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Fundamentos filosóficos e constitucionais do Direito Administrativo

Nenhum modelo de administração conseguiu atingir a perfeição, entretanto cada Estado deve-se pautar inicialmente no interesse público primário (coletividade) e fomentar a positivação dos direitos fundamentais erga omnes.

13/10/2022

A história do Direito administrativo iniciou-se com a queda do absolutismo e a consequente criação da responsabilidade subjetiva do Estado, pautada na demonstração da culpa in elegendo ou in vigilando. Posteriormente, por toda a Europa, muitos questionamentos surgiram a respeito das sujeições e das prerrogativas das instituições estatais, gerando novos paradigmas objetivos de responsabilização da atuação estatal. Ou seja, o excesso de poder e os desvios de finalidades das atitudes dos monarcas europeus ocasionaram as revoluções por toda a Europa Continental, com destaque para a Revolução Francesa.

Nessa linha de argumentação, deve-se iniciar a explanação sobre o Direito francês e as suas peculiaridades que inspiraram os modelos jurídicos vigentes até os dias de hoje. A priori, a França criou o Conselho de Estado (órgão compatível com o contencioso administrativo) e a separação de poderes, cuja jurisdição administrativa coadunava com a legalidade estrita. Nessa toada, faz-se mister destacar que havia certa desconfiança de autoridades francesas em relação ao Poder judiciário (resquício do período absolutista), uma vez que o poder exercido era totalmente arbitrado pela monarquia. Ademais, o modelo francês de administração repudiava o Direito privado positivado pelo Código Civil, devido à imensidão de lacunas que geravam insegurança jurídica. Por conseguinte, nessa época, era cediço que quanto menos desenvolvido era o Direito administrativo de um Estado, maior era a aplicação do Direito privado nas relações jurídicas”. Entretanto, muitos foram os benefícios gerados por este modelo como: os ideais de serviço público, os atos administrativos, a responsabilidade civil do Estado, os contratos administrativos e a delegação de serviços, entre outros. Todavia, alguns acreditam que o Direito administrativo francês pode ter se apegado ao excesso de leis aplicadas aos casos concretos, sem repensar sobre a abstrativização das normativas em si.

Outrossim, para complementar a historicidade do Direito administrativo, deve-se argumentar sobre o Direito alemão e sua forma de constitucionalizar os princípios com conceitos jurídicos indeterminados. Explicando melhor, este modelo priorizava a utilização do mérito dos atos administrativo, pautado na razoabilidade sem rupturas violentas, com construção disruptiva e subjetiva. Nesse contexto, a administração alemã também inovou ao utiliza-se do poder de polícia no Direito civil, penal e processual, sendo um paradigma para muitos países em constitucionalização iminente. Por conseguinte, quando se compara o Direito francês ao Direito alemão, percebe-se que se complementam e ao mesmo tempo se contrapõem, pois o modelo alemão demonstra alto grau de abstração em relação àquele, mas ambos são dependentes do Direito comunitário europeu.

Depois de toda a dissertação sobre o Direito francês e o Direito alemão, deve-se discursar sobre o Direito anglo-americano, com modelo pautado no “common law” enraizado em precedentes conglobando com o princípio do devido processo legal e da celeridade. Portanto, quando ocorrem decisões proferidas com base nas leis preexistentes, há constituição de precedentes judiciais que podem ou não vincular os magistrados, para que ocorra uma unificação de julgamentos com segurança jurídica. Destarte, estes julgamentos repetitivos poderiam ter força obrigatória de atuação denominada “stare decisis”, uniformizando os julgamentos, desabarrotando o Poder Judiciário de lides.

Nesse viés argumentativo, o modelo administrativo brasileiro mesclou parte do aparato francês sobre a separação de poderes, incluindo a constitucionalização dos princípios do Direito alemão, além de aceitar a teoria dos precedentes judiciais descritos no Direito anglo-americano. Em vista disso, depois de muitas adaptações em relação à compatibilidade de normas aos casos concretos, o Direito administrativo brasileiro inovou na constitucionalização de Direitos, na privatização de instituições, na publicização, na agencificação utilizando-se do compliance e da eficiência da Constituição Federal de 1988. Todavia, esta superconstitucionalização de Direitos pode gerar críticas, uma vez que a substituição da legalidade por constitucionalidade incide em arrefecimento da margem legislativa ou engessamento da produção de leis.

Desse modo, diante de toda a aplicação teleológica dos diversos paradigmas administrativos, conclui-se que nenhum modelo de administração conseguiu atingir a perfeição, entretanto cada Estado deve-se pautar inicialmente no interesse público primário (coletividade) e fomentar a positivação dos direitos fundamentais erga omnes.

Joseane de Menezes Condé
Discente de Direito em Piracicaba, estagiária do TRT 15 e é formada em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve para o Jornal Gazeta Piracicaba.

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