Para ter sucesso na carreira, todo bom advogado processualista deve ter duas características intelectuais importantíssimas (que não são ensinadas na faculdade) que são as capacidades de análise e de síntese somadas a uma característica intrínseca à sua profissão que é ter o conhecimento profundo de todas as informações necessárias (as leis, doutrinas e jurisprudências, casos similares, julgamentos anteriores etc.) ao desenvolvimento de seu trabalho.
O advogado ao se defrontar com o problema trazido pelo cliente deve avaliar e analisar toda a situação, suas causas, os argumentos, os pontos de infringimento às leis e as possibilidades de solução. Uma vez analisado profundamente o problema, o próximo passo precisa de sua segunda capacidade intelectual, a síntese, pois para poder defender os interesses de seu cliente deve obrigatoriamente produzir uma explanação clara dos fatos e uma argumentação consistente e coerente e tudo isso de maneira inteligível, seja na forma escrita ou oral.
Essas três características, na minha opinião diferenciam os bons advogados. Até aqui, nenhuma novidade, porém o avanço exponencial da tecnologia irá mudar drasticamente esse cenário.
A primeira alteração trazida pela tecnologia já aconteceu e refere-se ao conhecimento. A adoção de sistemas de Gestão do Conhecimento (KM) permitem ao advogado ter acesso rápido e preciso a informações relevantes e necessárias ao desenvolvimento da sua primeira característica, a análise. A extração e compilação de somente aquelas informações que são relevantes àquele assunto facilita enormemente o trabalho de análise e economiza tempo precioso (e caro para o cliente) na solução do problema. Os advogados que não fazem uso dessa tecnologia já estão atrasados! Novamente nenhuma grande novidade.
A grande mudança acontece quando computadores e sistemas começam a invadir essa área que até pouco tempo atrás era uma exclusividade da capacidade humana (a análise e a síntese). Para que isso possa acontecer precisa chegar ao mundo jurídico uma serie de evoluções tecnológicas que, apesar de já existirem, só são acessíveis a universidades e grandes empresas de tecnologia no momento.
A evolução tecnológica é um processo cíclico de auto alimentação, ou seja, cada vez que fabricantes aumentam a capacidade de processamento de seus computadores permitem a utilização se sistemas e processos mais complexos. Por outro lado, os desenvolvedores desses sistemas conseguem criar processo mais complexos sabendo da possibilidade que será possível experimentá-los em computadores mais poderosos.
Vamos analisar apenas dois desses componentes do ciclo: aumento da capacidade de processamento, sistemas de AI.
Capacidade de processamento.
Existe uma corrida frenética entre os grandes da tecnologia pela supremacia na capacidade de processamento dos chamados supercomputadores. Atualmente o detentor do primeiro lugar nessa corrida é o “FUGAKO”, supercomputador desenvolvido no Japão pela Fugitsu em associação com a RIKEN (Instituto de pesquisas cientificas em Kobe). Esse computador tem a estonteante capacidade de processamento de 442 petaflops, ou seja, 442.000.000.000.000.000 de operações por segundo. Curiosidades: FUGAKU superou em 3 vezes a capacidade do anterior (SUMMIT da IBM), mas a mesma IBM associada a IINTEL está criando o AURORA que terá a capacidade de processamento de 2 exaflops!
Como isto não está disponível para a maioria das empresas ou pessoas, existe um outro campo de desenvolvimento que é o da computação distribuída cujo conceito é muito simples, mas sua implementação bastante complexa. O processo se baseia na utilização da capacidade de processamento de milhares de computadores espalhados pelo mundo e chegando próximo a capacidade de processamento dos supercomputadores.
O melhor exemplo disso é o projeto desenvolvido pela Stanford University na California (USA) chamado “folding@home” onde, com a instalação de um simples aplicativo em qualquer computador doméstico o sistema usa a capacidade de processamento não utilizada pelo próprio usuário, ou em outras palavras usa o processador do computador quando este não está em uso. Esse processo chegou a uma velocidade de 12 petaflops e foi usado para ajudar nas pesquisas e ajudando a criar uma imagem tridimensional do vírus da Covid.
Sistemas de Inteligência Artificial - NLP
O termo AI na verdade engloba uma serie de algoritmos e outros sistemas que juntos conseguem se aproximara da capacidade de análise de um cérebro humano com relativa precisão. Neste caso ressalto um em específico que é a NLP (Natural Language processing) que sempre foi a grande barreira para os computadores entrarem no campo das profissões (especial o Direito) que usam palavra e textos e não números. Da mesma forma que a AI a NLP é formada por uma série de outros sistema e algoritmos (deep learning, speech recognition, sentimental analysis, morphological and lexical analysis, sinctatic analysis, semantic analysis, etc) que permitem ao computador entender a linguagem escrita e oral.
Interessados em conhecer o estágio atual de desenvolvimento da NLP sugiro ler artigo publicado por pesquisadores da Oxford University chamado “Robust Natural Language Processing: Recent Advances, Challenges, and Future Directions” publicado em 03/01/2022.
Estas duas tecnologias associadas permitem que se catalogue, indexe, pesquise, analise, crie estatísticas de todas as formas possíveis, compare, interprete, entenda semanticamente seu significado e várias outras atividade em milhões ou até bilhões de documentos em pouquíssimo tempo sendo infinitamente superior a capacidade de um advogado apenas.
Pois bem, definita a estratégia a ser utilizada ainda será necessária a elaboração do documento com os argumentos a serem apresentados e para isso existem outras tecnologias (algumas são as mesmas apresentadas anteriormente) que permitem a sua automação, mas este assunto será tratado em outra futura oportunidade.
Agora imaginem a seguinte situação futura.
Escritórios de advocacia ou departamentos jurídicos de grandes empresas com sistemas de gestão de conhecimento com acesso a bilhões de documentos e informações de processos em tribunais com as estatísticas de seus julgamentos e decisões; acesso a computadores de alta capacidade de processamento (provavelmente distribuído) com sistemas avançados e precisos de Natural Language Processing.
Quem vocês acham que será mais eficiente, rápido e preciso? Os computadores ou os seres humanos? Quando será isso? Não sei, mas posso afirmar que não vai demorar muito. A adoção e utilização intensa e precoce de todas as tecnologias acessíveis será fator preponderante para não ser engolido por elas no futuro.