Migalhas de Peso

Ciência ou panfleto?

O intento inicial do escopo deste artigo é defender ferrenhamente o Código Florestal de 2012 na condição de lei regularmente aprovada pelo Congresso e com vigência plena e aplicação assegurada, sobretudo após sua consolidação pelo julgamento das ADIs ajuizadas contra ele.

11/3/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

1) Questão sob análise

Doze professores de universidades e membros de institutos de pesquisa do Brasil, no mês de fevereiro de 2022, assinaram um artigo com o título “O Risco de Falsas Controvérsias para as Políticas Ambientais Brasileiras”1, e conseguiram sua publicação na Revista Biological Conservation, da Editora Elsevier, na Holanda. E nele desferem ataques em todas as direções, tendo por alvo diversas pessoas e entidades.

Dentre as muitas acusações, falam que “controvérsias falsas” produzidas por “um pequeno grupo de pesquisadores brasileiros ativos” impactaram seriamente “a conservação ambiental, sobretudo em questões relacionadas ao desmatamento e às mudanças climáticas”. E mais: usando indevidamente “credenciais científicas e desconsideração da literatura científica”, tais pessoas e entidades teriam fabricado “pseudofatos, ou seja, afirmações em desacordo com a literatura estabelecida, mas que se esforçam para aparecer como fatos científicos”.

Com essas premissas, propõem-se tais articulistas a examinar essas supostas “falsas controvérsias que surgiram no Brasil nas últimas décadas, as quais prejudicaram a conservação ambiental, principalmente nas questões de mudanças climáticas e desmatamento”.

Nesse afã, acusam, de roldão, a Embrapa (incluindo sua afiliada Embrapa Territorial e, nominalmente, seu pesquisador Evaristo Eduardo de Miranda), Deputados, Senadores, todos os Presidentes da República (no mínimo desde o Presidente Sarney até o atual, sem exceção), responsabilizando-os por um “ataque às políticas ambientais” e pelo “desmonte das políticas de conservação ambiental no Brasil na última década”, o que resultou em “adiar ações ou desmantelar políticas-chave de conservação”. E, justificando sua ação, afirmam escrever o artigo com vistas a analisar “a presença e a influência desse grupo de pesquisadores e de seu coordenador nos poderes executivo e legislativo do governo federal brasileiro”.

2) O que não é escopo deste artigo

O autor destas linhas não tem procuração para defender dos ataques nenhum dos Presidentes da República, de José Sarney a Jair Bolsonaro. Mas não pode deixar de dizer que o confuso relato do artigo chama a atenção, quando pretende enredá-los todos, indistintamente, como marionetes manipuladas pela equipe da Embrapa Territorial sob a batuta de seu maestro, Dr. Evaristo de Miranda, alçado pelos articulistas à condição de verdadeiro Rasputin dos trópicos, quer no grau de influência sobre eles exercida, quer na suposta manipulação de dados, tudo com vistas ao afrouxamento das regras das políticas ambientais.

De igual modo, não se outorgaram poderes ao autor deste trabalho para refutar as acusações feitas aos Deputados Federais e aos Senadores, que teriam votado, durante muitos anos, quase que sob o poder da hipnose exercida sobre eles pela mesma equipe e por seu bruxo maior. Mas, aqui também, não se pode deixar de anotar que chega a ser ofensivo e pueril pensar que tais integrantes de nosso Parlamento, pessoas experimentadas na vida e na política, teriam aprovado medidas jurídicas e o próprio Código Florestal de 2012 apenas porque o Dr. Evaristo lhes teria apontado a direção em que votar; ou mesmo que teriam votado nesse sentido em razão de dados supostamente manipulados por aquele.

Por fim, este articulista não tem poderes para defender a Embrapa nem sua afiliada Embrapa Territorial, muito menos as equipes de ambas as entidades, ou, ainda, o próprio Dr. Evaristo de Miranda. Aqui também, entretanto, não se pode deixar de considerar, por um lado, as dezenas de notas de apoio de grupos, institutos, associações, sindicatos, entidades e conselhos oficiais, além de autoridades, em verdadeira confirmação do acerto dessas pessoas e entidades em sua atuação ao longo de todos esses anos, e tudo com o poder de fazer contraposição eficaz às acusações genéricas e não provadas dos articulistas.

Além disso, não é intento deste autor debater os critérios, a metodologia e as pretensas premissas científicas do trabalho sob análise. Entretanto, de igual modo, salta aos olhos que, mesmo tentando conferir um cunho científico de obediência à metodologia, o artigo é confuso e peca pelo principal: tenta desacreditar a metodologia utilizada pelos contrários, mas isso parece apenas servir para esconder a realidade efetiva, que é o fato de não conseguir contraditar ou provar a falsidade ou o desacerto dos dados que constam oficialmente nas publicações dos trabalhos realizados pelas entidades e pesquisadores atacados. Patenteia-se, ademais, que, em suma, os articulistas tentam questionar a forma (e mesmo assim de modo incipiente e sem convicção no plano científico), mas não conseguem combater minimamente o conteúdo.

