Há quase um ano, em 14/2/22, publicara um artigo refletindo sobre os estarrecedores e crescentes casos de violência contra advogados no país. Crimes de homicídios (tentados e consumados) e de lesões corporais – que a sociedade brasileira acompanhava com perplexidade à época –, cujas motivações se deram exclusiva e diretamente por conta das respectivas atuações profissionais das vítimas.
Eis que, como na magia de um carrossel, a história se repete. Transcorrido o lapso temporal daquele texto, a classe jurídica – novamente –, se viu assarapantada com o lamentável e desprezível episódio que vitimou o respeitado Advogado Cristiano Zanin Martins que, covardemente, sofreu ameaças (art. 147, CP) e injúria qualificada (art. 141, §2, CP) enquanto escovava os dentes em um banheiro no aeroporto de Brasília.
Emerge, portanto, Mário Quintana! Com suas doces e sábias palavras, o poeta brasileiro disse que “o passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente”.
No caso em epígrafe, vale destacar que não se está diante de “rasas violências” perpetradas contra um indivíduo, tão somente. A investida delitiva e odiosa feriu, aviltou e humilhou a Advocacia e, com ela, o ínclito papel desempenhado pelo causídico, Dr. Zanin, perante o Estado Democrático de Direito e à Justiça.
Cabe, aqui, um convite à reflexão: e se o notável Advogado tivesse sido assassinado naquele banheiro com as cenas do homicídio sendo exibidas como um troféu na internet? Ou se “somente” o criminoso tivesse agredido fisicamente o Advogado? Teria sido um erro do Advogado não contar com seguranças particulares 24h por dia?
Tal ironia macabra e de mau gosto é redundante, pois pensar que o Dr. Zanin virou alvo por ter desempenhado uma defesa técnica, resiliente, aguerrida e estratégica em favor de um cliente politicamente conhecido é, no mínimo, uma piada sem graça para a Advocacia e todo o sistema de justiça brasileiro.
Desta feita, não restam dúvidas que o ataque sorrateiro evidenciou uma horrenda afronta à democracia e à estabilidade constitucional brasileiras; motivação suficiente para incutir uma qualificadora à lei penal que venha a proteger os Advogados brasileiros (como já defendido há praticamente um ano no citado artigo).
Nesse sentido, cabe deslindar que tais fatos não devem ser compreendidos como “crimes simples” (aqueles em que, para o Direito, não há um motivo pontual) e, sim, como “crimes qualificados”, pois configuram verdadeiros golpes à Justiça em detrimento da motivação específica que, à vista disso, requer e não pode prescindir de novas elementares ao tipo penal; culminando na alteração das penas mínima e máxima, aumentando-as.
Qualificadora essa que, por meio de um Projeto de lei, amplie a responsabilização penal daqueles que atentem contra a vida ou a integridade física dos advogados, em razão das suas funções.
Justificação essa que encontraria eco no art. 133 da Constituição Federal, que dispõe, justamente, ser “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.
Ademais, como já pregado no passado, vilipendiar estes operadores da justiça, além de expor o desprezo que os criminosos têm para as instituições e para o sistema jurídico e constitucional do Brasil, fragiliza e coage a atuação funcional dos homens e mulheres que, diuturnamente, buscam defender direitos e a correta aplicação das leis.
Por isso, ratifica-se que incluir tais hipóteses qualificadoras ao regramento penal – devidamente sugestionadas à comissão de direito penal do Conselho Federal da OAB –, promoverá, ao menos, a concreta sinalização estatal no sentido de prover maior segurança funcional e tutela institucional aos importantes patronos que laboram perante a justiça brasileira. Basta vontade política!
Ao fim, o começo; novamente, Mário Quintana: “Cego é aquele que não vê seu próximo morrer de frio, de fome, de miséria. Surdo é aquele que não tem tempo de ouvir um desabafo de um amigo, ou o apelo de um irmão”.