Muitos historiadores acreditam que o Tribunal do Júri iniciou-se no Egito, com a criação do livro Pentateuco (5 primeiros livros da Bíblia Sagrada) – fato que demonstra o grau de temporalidade dos julgamentos da humanidade. Outros, relatam sobre os julgamentos de homicídios premeditados, ocorridos na Grécia Antiga, por órgãos chamados Aerópagos (antigos tribunais atenienses). Entretanto, pode-se citar a abolição das Ordálias na Inglaterra como ponto crucial para a instalação do Conselho de Jurados, em oposição aos juízos de Deus. Nessa perspectiva, após muitos anos, diante da historicidade exposta, o Brasil seguiu a orientação da Magna Carta da Inglaterra, de 1215, para criar um paradigma de Tribunal do Júri brasileiro. Nesse prisma, o então príncipe regente Dom Pedro permitiu a criação dos juízes de fato, cuja finalidade era julgar crimes de imprensa – com 24 cidadãos honrados e de bons costumes. Posteriormente, em 1824, este modelo de Conselho de Sentença passou a integrar o Poder judiciário, ampliando o espectro de julgamento para as causas civis e criminais.
Diante de todo o histórico exposto, pode-se afirmar que o Tribunal do Júri insere-se num contexto de suma importância nos julgamentos dos crimes dolosos contra a vida na contemporaneidade e deve ser analisado intertemporalmente, com objetivo de se demonstrar os aspectos contrapostos por juristas e os benefícios jurídicos para a coletividade. A priori, deve-se contextualizar que tanto o Poder Legislativo, quanto o Poder Executivo Brasileiro abrangem representantes escolhidos pelo povo, com intuito de promover políticas públicas. Explicando melhor, estes poderes tem representatividade popular de acordo com o pleito e eleição temporária. No entanto, o Poder Judiciário permite a inclusão de membros por meritocracia, por meio de concurso público de provas de títulos, instituído constitucionalmente sem participação imediata da população. Nessa linha de pensamento, pode-se permitir um questionamento a respeito especificamente em relação ao Tribunal do Júri, cujos jurados do Conselho de Sentença são representantes natos da população com diversidade de opiniões, raças, crenças, religiões e status sociais. Ou seja, os crimes dolosos contra a vida são julgados por pessoas escolhidas entre os cidadãos e não os juízes togados tradicionalmente julgadores de outros Tribunais – fato que expõe uma controvérsia a respeito da capacidade destes indivíduos para julgar, sem a necessidade de motivação diante da exposição de provas factuais em crimes graves contra a vida. Portanto, há muitas críticas a respeito da plenitude de defesa, sigilo das votações, soberania do vereditos e sobre os bens jurídicos tutelados nesse Conselho, permitindo ao leitor um questionamento sobre a absoluta veracidade dos julgados e suas consequências para o réu e a sociedade.
Ademais, pode-se complementar que vem sendo utilizada a teoria in dubio pro societate para pronunciar réus no Tribunal do Júri, quando há certo grau de dúvida com projeção de ser responsabilizado pela sociedade. Ou seja, está ocorrendo um esvaziamento da decisão da pronúncia, arrefecendo limites para o livre convencimento, sobrecarregando o Tribunal com adágios forenses. Outrossim, a Constituição Federal de 1988 não possui descrição a respeito deste princípio in dubio pro societate, mas propõe corolários como ampla defesa e contraditório, proporcionalidade e celeridade de julgamentos entre outros. Por conseguinte, deve-se repensar sobre os níveis criticidade do stand probatório preestabelecidos, priorizando indícios suficientes de autoria e materialidade do fato ilícito, para que o Tribunal do Júri represente o Estado Democrático de Direito outrora idealizado pelo Legislativo.
Para finalizar, há a questão da proteção do bem jurídico tutelado maior que é a vida humana no Tribunal do Júri. Muitos juristas questionam a respeito da taxatividade do rol de crimes do Código Penal Brasileiro – fato que pode por em xeque a ampliação de condenações em caso de genocídios e outros crimes correlacionados, pactuando com interpretação extensiva e o princípio da eficiência e eventualidade.Nesse viés interpretativo, segundo a defensora pública do Distrito Federal Mayara Tachy, poderia haver, em casos específicos , uma ampliação da abrangência dos crimes no Tribunal do Júri, com finalidade de julgar efetivamente os crimes dolosos contra a vida. Destarte, o Tribunal do Júri exerce a função extraordinária de proteger o bem jurídico de maior valor que é avida do ser humano e não deve julgar crimes patrimoniais, civis, eleitorais e administrativos. Deve-se acrescentar nessa discussão recentes jurisprudências a respeito da competência do Tribunal do Júri para julgamento de crimes dolosos contra a vida, cujo réu possua foro por prerrogativa de função, estipulado constitucionalmente, sendo que nesse caso a supremacia da Constituição prevalece em detrimento do Júri .
Diante do exposto, conclui-se que o Tribunal do Júri é uma instituição sui generis de suma importância interpretativa e teleológica para o mundo jurídico e para os cidadão protegidos pelo Estado Maior. A partir da contextualização sobre sua origem, nota-se que desde os primórdios os indivíduos necessitavam de julgar crimes de maior ofensividade e de maior potencial lesivo. Resta saber se a processualística implementada na contemporaneidade permite atingir a verdade real necessária à absolvição ou à condenação do réu, com amparo na Constituição Federal de 1988 e na Declaração Universal de Direitos humanos.