Por fim, também não é escopo deste artigo polemizar com os articulistas, nem confrontar ou estimular radicalismo de qualquer ordem, já que isso apenas vai acirrar um inglório e infrutífero confronto entre ideologias; nessa condição, apenas vem a público o autor destas linhas, porque, na publicação aqui analisada, dentre as demais acusações, tentou-se diminuir o Código Florestal de 2012 de sua efetiva realidade, natureza e valor, quer no que tange às razões para seu advento, quer no que toca às discussões quando ainda projeto, quer no que concerne às condições de sua aprovação, quer quanto à extensão de seu conteúdo, quer mesmo no que respeita à natureza e alcance de suas normas.

E, assim, porque estas linhas não têm por alvo polemizar e porque se considera que as explicações aqui constantes bastam para fazer tornar o CF-2012 à normalidade de seus trilhos e ao lugar que deve ocupar no conceito jurídico-legal, este autor, desde já, anota que não vai travar discussões nem terçar armas a esse respeito com quem quer que seja.

3) O que é o escopo deste artigo

Com isso, este artigo, ao revés, tem por alvo, num primeiro plano, considerar o que realmente seja o Código Florestal de 2012, quer buscando seus antecedentes e perscrutando a necessidade de sua edição, quer analisando-o em seu processo legislativo, sempre, porém, tendo-o na condição de diploma legal, que é e como deve ser tido em tais circunstâncias, na condição de direito positivo após sua regular aprovação pelo Parlamento e efetiva vigência, com a sedimentação advinda do julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade movidas contra ele (ADIs 4.901/2013, 4.902/2013, 4.903/2013 e 4.937/2013) e apreciadas em conjunto na ADC 42/2016. E esta análise será feita sem intento algum de tomar partido do meio ambiente por um lado, nem de patrocinar a defesa unilateral da produção agrossilvipastoril ou do agronegócio por outro lado.

Em outros dizeres, apenas se vai aqui defender o CF-2012 como Lei regularmente aprovada e vigente, e essa defesa se fará com a plena consciência e convicção de que, diante dos diversos valores confrontados para sua feitura, “em face dos princípios democráticos e da separação dos poderes, é ao Poder Legislativo que assiste a primazia no processo de ponderação” sobre o que é melhor ou não para o objeto das disposições legais2, e não aos demais poderes, nem aos doutrinadores, aos aplicadores, aos julgadores, aos estudiosos ou aos curiosos. E, com esses parâmetros, desde logo se refuta todo e qualquer intento de desqualificar ou desacreditar as normas nele contidas, não importando o motivo ou pretexto para tanto.

Adite-se que esse posicionamento encontra ressonância no acórdão que decidiu as ADIs já referidas, onde se assevera que “não é adequado desqualificar determinada regra legal como contrária ao comando constitucional de defesa do meio ambiente (art. 225, caput, CRFB), ou mesmo sob o genérico e subjetivo rótulo de ‘retrocesso ambiental’, ignorando as diversas nuances que permeiam o processo decisório do legislador, democraticamente investido da função de apaziguar interesses conflitantes por meio de regras gerais e objetivas”.3

Além disso, quando se afirma essa posição, tem-se fixa a ideia de que dificilmente se vai encontrar uma lei mais discutida na história do Congresso Nacional. Foram mais de 200 audiências públicas e privadas com ambientalistas, organizações não governamentais, agricultores, criadores, pesquisadores, juristas e gestores. No plano político, resultou sua tramitação em um placar representativo de enorme apoio parlamentar: na votação original do projeto na Câmara dos Deputados, 410 votos favoráveis contra 63. No Senado, 59 contra 7. E, em todo esse processo legislativo, fez-se presente o apoio dos principais partidos, quer de governo, quer de oposição.

E mais: contrariamente a eventual acusação de manobras da direita em prol do agronegócio em todo esse processo, não se pode esquecer que o relator do projeto na origem, na Câmara dos Deputados, era do PCdoB (Aldo Rebelo); e, no Senado, do PT (Jorge Viana).

Com todo esse quadro, longe de se buscar o descrédito do CF-2012, deve ser ele valorizado como a conquista do possível no difícil momento em que foi votado no Congresso Nacional; além disso, após sua aprovação e regular vigência, há de ser ele respeitado e aplicado como o Estatuto das normas pertinentes, que deve ter curso e aplicação prática em plenitude, o que obriga refutar na íntegra toda e qualquer atitude que queira solapar-lhe as bases ou desacreditá-lo a qualquer título.

4) O Código Florestal de 1934

Para contextualizar a questão aqui analisada e mesmo para entender, no plano histórico, as origens da codificação florestal hoje em vigor, é preciso dizer que o CF-1934 surgiu da preocupação com o rápido processo de derrubada das florestas nativas para a exploração da madeira. Não foi, portanto, um diploma bafejado por ideias de proteção ambiental. Isso quer dizer que o cuidado do governo em estabelecer normas relativas à preservação da flora se dava em razão dos desmatamentos ocasionados pela produção do café, bem como pela criação de gado no Vale do Paraíba (SP e RJ) e em outras regiões, o que vinha acarretando os desmatamentos de florestas e causando a escassez dos recursos naturais.

