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Teoria da perda de uma chance: a responsabilidade civil em caso de chance real

O entendimento da Corte foi no sentido de que, em razão do erro médico, houve a perda da chance do paciente ter a real cura da doença que lhe acometia.

11/11/2022

A teoria da perda de uma chance é de origem francesa e surgiu na década de 60, por intermédio de decisão realizada pela Corte de Cassação Francesa, que julgou um caso de erro médico, ocasionado por erro no diagnóstico dado ao paciente.

O entendimento da Corte foi no sentido de que, em razão do erro médico, houve a perda da chance do paciente ter a real cura da doença que lhe acometia.

Posteriormente, foram surgindo cada vez mais decisões no sentido de que a conduta culposa do agente e o dano causado independem de configuração de nexo causal para configurar o dano da perda de uma chance.

Nos tribunais brasileiros, está cada vez mais sendo adotado o entendimento da Teoria da Perda de uma Chance, vez que ganhou bastante força nas doutrinas, principalmente porque, há o entendimento do dano pela perda de uma chance como quarta categoria de dano, juntamente aos danos materiais, morais e estéticos.

Entretanto, ainda é um tema com diversas controvérsias, principalmente com relação à dificuldade de  mensurar o dano, bem como mensurar o que configura uma chance.

Isso porque, de acordo com o jurista Sergio Cavalieri Filho, a perda de uma chance ocorre quando, em virtude de conduta alheia, desaparece a probabilidade de um evento que poderia trazer benefícios futuros à vítima. 

Cabe destacar que, apesar de não haver uma lei específica, a referida teoria, costumeiramente, vem sendo utilizada, e bastante aceita na jurisprudência brasileira, vejamos:

“A perda de uma chance não tem previsão expressa no nosso ordenamento jurídico, tratando-se de um instituto originário francês, recepcionado pela doutrina e jurisprudência brasileira, e que traz em si a ideia de que o ato ilícito que tolhe de alguém a oportunidade de obter uma situação futura melhor, gera o dever de indenizar.” [...]

(STJ - REsp: 1750233 SP 2018/0155563-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 05/02/19, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/02/19)

“DIREITO CIVIL. CÂNCER. TRATAMENTO INADEQUADO. REDUÇÃO DAS POSSIBILIDADES DE CURA. ÓBITO. IMPUTAÇÃO DE CULPA AO MÉDICO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TEORIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL PELA PERDA DE UMA CHANCE. REDUÇÃO PROPORCIONAL DA INDENIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.[..]

3. Conquanto seja viva a controvérsia, sobretudo no direito francês, acerca da aplicabilidade da teoria da responsabilidade civil pela perda de uma chance nas situações de erro médico, é forçoso reconhecer sua aplicabilidade. Basta, nesse sentido, notar que a chance, em si, pode ser considerado um bem autônomo, cuja violação pode dar lugar à indenização de seu equivalente econômico, a exemplo do que se defende no direito americano. Prescinde-se, assim, da difícil sustentação da teoria da causalidade proporcional.

(STJ - REsp: 1254141 PR 2011/0078939-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 04/12/2012, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/02/13 RDDP vol. 122 p. 161 RSTJ vol. 229 p. 320).

Neste cenário, cabe destacar que, para caracterizar a Teoria, deve-se observar a presença de alguns requisitos, quais sejam: a chance perdida deve ser séria e real,  e deve ter uma probabilidade real de que o fato se concretize.

Nesse sentido, destaca o jurista Sérgio Cavalieri Filho:

“Caracteriza-se essa perda de uma chance quando, em virtude da conduta de outrem, desaparece a probabilidade de um evento que possibilitaria um benefício futura para a vítima, como progredir na carreira artística ou militar, arrumar um melhor emprego, deixar de recorrer de uma sentença desfavorável pela falha do advogado, e assim por diante. Deve-se, pois, entender por chance a probabilidade de se obter um lucro ou de se evitar uma perda”1

Outrossim, devemos destacar que, na análise da perda de uma chance, a probabilidade se dá mediante dados matemáticos, objetivando aferir se o fato realmente poderia ocorrer.2

Um caso bastante emblemático, se deu relacionado ao programa de TV ''Show do Milhão", no qual haviam diversas questões a serem respondidas, entretanto, no caso, houve uma questão mal formulada, o que ensejou na desistência da autora em dar seguimento à sua participação no programa.

