Migalhas de Peso

A coerência da AGU pela impossibilidade de cobrança do ICMS DIFAL em 2022

Com a finalidade de evitar perda de arrecadação por parte de estados e do DF, o STF modulou os efeitos de sua decisão.

18/3/2022

Em 08/3/22, a advocacia geral da união se manifestou, nos autos da ADIn 7.070, no sentido de que a cobrança do DIFAL, diferencial de alíquota, do ICMS deve respeitar o princípio da anterioridade anual.

O STF em 24/2/21, julgou o RE, recurso extraordinário, 1.287.019/DF, tendo fixado o entendimento no sentido de ser inconstitucional a cobrança do DIFAL do ICMS enquanto não editada lei complementar regulamentando a matéria.

Isso, porque a Constituição Federal, na alínea "a" do inciso III de seu art. 146 e no inciso XII do § 3º de seu art. 155, disciplinou que as normas gerais de direito tributário devem ser disciplinadas por lei complementar e, com isso, inexistindo lei complementar que trate do ICMS-DIFAL, a cobrança se faz inconstitucional.

Contudo, com a finalidade de evitar perda de arrecadação por parte de estados e do DF, o STF modulou os efeitos de sua decisão para permitir a manutenção da cobrança do diferencial de alíquota até 31/12/21, considerando que seria tempo suficiente para a edição de lei complementar regulamentando a matéria.

E, de fato, foi editada lei complementar disciplinando sobre o diferencial de alíquota – lei complementar 190/22. Contudo, a norma não foi publicada até 31/12/21, visto que só foi sancionada e publicada em 5/1/22, fato que trouxe uma nova discussão sobre o DIFAL do ICMS, qual seja se a cobrança do imposto seria autorizada para o ano de 2022, e a partir de qual momento em 2022 seria possibilitada a sua exigência; se de imediato ou apenas depois de 90 dias de sua publicação, ou se ela só poderia se dar a partir de 2023.

Em que pese Estados e DF estejam manifestando entendimento no sentido de ser permitida a cobrança do DIFAL já em 2022 ,havendo divergências quanto ao momento da exigência, se imediatamente, se após 90 dias da publicação das normas estaduais ou se após 90 dias da publicação da lei complementar, o entendimento aqui manifestado é no sentido de que o DIFAL do ICMS só pode ser exigido a partir de 1º/1/23, em respeito ao princípio da anterioridade anual insculpido na alínea "b" do inciso III do art. 150 da Constituição.

Isso, porque a Lei Ordinária Estadual, tal como reconheceu o STF quando do julgamento do RE 1.287.019/DF, busca seu fundamento de validade na lei complementar, in casu, a lei complementar 190/22, de modo que, apenas após a edição da norma geral de direito tributário que há a instituição do diferencial de alíquota.

Frise-se que o posicionamento ora esposado já foi exposto em outras oportunidades, como se vê dos arts. publicados em 5/1/221, 2/2/222 e 22/2/223.

Por conta disso, ante a necessidade de a cobrança do DIFAL do ICMS respeitar o princípio da anterioridade anual, em 8/3/22, a advocacia geral da união, nos autos da ação direta de inconstitucionalidade (ADIn) 7.070, ajuizada pelo governador do estado de Alagoas pleiteando a declaração de inconstitucionalidade do § 4º do art. 24 da lei complementar 87/96 e do art. 3º da lei complementar 190/224 , manifestou-se em sentido de que o diferencial de alíquota só pode ser exigido a partir de 1º/1/23.

No caso, a AGU, ao disciplinar que o DIFAL só pode ser exigido a partir de 1º/1/23, valeu-se do mesmo posicionamento acima manifestado, haja vista a manifestação no sentido de que "a lei complementar 190/22 implicou, por si, uma alteração legislativa com a consequência de ocasionar instituição ou majoração do imposto, submete-se à aferição quanto à observância do princípio da anterioridade, nos termos do art. 150, III, ‘b’ e ‘c’ da CF/88".

Parece acertada a conclusão da AGU, visto que, em primeiro lugar, antes da publicação da lei complementar 190/22, a cobrança do DIFAL do ICMS é inconstitucional, pois é da norma geral de direito tributário, norma complementar, que as leis ordinárias estaduais buscam seu fundamento de validade e, assim, sem lei complementar, as leis ordinárias são inválidas.

E a conclusão da AGU também parece acertada, pois, em segundo lugar, como as leis ordinárias buscam seu fundamento de validade da lei complementar 190/22, a instituição do ICMS-DIFAL se deu apenas após o dia 5/1/22, o que obriga que a cobrança respeite o princípio da anterioridade anual, já que a alínea "b" do inciso III do art. 150 da Constituição proíbe a cobrança de tributos "no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou".

Ou seja, em sendo o DIFAL uma nova exigência, já que cria uma nova relação jurídico-tributária (o que foi reconhecido pelo próprio STF), e em se tratando de cobrança que só foi instituída a partir de 5/1/22, então o ICMS-DIFAL deve respeitar o princípio da anterioridade anual, de modo que a conclusão da AGU parece acertada.

_____

ROMANO, Bruno. ICMS-DIFAL e o princípio da anterioridade. São Paulo: Escola Brasileira de Tributos, 05.01.2022.

2 ROMANO, Bruno. O inconformismo dos Fiscos Estaduais não torna constitucional o DIFAL para o ano de 2022. São Paulo: Escola Brasileira de Tributos, 02.02.2022.

3 ROMANO, Bruno; CRIVELLI FILHO, José Luiz; ROMANO, Michelle Cristina Bispo. Mais uma inconstitucionalidade do ICMS-Difal: novo capítulo de uma história sem fim. São Paulo: Estado de S. Paulo, 22.02.2022.

4  Artigos mencionados determinam que a cobrança do DIFAL só pode se dar após respeitado o prazo de anterioridade nonagesimal da alínea "c" do inciso III do artigo 150 da Constituição.

Bruno Romano
Sócio PPA Law | Professor do IBET | Colunista da EBT | Mestrando em Direito Tributário no IBET | Pós-Graduado em Direito Tributário no IBDT | Graduado em Direito no Mackenzie

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