Não é por outra razão que, referindo-se a essa primeira codificação florestal pátria, Osny Duarte Pereira – posteriormente autor do projeto do CF-1965, bem como do primeiro trabalho de vulto sobre Direito Florestal em nosso País – , buscando fixar-lhe o objeto, já pontuava que o CF-1934, longe de coligir um ideário de regras de proteção ambiental, tinha por escopo “reunir um conjunto de normas destinadas a utilizar e desenvolver a vegetação, como instrumento de funções da Natureza e como reserva de material lenhoso”.4

Por fim, é preciso lembrar que houve imensas dificuldades para a implementação do CF-1934, de modo que se deve reconhecer a precária execução de seus dispositivos em todo o território nacional, em decorrência da inércia ou displicência das autoridades estaduais e municipais, quando não por resistência passiva e deliberada também dos demais destinatários das normas, no que concernia a sua aplicação.

5) O Código Florestal de 1965

Também ao largo de uma preocupação de preservação ambiental, o CF-1965, seguindo em mesma trilha de seu antecessor, veio “como um instrumento para organizar o setor madeireiro e conservar as reservas de florestas necessárias para o seu desenvolvimento; ele é, indiscutivelmente, um diploma legal com o intuito de disciplinar a atividade econômica, seu objetivo fundamental e razão da sua própria existência”. Isso quer significar que, “muito embora a vertente preservacionista tenha ganhado uma enorme relevância, a discussão central diz respeito às medidas de conservação nos espaços destinados à atividade econômica”.5

A esta altura, é preciso realçar que o CF-1965 trazia uma importante característica de nascimento. Seu art. 49 (na origem, art. 47, ao depois renumerado pela Lei 7.803/1989) determinava que o Poder Executivo haveria de regulamentá-lo, no que fosse “necessário à sua execução”. Pois bem: a pretexto de exercício desse poder regulamentador, foram editados, ao longo dos tempos, atos administrativos das mais diversas espécies e naturezas, com total exorbitância de atuação e de competência legislativa, muitos com total eiva de ilegalidade.

E foi como lição advinda das excrescências de condutas dessa natureza reiteradamente adotadas ao tempo da legislação revogada, que, décadas mais tarde, o projeto do CF-2012, quando tramitou no Parlamento, teve expurgadas de seus artigos muitas das previsões originais de regulamentação, dando preferência a uma redação que, sempre que possível, previsse a autoaplicabilidade de seus dispositivos e retirasse das mãos do Poder Executivo e dos órgãos ambientais a possibilidade de indevidas inserções não pretendidas pelo legislador de origem.

Por fim, firme-se que uma acurada análise do que realmente aconteceu demonstra que, mais do que tudo, a necessidade de substituição da codificação revogada pela que atualmente vige decorreu não de atuação coativa ou influência indevida de estudiosos do assunto, nem de pressão sub-reptícia por parte do agronegócio, nem veio para anistiar desmatamentos, ou mesmo para arrefecer elos do sistema anterior de proteção ambiental, mas resultou, substancialmente, das “absurdas alterações que sofreu em anos recentes” a codificação revogada, a qual se viu completamente desfigurada por “decretos, portarias, resoluções, instruções normativas e até por uma medida provisória que virou lei sem nunca ter sido votada”.6

6) O Código Florestal de 2012

Tendo em vista todo o aparato que cercou a discussão que o precedeu, a publicidade das ideias em confronto e a participação maciça de parlamentares em ambas as casas do Congresso para sua aprovação, quando se contou com partidos da base do governo e da oposição, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs movidas contra ele, apreciadas em conjunto na ADC-42/2016, acabou por concluir que “o Código Florestal ostenta legitimidade institucional e democrática”.7

Além disso, quando se analisa a realidade que permeou as discussões e as votações em ambas as casas legislativas, vê-se que o CF-2012 pode ser considerado um real avanço, constituindo aquilo que se pode reputar um regramento do possível em diversos pontos. Nessa linha, sempre se deve lembrar que o mencionado diploma, dentro do que lhe era factível na oportunidade, nasceu do meio-termo, ou, ainda, do “pacto possível” para, de uma banda, “assegurar aos produtores rurais a legalização de suas atividades”, sobretudo ante o emaranhado de medidas administrativas e normas editadas ao largo do Poder Legislativo, muitas delas ilegais, e, de outra, para conferir “as respectivas garantias de proteção do meio ambiente e da natureza”.8

Ante todo esse conjunto de ideias, se alguém disser que o CF-2012 é imperfeito, a resposta será positiva; se indagar se há pontos a serem corrigidos, acrescentados ou aperfeiçoados, a resposta será a mesma; mas qualquer tentativa de desmerecer seu processo legislativo, de desacreditar as normas nele constantes, de diminuir os agentes que se envolveram em sua aprovação ou de desestabilizar sua aplicação deverá merecer o mais veemente repúdio.

7) Quanto aos equívocos do artigo analisado

Tendo essas considerações como premissas, passa-se a exemplificar com alguns pontos específicos em que o artigo sob análise claudicou na consideração direta ou indireta de itens e aspectos do CF-2012, quer em sua origem, quer em seu conteúdo, quer em sua exegese.

E, já de início, forçoso é observar que o argumento de “uso indevido de credenciais científicas” levantado por ele para impingir à equipe da Embrapa Territorial e a seu pesquisador chefe a prática de criação de “falsas controvérsias” bem pode ser empregado contra os próprios articulistas. É o feitiço virando contra os feiticeiros. Na prática, veja-se que, pelo conceito trazido por eles, tal situação de “uso indevido de credenciais” se tipifica quando “a autoridade científica é empregada para falar sobre questões que o cientista não domina”. Talvez, no caso, seja essa a causa de vários dos equívocos, já que pessoas de formação em outras áreas se põem a discutir questões legais e jurídicas. Tivessem eles consolidada formação na área, e bem possivelmente não haveriam de criar, eles sim, as “falsas controvérsias” que tentaram fazer passar por princípios consolidados e premissas indiscutíveis no plano da Ciência do Direito, como se verá em minúcias a seguir.