Dessa forma, foi verificado que a mesma possuía uma chance real e séria, e que, em razão da questão ter 4 opções de resposta, a análise da probabilidade se daria  em 25% de chance de acerto.

Vejamos a decisão do caso:

RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO. IMPROPRIEDADE DE PERGUNTA FORMULADA EM PROGRAMA DE TELEVISÃO. PERDA DA OPORTUNIDADE. 1. O questionamento, em programa de perguntas e respostas, pela televisão, sem viabilidade lógica, uma vez que a Constituição Federal não indica percentual relativo às terras reservadas aos índios, acarreta, como decidido pelas instâncias ordinárias, a impossibilidade da prestação por culpa do devedor, impondo o dever de ressarcir o participante pelo que razoavelmente haja deixado de lucrar, pela perda da oportunidade.

2. Recurso conhecido e, em parte, provido.

(STJ - REsp: 788459 BA 2005/0172410-9, Relator: Ministro FERNANDO GONÇALVES, Data de Julgamento: 08/11/2005, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 13/03/06 p. 334).

Por fim, diante do acima narrado, a Teoria da Perda de uma Chance vem como uma forma de resguardar a possibilidade de reparar o evento danoso, do benefício que a pessoa receberia, se não tivesse sido prejudicada por fator externo à sua vontade, em que, em sua maioria, são causada por fato ilícito praticado por terceiro.

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1 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8º ed. São Paulo SP: Atlas, 2008

LIMA, Rodolfo Lucas. "TEORIA PERDA DE UMA CHANCE." Intertem@ s ISSN 1677-1281 34.34 (2017).

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FERRARA, Gabrielle Gazeo. Aspectos Gerais Sobre a Teoria da Perda de Uma Chance: quando uma oportunidade perdida é causa de indenizar. 2016. Disponivel em: https://www.migalhas.com.br/depeso/245438/aspectos-gerais-sobre-a-teoria-da-perda-de-uma-chance--quando-uma-oportunidade-perdida-e-causa-de-indenizar. Acesso em: 11 de maio de 2022.

LIMA, Rodolfo Lucas. "TEORIA PERDA DE UMA CHANCE." Intertem@ s ISSN 1677-1281 34.34 (2017).

STJ aplica teoria da perda de uma chance e condena escritório de advocacia por desídia em ação. Supremo Tribunal de Justiça. 07 de abril de 2022. Disponível em:https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/07042022-STJ-aplica-teoria-da-perda-de-uma-chance-e-condena-escritorio-de-advocacia-por-desidia-em-acao-.aspx Acesso em: 13 de maio de 2022

da Silva, T. L., & Dias, F. A. (2016). A teoria da perda de uma chance: critérios de aplicação e breve análise acerca da recente admissão doutrinária e jurisprudencial no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Da ESMESC, 23(29), 63–82. https://doi.org/10.14295/revistadaesmesc.v23i29. p63

SILVA. Rafael Peteffi. Responsabilidade Civil pela Perda de um Chance. 3 ed. 2013. Editora atlas.

NASCIMENTO, Silvia Renata Segatto Santos. Teoria da perda de uma chance . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3515, 14 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23709. Acesso em: 13 mai. 2022.

CAVALIERI FILHO, Ssponsabilidade civil. 8º ed. São Paulo SP: Atlas, 2008

Leonardo J. Queiroz
Mestrando em Direito Comercial pela Universidade de Lisboa, especialista em Direito Empresarial pela FGV. Diretor de mercado de capitais, regulação bancária e corporate finance do Barreto Dolabella Advogados.

Laila Gabriela da Silva
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário de Brasília - UniCEUB. Experiência em estágio profissional na Advocacia Geral da União, Supremo Tribunal Federal, Defensoria Pública do DF e em escritório de advocacia na área de execuções contra a Fazenda Pública.

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