A lei Federal 12.305, de 2 de agosto de 2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), completa 12 anos de vigência. Produzida tardiamente e após intensas negociações no Congresso, a Lei é marco na gestão dos resíduos sólidos no país e trouxe inovações importantes. Para citar algumas: a obrigatoriedade da elaboração de Planos de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PGIRS), a instituição de regras relativas à responsabilidade pela gestão dos resíduos e a criação da logística reversa.
A logística reversa consiste em se disciplinar a responsabilidade dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes pelos resíduos gerados pelo consumo de seus produtos. Trata-se da obrigação de recolher os resíduos sólidos gerados no pós-consumo dos produtos para reaproveitamento, reciclagem ou a destinação final ambientalmente adequada. O objetivo é o de responsabilizar quem lucra pelos resíduos gerados, além de incentivar o consumo consciente, o reaproveitamento e a reciclagem dos resíduos, diminuindo o volume depositado em aterros sanitários.
Derivados do princípio do poluidor-pagador, os dispositivos da lei que tratam sobre a logística reversam não são de aplicação automática e dependem de regulamentação prevista na legislação, que pode ser tanto um regulamento editado pelo Presidente da República como um ato regulamentar na forma de acordo dos representantes das empresas atuantes em cada setor.
O decreto 7.404/10, de 23 de dezembro de 2010, veio pouco mais de 120 dias depois da publicação da lei e fixou como meios de implementação e operacionalização da logística reversa os acordos setoriais, regulamentos e termos de compromisso, sem, no entanto, instituir a logística reversa, confiando que cada setor seria capaz de produzir seus acordos setoriais e, assim, por meios negociados e consensuais gerar a regulamentação. Contudo, essa aposta do regulamento não produziu resultados.
Setores
Exceção foram os setores de embalagem de agrotóxicos, pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes e suas embalagens, que receberam obrigação expressa na PNRS, e cujos acordos setoriais previam entidades gestores, responsáveis para organizar e custear os processos de coleta dos resíduos e sua destinação adequada.
Ocorre que nem todas as empresas atuantes em determinado setor assinaram os acordos setoriais federais, eximindo-se dos custos relativos ao cumprimento das obrigações impostas pela legislação nacional. Para solucionar esse problema, o decreto 9.177, de 23 de outubro de 2017, expandiu a obrigação de organizar sistema de logística reversa a todos os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de determinado setor contemplado por acordo setorial, independentemente de serem signatários do acordo.
Ainda, no início deste ano, o decreto 10.936, de 12 de janeiro de 2022 substituiu o decreto 7.404/10 como regulamento do PNRS e incorporou as inovações trazidas pelo decreto 9.177/17.
Porém, o mais importante acordo setorial – o de embalagens em geral – foi um fracasso. Seu conteúdo é extremamente limitado, sequer prevendo a entidade gestora da obrigação das indústrias, importadores, distribuidores e comerciantes.
Por causa disso, estamos longe de tornar a logística reversa uma prática universal no Brasil, tal como em outros países, como Portugal, Alemanha e Áustria. Em muitos países da Europa, por exemplo, os produtores se juntaram e criaram a Sociedade Ponto Verde, empresa sem fins lucrativos responsável por recolher, reciclar ou de outra forma dar destino ambientalmente adequado às embalagens após o consumo de seus produtos. Assim, as empresas, em conjunto, conseguem bater a meta de logística reversa instituída pela autoridade pública.
Articulação
De outro lado, no Brasil, não há autoridade regulando e fiscalizando a logística reversa de maneira ampla. Assim, na prática, o que ocorre é que os Municípios acabam recolhendo as embalagens e demais resíduos de responsabilidade dos produtores dentro do serviço público de manejo de resíduos sólidos urbanos, subsidiando a atividade econômica poluidora do setor empresarial. Em outras palavras, as empresas deixam de cumprir sua responsabilidade às custas do Poder Público Municipal.
A PNRS apresenta solução para este problema, ao dispor que os Municípios podem encarregar-se de atividades de responsabilidade dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes nos sistemas de logística reversa, desde que sejam devidamente remunerados para isso – mas isso também não é feito.
Enfim, a melhora da regulação e da fiscalização dos sistemas de logística reversa é essencial para que o instrumento saia do papel. Ainda, é indispensável a articulação entre o governo federal e os governos estaduais e municipais quanto ao tema, para que os acordos setoriais firmados tenham efetividade. Esperamos que isso ocorra o quanto antes, porque, decorridos doze anos da Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, pouco temos a comemorar.