Em realidade, por serem maciçamente alheios à Ciência do Direito, não se lhes pode exigir tal raciocínio técnico. Adite-se, todavia, que, se isso serve de alguma explicação para o infeliz artigo que cometeram, mesmo assim não podem eles ficar sem advertência. E, assim, como consequência de seu ato, talvez seja o caso de repetir-lhes a admoestação do pintor Apeles na Grécia antiga, quando um sapateiro, após criticar um detalhe na sandália de um quadro em exposição e ver prontamente corrigido o equívoco, quis também censurar algum detalhe na parte superior, mas foi quando ouviu a seguinte resposta: “Sapateiro, não suba além do sapato!”9

Por fim, ante a extensão do rol passível de classificação e de consideração nesses equívocos, observa-se que, para não tornar demasiadamente longa esta exposição, são escolhidos apenas alguns temas jurídico-legais e trechos do artigo. Mas se esclarece que, em uma atenta leitura e análise, o leitor cuidadoso conseguirá garimpar outros erros perpetrados contra os princípios de exegese da Ciência Jurídica.

8) O CF-2012 causou um enfraquecimento das políticas ambientais?

Num primeiro aspecto, consideram-se as seguintes afirmações do artigo sob análise: (a) “o Código Florestal enfraqueceu as políticas ambientais”; (b) “o enfraquecimento das políticas ambientais do Brasil [...] começou com a aprovação, pelo Congresso Brasileiro, de uma versão revisada do Código Florestal”; (c) a atitude dos pesquisadores acusados pelos articulistas, no modo de ver destes últimos, “se opôs ao consenso científico sobre o assunto ao afirmar [o Dr. Evaristo de Miranda] em um vídeo popular no YouTube que o Brasil é o país que mais preserva sua floresta e que suas práticas agrícolas são as mais sustentáveis do mundo”.

Ora, sem que aqui haja espaço para discutir em profundidade e minúcias todos esses argumentos (que também – é preciso lembrar – foram lançados sem maior fundamentação pelos articulistas), frisam-se, ainda que com brevidade, os seguintes pontos: (i) várias das medidas em vigor antes do início de vigência do CF-2012 eram ilegais, de modo que não se pode considerar, assim, pacífica a afirmação de era firme, consolidada e indiscutível essa suposta política de proteção ambiental10; (ii) esclarece-se que essa afirmação de enfraquecimento da proteção ambiental – embora não haja detalhamento no artigo escandido – costuma passar por um tripé de argumentos não discutidos por ele, mas sempre alegados nessas situações, a começar pela suposta novidade do art. 15 do CF-2012, que admite “o cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo do percentual da Reserva Legal do imóvel”; (iii) esquecem os que assim argumentam que o CF-1965, com as disposições incluídas pela Medida Provisória 2.166-67/2001, já admitia, em seu art. 16, § 6º, tal cômputo para constituir a reserva legal de um imóvel rural; (iv) como segundo elemento desse tripé, essa afirmação de enfraquecimento da proteção ambiental costuma passar pelo ataque à suposta novidade do art. 68 do CF-2012; (v) esquecem, porém, mais uma vez, que tal dispositivo exonerou de fazer reserva legal aqueles que o fizeram respeitando os percentuais de remoção permitidos pela “legislação em vigor à época em que ocorreu a supressão”; (vi) uma atenta leitura e análise de tal dispositivo da nova legislação mostra que o legislador de 2012 enxergou o óbvio e erigiu em dispositivo de lei aquilo que defluía da própria análise das leis pretéritas protetivas da vegetação nativa; (vii) e assim agiu o codificador florestal, porque, por um lado, dominava então uma doutrina defensora de uma hermenêutica flagrantemente antijurídica, e, por outro lado, grassava uma jurisprudência integralmente contra legem, sempre invocando premissas e princípios totalmente incabíveis, o que determinava a imprescindibilidade de edição do art. 68 para resguardar o efetivo Direito; (viii) o terceiro elemento do tripé dessas alegações de enfraquecimento da proteção ambiental é uma suposta anistia, mas esse argumento – também de total inconsistência – será considerado a seguir, em tópico apartado; (ix) acresce dizer, por fim, que os articulistas afirmam, mas não trazem elementos para contestar ou desmentir os dados das publicações, bem como as duas afirmações dos pesquisadores, a primeira, de que “o Brasil é o país que mais preserva sua floresta”, e a segunda, de que “suas práticas agrícolas são as mais sustentáveis do mundo”.

9) Onde estaria a anistia?

Num segundo aspecto, volta-se a atenção aos seguintes trechos do artigo: (a) com essa atuação da equipe da Embrapa Territorial e de seu pesquisador chefe criando “controvérsias falsas”, teriam eles municiado a bancada do agronegócio, subsidiando-os com “números questionáveis [que] foram fundamentais para promover os interesses da bancada do agronegócio e decisivos para flexibilizar a lei”; (b) tais números “forneceram o conveniente argumento técnico necessário para justificar as mudanças, oferecendo e justificando uma anistia de 58% do desmatamento ilegal ocorrido antes até 2008”; (iii) como consequência, “o governo Bolsonaro – que convidou o Dr. Miranda para desenvolver diretrizes para a política ambiental – drasticamente diminuiu o número de multas ambientais relacionadas a desmatamento”; (iv) poro fim, “a anistia aprovada ao desmatamento ilegal passado sinalizou que um benefício semelhante pode ser concedido no futuro”.

