As mutações constitucionais podem ser descritas como uma forma interpretativa da Constituição vigente, sem alterar sua forma escrita, tentando amoldar a normativa à realidade social, cultural e política de determinado povo. Nesse diapasão, a doutrina Alemã descreveu como marco paradigmático revisional a mutação exercida pelo Reich, no final do século XIX, cuja necessidade de alterar o funcionamento de instituições o fez reformar a Constituição Alemã, sem alterar o texto de lei. Ademais, e não menos importante, nos Estados Unidos, na contemporaneidade, descreve-se a mutação cultural e interpretativa de sua Constituição, mesmo sendo e inalterada por mais e 200 anos. No Brasil, ocorrem grandes discussões a respeito da dicotomia entre os benefícios inerentes a modulação normativa presente e ao certo grau de arbitrariedade e insegurança jurídica diante do controle difuso.
Segundo o Ministro do STF Gilmar Mendes, "a mutação constitucional é uma nova interpretação da Carta Cidadã, diante de uma alteração da situação normativa, ou seja, a norma teria deixado de se ajustar às novas relações pelo ator temporal". Diante do exposto pode-se descrever o emblemático caso da interpretação extensiva constitucional do Artigo 226 que descreve "para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher, como entidade familiar...". Nesse ângulo, diante do ADPF 1321 e ADIn 4277, o STF optou por estender o conceito de família ao reconhecer juridicamente a união homoafetiva como entidade familiar – fato que repercutiu em muitos campos do Direito Civil, Administrativo, Notarial e Empresarial, entre outros. Destarte, por mais que tenha havido modificação interpretativa, não é pacífica na doutrina que houve mutação constitucional. Ademais, há divergências sobre a atuação normativa do guardião da Constituição, argumentando certo grau discricionário e parcial de alguns julgados, colocando em xeque a competência para legislar do judiciário.
Outrossim, deve-se contextualizar a diferença entre a reforma por emendas constitucionais e por mutações, pois as primeiras são elaboradas pelo Poder Legislativo e tem cunho intencional e relativamente mais célere, enquanto que as segundas são graduais e buscam na hermenêutica temporal e a racionalização do futuro. Nesse contexto, muitos doutrinadores descrevem que esses mecanismos são ao mesmo tempo complementares e excludentes, pois quando se opta por não fazer a reforma constitucional, poderá ocorrer uma mutação involuntária indo na contramão dos ideais estritamente positivas. Todavia, a grande certeza é que tanto a mutação quanto a reforma por emendas possuem limites fixados no ideal democrático preestabelecido e na soberania popular. De acordo com o jurista Miguel Reale," a estrutura constitucional deve ser estável sem ser estática, e dinâmica sem ser frenética".
Desse modo, a finalidade de uma constituição de um determinado Estado é manter viva o pacto federativo e seu ideal democrático proposto pela sociedade, pois há estreita relação entre o Direito erga omnes e o progresso cultural. Por conseguinte, se a mutação constitucional conseguir inovar, sem dilacerar o vínculo formal da Carta Magna adaptando aos valores atuais, há demonstração lícita da cooperação entre os Poderes Legislativos e Judiciários para a eficiência da Máquina Estatal. Para finalizar, preleciona o doutrinador Jorge Miranda que " a modificação das Constituições é um fenômeno inelutável da vida jurídica, imposta pela tensão com a realidade constitucional e pela necessidade de efetividade que as tem de marcar. Mais do que modificáveis, as constituições são modificadas. Ou, doutro prisma (na senda de certa doutrina): nenhuma Constituição se esgota num momento único – o da sua criação; enquanto dura, qualquer Constituição resolve-se num processo – o da sua aplicação – no qual intervêm todas as participantes na vida constitucional."