Em recente evento (1º Encontro Nacional de Laboratórios de Inovação do Poder Judiciário), o ministro HUMBERTO MARTINS – Presidente do STJ – defendeu a utilização da inteligência artificial como instrumento para inadmitir recursos manifestamente incabíveis naquela Corte, a fim de evitar o que chamou de excesso de judicialização.
Com efeito, desde 2019 o STJ possui sistemas e soluções tecnológicas para o processamento dos feitos distribuídos, destacando-se os programas Athos, e-Juris e Sócrates. Este último analisa a petição de recurso interposto, o submetendo a uma "nuvem de palavras": as trinta palavras mais utilizadas mapeiam o conteúdo do recurso, antes mesmo da leitura de seu inteiro teor. Com tais dados, formula-se um "espelho" do conteúdo recursal e se orienta, eletronicamente, a solução a ser dada pelo prolator da decisão. Assim, a depender dos termos empregados na petição, pode-se desde logo indicar sua inadmissibilidade, mesmo sem a leitura pelo Magistrado competente.
É de todo elogiável a interação da tecnologia e do direito e a busca pela modernização dos procedimentos judiciais. O sucesso das audiências por videoconferência – sobretudo nos tempos de pandemia – e o êxito dos processos eletrônicos são a prova disso. De fato, não pode o mundo jurídico passar ao largo da realidade cada vez mais virtual da nossa sociedade. O sistema de Justiça depende da interlocução com a tecnologia para ser cada vez mais efetivo.
Contudo, é preocupante a substituição do ser humano por máquinas. Por melhor programadas que sejam, não podem substituir plenamente a capacidade psíquica inerente ao ser humano ou sua sensibilidade. A observação decorre de um dado concreto: em recente negativa de admissibilidade de recurso interposto, os motivos da decisão eram completamente alheios aos pedidos formulados. Em verdadeiro caso de esquizofrenia forense, a decisão – produzida pela dita inteligência artificial – era completamente dissonante da realidade do caso. Parecia ter-se decidido sobre situação distinta daquela levada à Corte.
Assim, todo cuidado é pouco para a aplicação da revolução tecnológica no julgamento dos casos. Deve-se lembrar que, conforme advertia Calamandrei, o Juiz é "o direito tornado homem", não máquina.