Buscando ser breve nas considerações a esse respeito, alinham-se os seguintes pontos: (i) os articulistas não discriminaram os componentes do percentual que alegaram como desmatamento, nem conceituaram o entendimento do que para eles seja “desmatamento ilegal”; (ii) o certo, porém, é que o vocábulo anistia tem sido utilizado, em discussões como esta, sem precisão jurídica alguma; (iii) assim, alguns consideram como anistia o que expressa o art. 15 do CF-2012 – que permite o cômputo das áreas de preservação permanente no cálculo da reserva legal; (iv) como fazem separadamente o cálculo de tais exigências, a diferença advinda da permissão do cômputo constitui, em seu modo de entender, anistia para um desmatamento ilegal; (iv) outros se apegam  à primeira parte do art. 12 do CF-2012 – segundo a qual todo imóvel deve “manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de reserva legal”, o que, na maior parte dos Estados significa 20% da área do imóvel; (v) esquecem, porém, a parte final do dispositivo, que manda “excetuar os casos previstos no art. 68”, o qual exonera de fazer reserva legal aqueles que removeram vegetação nativa respeitando os percentuais de remoção permitidos pela “legislação em vigor à época em que ocorreu a supressão”; (vi) como porém, mais uma vez partem do princípio sem exceção de que todos os imóveis devem manter reserva legal, a porção dos legalmente exonerados também é tida por eles na conta de anistia para um desmatamento ilegal; (vii) outros, ainda, invocam o art. 59, § 5º, do CF-2012, o qual permite aos que aderem ao Programa de Regularização Ambiental a suspensão das “sanções decorrentes das infrações” praticadas antes de 2008, e tais aderentes podem tê-las suspensas enquanto cumprem o respectivo termo de compromisso, e, mais ainda, uma vez “cumpridas as obrigações estabelecidas no PRA ou no termo de compromisso para a regularização ambiental das exigências”, podem ter as multas “consideradas como convertidas em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente, regularizando o uso de áreas rurais consolidadas conforme definido no PRA”; (viii) esquecem, contudo, em primeira linha, que esse acertamento de situações irregulares, nos moldes assim previstos, não é novidade trazida pelo CF-2012, mas já era objeto de disposições claras no ordenamento anterior, como atesta o Decreto federal 7.029/2009, que instituía o Programa Mais Ambiente com o intuito de conferir apoio à regularização ambiental de imóveis rurais que estivessem em desconformidade com a legislação então em vigor; (ix) esquecem, ademais, que o tratamento dado a tais situações pelo CF-2012 nem de longe constitui tecnicamente anistia, a qual implica necessariamente tanto a ideia de perdão, de esquecimento, de cancelamento de obrigações, como o sentido de ausência de contraprestação, o que nem de longe acontece no sistema de regularização ambiental do CF-2012; (x) e esquecem, por fim, que, mesmo que fosse real anistia, nenhuma ilegalidade haveria, já que ela pode ser concedida por lei nacional (CF-1988, art. 21, XVII, e art. 48, VIII), tendo competência para tanto o Congresso e o Chefe do Executivo, de modo que, no caso específico do CF-2012, mesmo que pudesse ser considerada existente, não deveria, em qualquer dos aspectos envolvidos, “ser considerada como abuso do poder de legislar”.11

10) Teria havido auxílio para pressão à bancada do agronegócio?

Passando a um terceiro aspecto, registra o artigo escandido que “a bancada do agronegócio do Congresso aumentou a pressão para relaxar a CF”.

Ora, quem assim afirma ou desconhece na totalidade o que está falando, ou está de integral má-fé no que diz. Se se considerar o número de membros da Frente Parlamentar da Agropecuária, verifica-se que a FPA detém, em última análise, a maior bancada do Congresso e, assim, é integrada por um número de parlamentares mais do que suficiente para aprovar o que quiserem.

Além disso, como o voto não exige justificativas, nem provas, nem argumentos, não precisam seus integrantes de números, estudos ou justificativas. Desse modo, se os buscam, é por zelo que o fazem. Se quisessem aprovar de outro modo, simplesmente poderiam votar no sentido desejado. Não precisariam fazer pressão alguma para relaxar qualquer estrutura legal; bastaria que produzissem os projetos de lei que reputassem ser de seu interesse, e os pusessem em votação, que os aprovariam.

11) Evaristo de Miranda: enfraquecedor de normas ambientais há décadas?

