Uma vez mais o ataque às instituições públicas volta aos noticiários, estampando a prisão de cidadão que, aproveitando-se do grande alcance conquistado pelas redes sociais, propaga ferozes declarações contra integrantes dos poderes da república.
No episódio destacado, o Supremo Tribunal Federal (STF), após pedido da Polícia Federal, que instaurou investigação para apurar os crimes de associação criminosa e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, determinou a prisão temporária de influencer que utilizada o nome de “Terapeuta Papo Reto”, em razão do investigado publicar vídeos nas redes sociais nos quais declarava que a Corte Suprema deveria ser fechada e, em outros episódios, ameaçava reunir pessoas para “caçar” os Ministros que integram a corte, ofendendo-os com dizeres pejorativos.
Vale destacar que os episódios de prisões e instaurações de inquéritos policiais – e não policiais – em face de sujeitos que atacam as instituições públicas – e políticas – têm se tornado cada vez mais comuns nos últimos meses.
Para além do caso Daniel Silveira, cada vez mais influencers digitais sofrem buscas e apreensões e até prisões decorrentes de vídeos publicados nas diversas redes sociais existentes e nas quais, alegadamente, os limites da liberdade de expressão são excedidos.
Nesta linha, a discussão acerca dos limites da liberdade de expressão torna-se de latente importância pois, em última análise, os incidentes comentados resumem-se ao uso abusivo dos direitos e garantias constitucionais, o que demanda a atuação dos órgãos de segurança pública e persecução criminal.
Contudo, apesar de ser bem verdade que nenhum direito legalmente estabelecido é absoluto, nem mesmo os constitucionalmente determinados, a questão acerca da demarcação dos limites de fruição dos diretos ainda é um tema controverso.
Isto porque, por não ser um parâmetro descrito em letra de lei e, portanto, impossível de ser analisado objetivamente, a determinação dos limites da liberdade de expressão acaba por demandar uma análise subjetiva dos operadores do direito, fator que coloca em risco a própria integridade do Estado Democrático de Direito – o mesmo que é protegido pelos limites da liberdade de expressão -, ao passo que o afrouxamento das subjetividades no âmbito de aplicação da lei penal pode trazer, por via de consequência, a prática de ilegalidades.
Assim dizendo, colocar nas mãos do agente julgador o poder/dever de dizer o que é abuso, é atribuir um poder demasiadamente perigoso, haja vista que os postulados legais e normativos existem, essencialmente, para limitar o poder atribuído aos que o exercem, sobretudo quando a capacidade de dizer se houve violação da liberdade de expressão está nas mãos da vítima do suposto crime apurado, como é o caso ilustrado.
Ademais, outro ponto importante a se ressaltar está na dessemelhança entre o ataque e a mera crítica, esta última acobertada pela liberdade de expressão, desde que outra “liberdade” não seja afrontada.
Para além dos apontamentos atinentes à demarcação dos limites de exercício dos direitos está a própria relevância e potencialidade lesiva das manifestações, cenário em que se deve diferenciar o pronunciamento proferido numa mesa de bar com meia dúzias de pessoas, daquele articulado em uma rede social com número expressivo de seguidores.
Deste modo, admite-se que as declarações atualmente emitidas em âmbito digital, ainda que não possuam, inicialmente, uma intenção manifesta de atacar as instituições públicas, adquirem especial relevância, atraindo a intervenção do Estado, exatamente pelo potencial lesivo que possuem, o que está intimamente relacionado à capacidade de propagação da mensagem.
Todavia, ainda é importante que se reflita acerca da problemática de se criminalizar os discursos digitais, exatamente pela dificuldade de se analisar o elemento doloso na conduta do agente, haja vista que, em tempos atuais, grande parte dos usuários tem como principal força motriz o desejo de chamar atenção, sobretudo em conteúdos monetizados, estando ausente, no mais das vezes, o ímpeto criminoso.