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Aprimoramento do processo de recuperação judicial e falências

A recomendação de que apenas o juízo da recuperação judicial deve ser comunicado acerca da existência da demanda, sendo desnecessária a comunicação e intimação do administrador judicial também traz maior efetividade ao curso processual, além de evitar que se confunda a administração judicial com a representação da empresa recuperanda.

8/11/2021

A atualização do processamento de Recuperações judiciais e falências tem sido ponto de atenção do CNJ. Tanto que, para atender a essa necessidade, em 2018 foi instituído o GT – Grupo de Trabalho, atualmente em vigor através da portaria 199/20, que tem por objetivo “debater e sugerir medidas voltadas à modernização e efetividade da atuação do Poder Judiciário nos processos de recuperação judicial e falência”1.

E, neste esteio, os desafios impostos pelas medidas de distanciamento social decorrentes da pandemia covid-19 vieram a acelerar este processo, visto que houve a premência da criação de alternativas para que as ações de recuperação judicial e falências sofressem menos impacto em seu curso processual já bastante complexo, dada a pluralidade de sujeitos, especificidade legal e importância da matéria tanto econômica quanto social.

Com isso, através da promulgação da lei 14.112/20, as assembleias gerais de Credores, tradicionalmente presenciais, passaram a se desenvolver, também de forma virtual, com a votação realizada através de sistema eletrônico2.

A partir de então, o Poder Judiciário, administradores judiciais e partes passaram a se adequar à esta realidade, contudo, não havia diretrizes para sua realização.

Para trazer maior agilidade, segurança e transparência ao processo, na 93ª sessão virtual do CNJ, realizada entre 16 e 24 de setembro de 2021, o ato normativo 0005243-17.2021.2.00.0000 foi posto em votação e a recomendação elaborada pelo GT aprovada pelo Plenário.

Destaca-se o que dispõe o artigo 7º da recomendação 110, de 5/10/21, aprovada:

“Art. 7º Recomendar a todos os magistrados e magistradas das varas, especializadas ou não, onde tramitam processos de recuperação judicial que, ao decidirem sobre a modalidade de realização da Assembleia Geral de Credores na forma presencial, híbrida ou virtual, levem em consideração o endereço da localidade da maioria dos credores, bem como situações excepcionais, de calamidade pública e impositivas de afastamento social.Parágrafo único. Recomenda-se, caso existam credores situados fora da comarca da devedora, que a Assembleia Geral de Credores seja realizada de forma híbrida ou virtual.

Com efeito, as vantagens de realização de assembleia geral de credores de maneira virtual ou hibrida já são notáveis, visto que facilita a participação de um número maior de credores pela facilidade de acesso remoto, inclusive através do uso de celulares3, o que leva não só à diminuição dos custos decorrentes da organização, realização e participação na assembleia, como a possibilidade de se alcançar quórum suficiente para aprovação do plano posto em votação com maior celeridade.

A organização da votação também se faz mais eficiente e segura, e neste sentido, destacam-se os seguintes requisitos, previstos no artigo 3º da recomendação:

“VI – impedimento de coleta de voto em duplicidade;

VII – disponibilidade de recurso para que procurador que represente mais de um credor possa fazer o registro de voto de cada representado de forma separada, respeitando a vontade individual de cada credor;

VIII – havendo a funcionalidade de registro e cômputo automatizado de votos, a plataforma seja hospedada em ambiente de nuvem com redundância e observe os protocolos HTTPS de segurança (Hyper Text Transfer Protocol Secure);

IX – permita o acompanhamento simultâneo dos ouvintes; e

X – permita que os credores enviem suas declarações de votos, entre a abertura da votação e o encerramento da Assembleia Geral de Credores”

Além destes, destaca-se também o artigo 6º da recomendação:

“Art. 6º A Assembleia Geral de Credores, realizada na modalidade virtual ou na modalidade híbrida, deverá obrigatoriamente ser gravada e ter seu conteúdo disponibilizado na rede mundial de computadores, salvo se houver determinação judicial em sentido contrário.”

Com a garantia de coleta de voto individual e impedimento de duplicidade, da segurança do cômputo dos votos de forma automatizada, permissão do envio da declaração de votos durante a toda a duração da assembleia, acompanhamento simultâneo por ouvintes e a gravação e disponibilização do ato e seu conteúdo, atinge-se um patamar de segurança e transparência que beneficiará a todos.

Na mesma sessão virtual, outra medida visando o aperfeiçoamento do processo de recuperação judicial e falências foi trazida pelo GT através do ato normativo 0005263-08.2021.2.00.0000, igualmente aprovada, a saber, recomendação 109 de 5/10/21.

Nesta recomendação, o objetivo é garantir uma interação mais eficiente e objetiva entre o juízo recuperacional e os demais juízos que se relacionam.

Identificado pelo grupo os documentos comumente expedidos ao juízo da recuperação judicial e falências, recomendou-se a padronização de: I) Comunicação de ajuizamento de demanda contra devedor em recuperação judicial; II) Pedido de reserva de Crédito; e III) Certidão de Crédito.

São informados quais os dados mínimos que devem ser informados em cada uma delas como, por exemplo, numeração processual, data de ajuizamento e local que tramita, dados completos das partes (credor e devedor) e valor da causa ou do crédito.

Além das informações necessárias para cada uma delas, sobressaem as seguintes recomendações acerca da comunicação de distribuição de demanda, inseridas no artigo 2º da recomendação:

§1º O ofício não precisa ser acompanhado da petição inicial ou de qualquer documento e a demanda seguirá seu curso no juízo de origem.

§2º O ofício deve ser destinado ao juízo da recuperação e não ao administrador judicial, que não precisará ser intimado da existência da demanda, nem ser incluído nas publicações dos atos processuais.

A informação de que não é necessário o encaminhamento de petição inicial ou qualquer outro documento da ação que se comunica a distribuição ao juízo recuperacional, é de grande valia, já que, em sua maioria, as ações de Recuperação judicial e Falência já contam com um número vultoso de documentos.

Portanto, a recomendação colabora com a manutenção da ordem processual e evita retrabalho, seja pela análise de documentação que não guarda relação com o processo em si, ou ainda pela eventual ordem de desentranhamento.

Por fim, a recomendação de que apenas o juízo da recuperação judicial deve ser comunicado acerca da existência da demanda, sendo desnecessária a comunicação e intimação do administrador judicial também traz maior efetividade ao curso processual, além de evitar que se confunda a administração judicial com a representação da empresa recuperanda.

A partir da observância destas melhorias é possível afirmar que a tendência é que o processo de recuperação judicial e falência se torne mais eficiente, a marcha processual se desenvolva com menos entraves, propiciando às partes decisões mais eficazes e céleres, o que, sem dúvidas, trará aos credores maior possibilidade na recuperação de seu crédito e aos devedores a possibilidade de restabelecimento de sua ordem financeira.

O teor completo das recomendações citadas pode ser acessado aqui.

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1 Art. 1º da portaria 199 de 30/09/2020, do CNJ.

2 Alteração do artigo 36 e inclusão do §4º ao artigo 39 da lei 11.101/05.

3 Art. 3º, incisoIII da recomendação CNJ n.º 110, de 05/10/2021

Ana Ferreira
Bacharel em Direito pela Universidade Guarulhos, especialização em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp e cursando nova especialização em Ciências Humanas pela Pontíficia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo, com experiência de 16 anos em Direito e Processo Civil, atuante em contencioso civil e estratégico em carteiras de empresas de transporte aéreo internacional, seguros, resseguros e instituições financeiras.

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