Passando a um quarto aspecto, dirige-se a atenção aos seguintes excertos do artigo sob análise: (a) “Evidências da influência da ET e do Dr. Miranda no Poder Executivo podem ser encontradas em diferentes governos”; (b) “ao longo de sua carreira, Miranda manteve laços estreitos diretamente com presidentes eleitos, muitas vezes atuando como consultor em questões agrícolas e ambientais em governos de direita e esquerda”; (c) “a desinformação apresentada por Miranda e colaboradores teve papel central no enfraquecimento do CF ao criar uma falsa polêmica sobre os potenciais limites para o crescimento da agricultura brasileira sob a legislação vigente”; (d) “neste artigo, analisamos a presença e a influência desse grupo de pesquisadores e de seu coordenador nos poderes executivo e legislativo do governo federal brasileiro”; (e) “O que é menos conhecido no caso do Brasil é que o ataque às políticas ambientais foi impulsionado por um esforço sistemático e velado de um pequeno grupo de contrários para desinformar os tomadores de decisão e a sociedade”; (f) é fácil estabelecer “a proximidade entre o Dr. Miranda e seu grupo na ET e os principais tomadores de decisão nos poderes legislativo e executivo”.

Contando com o respaldo do que já se explicitou anteriormente, fazem-se breves ponderações a esse respeito, a começar, num primeiro plano, pela observação de que o artigo confunde convocação para fornecer subsídios e dados com “influência” capaz de distorcer decisões, a qual seus autores entendem exercida para “desinformação”, muito embora não tenham fornecido elemento algum que comprove a incorreção das informações que possam ter sido levadas aos governantes.

Num segundo plano, ao longo do artigo, a par dos ataques genéricos e sem provas científicas e adequadas, não se encontra “desinformação” alguma, conceituada esta como real e efetiva informação inverídica.

Num terceiro plano, é preciso firmar que o reconhecimento da contribuição do Dr. Evaristo de Miranda e equipe para o Legislativo, para o Executivo e até mesmo para o Judiciário em todo esse tempo, longe de constituir demérito, apenas vem em seu favor, respaldados que estiveram sempre por estudos que eles vêm aprofundando e atualizando ao longo dos tempos, contra cuja autenticidade e correção os articulistas não conseguiram levantar objeção séria alguma ou número comprovado.

Num quarto plano, em análise séria, só se pode rotular de ingenuidade pensar que, sendo chamado para fornecer subsídios pela confiança adquirida, o Dr. Evaristo de Miranda exerceria influência em tal grau, que seria possível levar os governantes a tomarem medidas que contrariassem a vontade efetiva deles e que tudo haveria de acontecer no reino da Política, ao longo de tantos anos, no que toca à seara ambiental, pela simples vontade de um reputado plenipotenciário da Embrapa Territorial.

Num quinto plano, o artigo peca pela unilateralidade, uma vez que põe em foco apenas a figura do Dr. Evaristo de Miranda e de sua equipe, mas olvida uma tabulação de dados sobre a participação dos que pensam de modo diverso deles, muitos dos quais, em todo esse tempo, também foram ouvidos pacientemente, bastando lembrar as mais de 200 audiências públicas e privadas que só os integrantes da Comissão Especial do CF-2012 realizaram com estudiosos, ambientalistas, organizações não governamentais, agricultores, criadores, pesquisadores, juristas e gestores, e isso sem falar de tantas outras oportunidades e eventos em que aconteceram tais contatos nos plenários e nas comissões do Congresso, e mesmo em audiências públicas presididas pelo Min. Luiz Fux quando da instrução das ADIs movidas contra a novel codificação florestal.

Por fim, num sexto plano, contando com o que aqui já se disse, vê-se que – até por falta de elementos de prova num artigo que pretende ter respaldo em metodologia científica – é totalmente gratuita a afirmação de que teria havido, ao longo dos anos, um “ataque às políticas ambientais [...] impulsionado por um esforço sistemático e velado de um pequeno grupo”, de modo que tudo conduz à conclusão de que seus autores, num ambiente e numa época em que já se encontra sedimentada a posição do CF-2012, apenas buscam requentar debates para espalhar desconfiança a seu respeito, com base em uma típica teoria da conspiração.

12) Evaristo de Miranda: retardou ele a proibição de uso de fogo nos canaviais?

Em um quinto aspecto, o artigo busca conectar a atuação do Dr. Evaristo de Miranda à continuidade do emprego do uso de fogo na colheita da cana: (a) “Dr. Miranda e seu grupo se opuseram sistematicamente ao consenso científico a fim de contribuir com movimentos políticos visando adiar ações ou desmantelar políticas-chave de conservação”, e, “entre elas, o atraso na proibição do uso do fogo nos canaviais”; (b) exemplo disso seria que “pedido do Ministério Público para parar de queimar cana-de-açúcar foi negado por um juiz com base no estudo de Miranda, atrasando em duas décadas a proibição dessa prática no estado de São Paulo”.

