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Funrural e a liquidação de final de ano

Dessa forma, há quem sustente que se estaria diante de um provável limbo onde seria certo que há um tributo devido, todavia, não haveria norma específica que defina quem deveria fazer o recolhimento.

13/12/2022

O Supremo Tribunal Federal incluiu em pauta a retomada dos julgamentos de três temas que envolvem a contribuição previdenciária sobre a receita bruta da atividade rural. Todos os três temas tem por objetivo final a declaração da inconstitucionalidade da substituição da incidência da contribuição sobre a folha de pagamento para receita bruta, o denominado “Funrural”.

Trata-se de discussões que se arrastam por décadas e recentemente foram incluídas numa espécie de liquidação de final de ano para serem julgados em Plenário Virtual na semana compreendida entre os dias 9 e 16 de dezembro.

Os dois primeiros se referem ao julgamento do Funrural das pessoas jurídicas, quer sejam as empresas agroindustriais ou pelos produtores rurais. Vale comentar que a agroindústria se distingue da empresa produtora rural pelo fato de também industrializar a sua própria produção rural. Os Recursos Extraordinários foram recebidos com efeito de  repercussão geral, o que significa que os efeitos da decisão proveniente dessas análises vinculam as demais instâncias do Poder Judiciário. no julgamento desse mesmo tema.

No caso da agroindústria estará em análise a inconstitucionalidade do art. 1º. da lei 10.256/01 nos termos do Recurso Extraordinário 611.601/RS, o qual deu origem ao Tema 281 de Repercussão Geral. Já para os produtores rurais pessoas jurídicas a base legal sob análise é art. 25, I e II, e § 1º, da lei 8.870/94, conforme Recurso Extraordinário 700.922/RS, deu origem ao Tema 651 de Repercussão Geral.

Nesses casos, haveria ausência de competência para que fosse instituída a contribuição sobre a receita bruta, haja vista que já ocorre a incidência da COFINS, também sobre a receita, como fonte financiadora da Seguridade Social. Sendo assim, sob a proteção constitucional seria inadmissível a coexistência no ordenamento jurídico de duas contribuições incidentes sobre a mesma base de cálculo.

Para que fosse instituída uma nova fonte de custeio para a Seguridade Social haveria que se dispor do processo legislativo previsto para as leis complementares, em face da matéria e do quórum requerido, o que de fato não ocorreu. Enquanto o julgamento referente a agroindústria ainda não contém nenhuma manifestação dos Ministros do STF, aquele relativo ao produtor rural pessoa jurídica será reiniciado após pedido de vista  ocorrido  no ano de 2020, ocasião em que havia dois votos favoráveis aos contribuintes e um contra.

Se engana quem imagina que todas as agroindústrias e produtores rurais pessoas jurídicas sairiam beneficiados no caso de um julgamento favorável para o contribuinte. Isso porque, a base de cálculo do Funrural não contempla a receita decorrente das exportações diretas ou por intermédio tradings. Portanto, é comum que a incidência sobre a receita bruta seja mais econômica do que sobre a folha de pagamento para aquelas entidades jurídicas com viés exportador.

Na esteira da liquidação dos julgamentos de final de ano, também foi pautado o Funrural tendo como foco as pessoas físicas produtores rurais, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.395.  São questionados dois pontos principais: a constitucionalidade do Funrural do produtor pessoa física com base na lei  8.540/92, bem como a responsabilidade por sub-rogação do adquirente na aquisição de produção rural de pessoas físicas.

Esse julgamento chama a atenção porque o primeiro assunto já foi anteriormente definido pelo STF que decidiu pela sua inconstitucionalidade tendo em vista a ausência de previsão constitucional para incidência sobre a receita bruta tendo, portanto, sido fixada a seguinte tese do Tema 202 de Repercussão Geral no julgamento do Recurso Extraordinário 596.177/RS: “É inconstitucional a contribuição, a ser recolhida pelo empregador rural pessoa física, incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, prevista no art. 25 da lei 8.212/91, com a redação dada pelo art. 1º da lei 8.540/92”.

Vale relembrar que mais recentemente, de forma contrária, o STF também decidiu, no julgamento do Recurso Extraordinário 718.874/RS com Repercussão Geral sob o Tema 669, que a incidência sobre a receita bruta do Funrural de pessoas físicas seria constitucional após a publicação da lei 10.256/01 haja vista que no momento da sua publicação já existiria a previsão magna introduzida pela Emenda Constitucional 20/98 e, portanto, passível de ser regulada por meio de lei ordinária.

Em outras palavras, está assentado na Corte Superior que o Funural das pessoas físicas foi inconstitucional até meados de 2001 e, a partir de então, amparado pela validade da Constituição Federal. É por essa razão que não se acredita que o julgamento da ADI possa trazer alguma modificação de entendimento acerca desse tema.

No entanto, todas as fichas estão colocadas na avaliação da constitucionalidade da sub rogação, isto é, na obrigação da pessoa jurídica adquirente do produto agrícola assumir a responsabilidade do recolhimento do Funrural da pessoa física produtora rural. No julgamento, antes citado, que reconheceu a inconstitucionalidade do Funrural até meados de 2001, a regra da sub rogação prevista no inciso IV, do art. 30, da lei 8.212/91 também foi declarada inconstitucional. Ora, à época foi uma consequência lógica, pois se o tributo não existe, também não existiria a responsabilidade de seu recolhimento.

Acontece que, desde então, não houve nenhum novo ato legislativo que tenha sido introduzido acerca da sub rogação. Sequer a lei 10.256/01, que reintroduziu com amparo constitucional do Funrural das pessoas físicas, reafirmou que a responsabilidade pelo recolhimento estaria sob o rol de obrigações do adquirente da produção rural.

Ricardo Varrichio
Sócio da RVC Advocacia e Consultoria Tributária e Empresarial.

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