.

É um avanço relevante e considerável e que está consoante com as boas práticas, os princípios constitucionais, a lei anticorrupção e outros normativos internacionais que balizam a ética e integridade nas interações entre o público e o privado.

Dessa forma, a ampliação e efetividade da cultura de integridade são alguns dos principais objetivos da nova lei de licitações, pois, mais do que nunca, é imprescindível fomentar a cultura de integridade nas relações entre os entes. Sendo assim, a lei 14.133/21, acertadamente, inovou ao trazer a observância obrigatória das questões ligadas à ética.

Anna Carolina Miranda Dantas
Advogada especialista em Direito Administrativo Sancionador, Gestão Pública, Compliance e Anticorrupção.

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