Buscando ser breve, resume-se essa questão do seguinte modo: (i) mesmo não sabendo a que juiz se refere a afirmação dos articulistas, o certo é que o autor deste trabalho, Magistrado que era no segundo semestre de 1992 ou primeiro semestre de 1993, proferiu aquela que foi considerada a primeira sentença sobre queima da palha de cana-de-açúcar no País; (ii) contrariamente ao pedido do Ministério Público, ele não proibiu a queima; (iii) tal sentença foi confirmada pelo tribunal de origem, pelos tribunais superiores e fez jurisprudência, em diretriz que foi obedecida ao longo dos anos seguintes, até o advento do CF-2012; (iv) e as causas para que se continuasse permitindo a queimada àquela época são muito mais complexas e abrangentes do que pretendem os articulistas; (v) em primeiro lugar, a queima era legal, já que o art. 27, caput, do CF-1965, bem como seu parágrafo único, a permitiam, “se peculiaridades locais ou regionais” justificassem “o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais”; (vi) esse dispositivo, aliás, não apenas não foi revogado, mas até mesmo foi bastante aproveitado pelo art. 38 do CF-2012, que continua permitindo tal prática, uma vez observados determinados requisitos; (vii) em segundo lugar, os contratos coletivos dos trabalhadores que atuavam no corte manual, por imposição dos sindicatos da categoria, continham cláusula específica que obrigava os produtores a queimarem previamente os taliões oferecidos para o corte, de modo que estes não poderiam, assim, ser apresentados crus aos trabalhadores; (viii) a justificativa para essa exigência era a baixa produtividade com a colheita da cana crua, o perigo cortante da folha da cana não queimada, além da presença de cobras e animais peçonhentos, que eram afugentados pelo fogo; (ix) além disso, ainda não haviam sido desenvolvidas colhedeiras para cana crua, o que só aconteceu aproximadamente uma década mais tarde; (x) essas, em síntese, foram as reais causas para que a colheita da cana crua fosse postergada, e não qualquer influência pessoal ou de grupo, em atraso deliberado para prejudicar a proteção ambiental; (xi) acresce dizer que, ao depois, com o desenvolvimento das colhedeiras de cana crua, nem mais fazia sentido continuar no processo antigo, que, mesmo legal, passou a ser anacrônico e antieconômico, certo como é que, com a nova possibilidade, avultou o “sentido econômico representado pela perda de biomassa que, dentre outras utilidades, pode ser mantida no local da colheita, conservando a umidade e a fertilidade do solo, além de usada em caldeiras, para servir de fonte importante à geração de energia e de consequente receita”.12

13) Conclusão

A esta altura, após todos os aspectos afirmados e explicitados neste trabalho, o ideal será que o leitor busque e leia o artigo que constitui o alvo desta análise, para se pôr a par, na íntegra, do que lá se afirma. E, assim, comparando tal conteúdo com o que aqui se contrapõe, então possa tirar sua própria conclusão, sobretudo no que tange à seguinte indagação: o que se fez naquele artigo foi efetivamente ciência ambiental, ou configurou apenas um panfleto ideológico com vistas a espalhar desconfiança contra diversos segmentos, pessoas, entidades e assuntos, inclusive buscando desestabilizar o Código Florestal de 2012, atualmente consolidado para regular aplicação, sobretudo após o Supremo Tribunal Federal haver julgado as ADIs ajuizadas contra ele?

Todavia, como necessária síntese e conclusão, para o autor deste trabalho, de importância geral, mas com reflexos importantes para o que aqui se discute, saltam aos olhos alguns aspectos de sumo relevo no artigo escandido: (i) os articulistas falam de “controvérsias falsas” produzidas por “um pequeno grupo de pesquisadores brasileiros ativos” sobretudo quanto “ao desmatamento e às mudanças climáticas”, mas são eles próprios que as fabricam em seu artigo, ao levantarem uma série de acusações apenas com base em ilações e opiniões, sem efetivos dados e elementos concretos; (ii) e, assim, contestam uma série de afirmações, dados e elementos produzidos pelos acusados, mas não trazem seus próprios números fundamentados para fazer uma comparação ou  contraposição de fato, em real e científica contrariedade; (iii) acusam os contrários de “uso indevido de credenciais”, situação que tipificam como existente quando “a autoridade científica é empregada para falar sobre questões que o cientista não domina”, mas eles próprios – sem demonstrar solidez no domínio do Direito –  ao se porem a discutir questões legais e jurídicas, tentam fazer passar por princípios consolidados e premissas imunes a ataques no plano da Ciência Jurídica meras opiniões e dados sem fundamento ou real confirmação científica.

Além disso, como de interesse específico, após uma reflexão e uma exegese adequada sobretudo de alguns artigos do CF-2012, como o 12, o 15, o 68, bem como de todos os que regram os Programas de Regularização Ambiental (arts. 59/68) – e, assim, uma vez afastada qualquer pretensão de interpretar equivocadamente as normas de tal estatuto legal – parece forçosa a conclusão de que não há provas nem elementos indiciários de que, com a aprovação e vigência de tal diploma como Lei efetiva, teria havido algum real e efetivo impacto de monta na proteção ambiental, tal como pretende o artigo aqui escandido.

E, quanto a eventuais alterações a que os legisladores houveram por bem proceder na legislação ambiental, pode-se muito bem robustecer a possibilidade de sua ocorrência com a invocação dos precisos argumentos com que o Min. Luiz Fux justificou a possibilidade de alteração do art. 4º, I, do CF-2012, onde se inovou com a fixação do leito regular – e não do nível mais alto do curso d’água – como base para início da contagem das áreas de preservação permanente: (i) não há “qualquer base exegética ou empírica para sustentar que a Constituição impediu o legislador de modificar a metragem de áreas de preservação permanente”; (ii) aliás, “ao contrário, o art. 225, § 1º, III, da Carta Magna expressamente permite que a lei altere ou suprima ‘espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos’”; (iii) “na hipótese, a legislação em vigor tão somente modificou o marco para a medição da área de preservação ambiental ao longo de rios e cursos d’água, passando a ser o leito regular destes e não mais o seu nível mais alto, tudo nos lindes do espaço interpretativo assegurado ao legislador democrático”.13

Com isso, para não alongar mais esta exposição, reafirma-se o intento inicial do escopo deste artigo, que é defender ferrenhamente o Código Florestal de 2012 na condição de lei regularmente aprovada pelo Congresso e com vigência plena e aplicação assegurada, sobretudo após sua consolidação pelo julgamento das ADIs ajuizadas contra ele.

