Os avanços para quebrar o estigma que envolve o HIV e a Aids caminham a passos lentos. Ainda em 2022 se percebe o preconceito contra pessoas que vivem com o vírus, o que acaba por gerar receio naqueles que recebem diagnóstico positivo e, por consequência, tendem a gerar menor busca pelo tratamento e pelos exames periódicos.
O Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) é responsável pela Aids, que ataca células específicas de defesa do organismo e enfraquece o sistema imunológico, deixando-o mais propenso às doenças. O que o difere de outros vírus, como a gripe, é sua resistência. Não é possível livrar-se do HIV, pois ele não tem cura, tampouco existe vacina. Ter HIV não significa que a pessoa desenvolverá Aids, apesar de ter que conviver com essa realidade para o resto da vida. Atualmente, existem tratamentos eficientes que podem inclusive manter o vírus indetectável e intransmissível.
Atualmente, no Brasil, existem mais de 920 mil pessoas vivendo com HIV (PVHIV) que fazem tratamento, sendo mais de 775 mil destas já estão vinculadas ao SUS, de acordo com informação divulgada em setembro de 2021 pela UNAIDS.
Cabe ressaltar que as técnicas para desenvolvimento de medicamentos estão em constante avanço, sendo que o tratamento de uma pessoa com HIV (PVHIV) hoje foi simplificado, em comparação com a realidade de algumas décadas atrás. Ainda, é sempre importante destacar que no Brasil o tratamento do HIV é feito de forma 100% gratuita pelo SUS, haja vista ser um direito de todo brasileiro ter acesso à saúde.
Em 1989 foi realizado o ENONG - encontro nacional de ONGs que trabalham com Aids, em Porto Alegre, momento em que profissionais da saúde e membros da sociedade civil, com apoio do departamento de doenças de condições crônicas e infecções sexualmente transmissíveis, assinaram a declaração dos direitos fundamentais da pessoa portadora do vírus da aids1, que elenca direitos e garantias de pessoas que vivem com o HIV.
O país conta ainda com legislações específicas em relação aos grupos mais vulneráveis à discriminação e ao preconceito, dentre eles os portadores de doenças crônicas infecciosas, tais como:
Garantia de acesso ao tratamento de forma gratuita
Indivíduos que vivem com HIV têm direito ao tratamento gratuito oferecido pelo SUS, segundo a lei 9.313/96. A pessoa com vírus não pode ter o acesso negado ou proibido ao tratamento e aos medicamentos.
Sigilo médico e no trabalho
O sigilo, tanto médico quanto no ambiente de trabalho, é um direito fundamental das pessoas que vivem com HIV. O sigilo inclui, principalmente, exames admissionais, periódicos e demissionais.
Em caso de descumprimento, as empresas estão sujeitas às penalidades previstas na lei 14.289/22 (penalidade da Lei Geral de Proteção de Dados e indenizações por danos morais e materiais, autuação por parte do Ministério do Trabalho, inquéritos por parte do Ministério do Trabalho e ações trabalhistas.
Proteção de Dados Pessoais
Do ponto de vista de proteção de dados pessoais, a informação sobre a pessoa que vive com HIV é considerada um dado sensível, aos olhos da Lei Geral de Proteção de Dados (lei 13.709/18 - LGPD), por se tratar de dado referente à saúde.
Na mesma esteira, reforça o cuidado o tratamento dos dados e com o sigilo das informações a lei 14.289/22, em vigor desde janeiro de 2022, que torna obrigatória a preservação do sigilo sobre a condição de pessoa que vive com infecção pelos vírus da imunodeficiência humana (HIV) e outras doenças.
Saque integral do FGTS
As pessoas vivendo com HIV têm direito ao saque integral do valor do FGTS, a qualquer momento, de acordo com a lei 7.670/88, independente de rescisão de trabalho.
Aquisição de veículo novo com isenção de IPI
É direito da pessoa vivendo com HIV, segundo lei 10.182/01, adquirir um veículo novo com isenção de IPI.
Auxílio-doença e aposentadoria por invalidez
A lei 7.670/88, estende aos portadores da SIDA/AIDS - síndrome da imunodeficiência adquirida benefícios previdenciários, estabelecendo a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria, independentemente do período de carência, para o segurado que, após filiação à Previdência Social, vier a manifestá-la, bem como a pensão por morte aos seus dependentes e o levantamento dos valores correspondentes ao FGTS - Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, independentemente de rescisão do contrato individual de trabalho ou de qualquer outro tipo de pecúlio a que o paciente tenha direito
O direito ao auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez também estão previstos na Instrução Normativa INSS/PRES 45, de 6 de agosto de 2010, revogada pela Instrução Normativa INSS 77 DE 21/1/15, que foi alterada pela Instrução Normativa INSS 117/21.
Proibição de testagem obrigatória na relação de emprego
A testagem obrigatória é vedada por meio de dispositivos infraconstitucionais, trabalhistas, administrativos e éticos profissionais, além de instrumentos internacionais da Organização Mundial de Saúde e da Organização Internacional do Trabalho.
A portaria 1.246/10 do então Ministério do Trabalho e Emprego, hoje Secretaria do Trabalho, em seu art. 2º estabelece: “Não será permitida, de forma direta ou indireta, nos exames médicos por ocasião da admissão, mudança de função, avaliação periódica, retorno, demissão ou outros ligados à relação de emprego, a testagem do trabalhador quanto ao HIV.
Imposto de Renda
Pessoas com HIV têm assegurado o direito à isenção do Imposto de Renda e, inclusive, o ressarcimento de valores retroativos a 5 anos a partir da comprovação da infecção. Tal previsão está prevista no art. 6º, inciso XIV, da lei 7.713/88.
Além disso, visando a proteção desse grupo e de seus direitos humanos, foi criada em 2014 a lei 12.984, estabelecendo como crime a discriminação às pessoas vivendo com HIV e AIDS. O diploma legal elenca condutas discriminatórias, como negar emprego ou trabalho, segregar no ambiente de trabalho ou escolar e recusar ou retardar atendimento de saúde, dentre outras, com previsão de reclusão.
É de extrema relevância que as empresas e organizações tenham conhecimento da legislação que ampara as pessoas que vivem com HIV, pois se torna um dos principais meios de se garantir que elas tenham a oportunidade de serem respeitadas e que conheçam seus direitos.
Os profissionais que vivem com HIV estão amparados por lei e é de suma importância que tenham conhecimento sobre os seus direitos, pois, além de quebrar um tabu em nível empresarial, estimula a discussão deste assunto tão estigmatizado e contribui para a promoção de um local de trabalho livre de discriminação.
A necessidade de inclusão de pessoas portadoras do vírus HIV passa por um esforço legal de penalizações aos que os desrespeitam direitos, mas em especial pela quebra de paradigmas por meio de conscientização da sociedade. Um longo caminho já foi percorrido nos últimos anos, mas ainda há muito a ser feito!
Aos que vivem com HIV, é recomendável inserir-se em uma rede de apoio, que conte com aconselhamento jurídico e aproximação com o serviço social, de modo a garantir acesso às informações mais atualizadas quanto aos direitos garantidos.
1 Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/publico-geral/direitos-das-pvh