Nessa tarefa, por um lado, rejeita-se e refuta-se todo e qualquer intento de desqualificar ou desacreditar as normas nele contidas, não importando o motivo ou pretexto; por outro lado, tem-se a plena consciência e convicção de que o Poder Legislativo, ao aprová-lo, valendo-se de sua primazia no processo de ponderação sobre o que é melhor ou não para o objeto das disposições legais, exerceu seu direito soberano de escolha dos valores que reputou melhor proteger.

E, ante esse quadro, não cabe aos demais poderes, nem aos doutrinadores, aplicadores, julgadores, estudiosos ou curiosos pretender tomar-lhe o lugar para tal escolha, nem desestabilizá-lo de sua condição de direito posto, de modo que se deve rejeitar veementemente todo e qualquer intento de desqualificar ou desacreditar as normas nele contidas.

_____

1 Disponível aqui. No original, “The risk of fake controversies for Brazilian environmental policies”.

STJ – T2 – REsp 1285463/SP, j. 28.02.2012, DJe 06.03.2012, rel. Min. Humberto Martins.

3 STF, ADC 42/DF, j. 28.02.2018, DOU 13.08.2019, rel. Min. Luiz Fux, Ementa, p. 4.

4 PEREIRA, Osny Duarte. Direito Florestal Brasileiro. Rio de Janeiro: Borsoi, 1950, p. 145 e 147.

5 ANTUNES, Paulo de Bessa. Novo Código Florestal. Édis Milaré e Paulo Affonso Leme Machado (coords.). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, 2. ed., p. 231.

6 REBELO, Aldo. Código FlorestalRelatório Aldo Rebelo. Brasília, Câmara dos Deputados – Centro de Documentação e Informação, 2010, p. 10. Vale esclarecer que, ao longo de alguns anos, a Medida Provisória 2.166-67 – que trouxe várias e substanciais modificações em diversos dispositivos do CF-1965 – foi reeditada nada menos do que sessenta e sete vezes, e isso até que a Emenda Constitucional 32/2001 garantiu a continuidade de sua vigência enquanto não sobreviesse lei posterior revogadora, o que só veio a acontecer com a edição do CF-2012. Por conta de jamais haver sido votada para converter-se em lei e, mesmo assim, ter sua vigência garantida pela EC 32/2001, é que se diz que tal medida provisória virou lei sem nunca ter sido votada.

7 STF, ADC 42/DF, j. 28.02.2018, DOU 13.08.2019, rel. Min. Luiz Fux, Ementa, p. 6.

8 REBELO, Aldo. O STF, o STJ e o Novo Código Florestal. Jornal “O Estado de S. Paulo”, edição de 17.09.2016.

9 Em latim, “ne, sutor, ultra crepidam”.

10 Apenas para exemplificar, quando aprovado o CF-2012, pendia de julgamento no Supremo Tribunal Federal a ADI 3.346/2004, ajuizada pela Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), para declarar a inconstitucionalidade de diversos dispositivos da legislação então em vigor, alguns por inconstitucionalidade formal, outros por inconstitucionalidade material. Além disso, a Sociedade Rural Brasileira havia ajuizado a ADI 4.495/2010 (de cuja inicial o autor deste trabalho foi subscritor) para conseguir uma interpretação conforme da legislação então vigente, e isso para: (i) se reconhecer que a obrigação de implementar a reserva legal haveria de levar em conta a existência ou não, sobre a gleba, ao tempo de início de vigência da lei, de vegetação cuja remoção se restringia; (ii) também para se reconhecer que, na vigência do CF-1965, a base de cálculo da área de reserva legal não era um percentual sobre toda a gleba, e sim sobre o total da vegetação restringida existente ao tempo de início de vigência da lei; (iii) por fim, para se reconhecer que deveriam ser exonerados de tal obrigação os casos em que a remoção da vegetação tivesse ocorrido na conformidade com a lei de seu tempo.

11 FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Constitucionalidade do Novo Código Florestal. In Temas Polêmicos do Novo Código Florestal (Coords. FERREIRA, Olavo A. V.; GRAU NETO, Werner). Ribeirão Preto, Editora Migalhas, 1. ed., 2016, p. 216-218.

12 COSTA, José Maria da. Código Florestal Comentado. Ribeirão Preto, Editora Migalhas, 2020, p. 874.

13 STF, ADC 42/DF, j. 28.02.2018, DOU 13.08.2019, rel. Min. Luiz Fux, Fundamentação, p. 36/37.

José Maria da Costa
Advogado, Doutor e Mestre em Direito pela PUC-SP. Primeiro colocado no concurso de ingresso na Magistratura paulista. Autor dos livros "Código Florestal Comentado", "Solo Criado" e "Manual de Redação Jurídica", além de dezenas de artigos jurídicos. Integrou a equipe que assessorou o Deputado Aldo Rebelo e o Deputado Paulo Piau, relatores do Projeto do Código Florestal na Câmara dos Deputados, o primeiro no início de tramitação e o segundo quando o projeto voltou do Senado.

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