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Solução de Consulta Cosit 158 e a razoabilidade do controle aduaneiro

Espera-se que a razoabilidade da cosit seja refletida nas futuras fiscalizações e julgamentos sobre as importações, de modo que o receio dos importadores possa, finalmente, dar lugar à segurança jurídica.

20/10/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

O tema das importações indiretas e seus impactos tributários e aduaneiros está cada vez mais presente na rotina das empresas e das autoridades fiscais. Notícias de autos de infração milionários têm levado receio a quem precisa realizar a importação de mercadorias para seus negócios e que, muitas vezes, valem-se de terceiros para isso.

Contudo, o receio deu lugar a um certo alívio nos últimos dias quando da publicação da solução de consulta 158/21 por parte da Coordenação Geral de Tributação da Receita Federal (Cosit). Foi analisado o caso em que determinada empresa contrata uma trading para realizar a importação das mercadorias na modalidade de importação por encomenda. O importador adquire e importa as mercadorias, revendendo-as ao encomendante que, que por sua vez, as revende a um cliente pré-determinado. Trata-se da figura do "encomendante do encomendante", isto é, aquele que realiza um pedido de compra prévio a uma empresa local, que realizará a aquisição das mercadorias importadas por um terceiro na modalidade de importação por encomenda.

Diante de autos de infração que questionaram operações similares sob o argumento de que o encomendante seria uma interposta pessoa na operação de importação e que o real adquirente seria o cliente local, foi apresentada essa consulta para obter a confirmação da Cosit de que a figura do "encomendante do encomendante" não prejudicaria a adoção da importação por encomenda.

Felizmente, a Cosit confirmou o entendimento de que a importação por encomenda resulta da relação de duas pessoas jurídicas, sendo que uma delas, o encomendante, contrata um terceiro, o importador), para promover a aquisição e a importação de mercadorias em nome próprio e com recursos próprios que serão posteriormente revendidas ao encomendante. Consequentemente, a figura do "encomendante do encomendante" em nada prejudica ou interfere na operação de importação por encomenda, posto que esse terceiro está fora do controle aduaneiro, seja em relação aos tributos devidos na importação ou em relação ao IPI devido nas operações locais pelo importador e estabelecimento equiparado. Além disso, o fato de haver alguma vinculação societária entre o encomendante e o seu cliente local não representa elemento para desqualificar a importação por encomenda e caracterizar a infração por interposição fraudulenta.

Porém, é importante lembrar que boa parte dos autos de infração relacionados à interposição fraudulenta decorre da desqualificação da importação direta para uma das modalidades de importação indireta (por encomenda ou por conta e ordem). Tais autos de infração são igualmente relevantes e frequentes e, por vezes, decorrem de um entendimento desvirtuado da legislação aduaneira. De fato, não são raras as vezes em que a importação direta é desqualificada pelo simples fato de o importador ter revendido mercadorias importadas a um terceiro, que passa a ser acusado de ter interposto fraudulentamente o importador na operação, a fim de ocultar-se do controle aduaneiro.

Ora, a mesma elogiável razoabilidade adotada pela cosit na solução de consulta 158 deve também ser aplicada nas operações de importação direta. Como é sabido, a infração conhecida como interposição fraudulenta foi criada com o objetivo de penalizar aqueles que se furtavam ao controle aduaneiro a fim de cometer fraudes e crimes por meio das operações de comércio exterior. Não por outro motivo, combate-se interposição fraudulenta ocorrida "mediante fraude ou simulação", de modo que apenas nesses casos pode ser alegada a ocorrência do ilícito e imposta as penalidades correspondentes (salvo os casos de interposição fraudulenta presumida, quando não são comprovadas a origem, disponibilidade e transferência dos recursos).

Assim, nos casos em que as autoridades fiscais não comprovem a fraude ou simulação, não há que se falar em desconsideração da importação direta e, menos ainda, em interposição fraudulenta de terceiros. Inclusive, a o texto reafirma que, nesses casos, é do Fisco o ônus de comprovar a ocultação mediante fraude ou simulação.

Outro ponto importante trazido pela cosit e que é relevante para os casos de importação direta é a questão do tempo de permanência das mercadorias em estoque. Foi esclarecido que "o curto tempo de permanência de mercadoria em estoque não tem o condão de, isoladamente, desqualificar modalidade de importação indireta". Considerando que tal entendimento decorre da ausência de previsão legal que estabeleça um prazo mínimo de permanência das mercadorias em estoque, tem-se que o mesmo raciocínio deve ser adotado em relação à importação direta.

Isto é, o mero fato de o importador ter importado mercadorias que posteriormente foram revendidas não pode ser considerado, isoladamente, elemento apto a descaracterizar a importação direta e requalificá-la para importação por encomenda. Aliás, em um cenário comercial competitivo em que agilidade e custo são grandes fatores de mercado, mesmo nos casos em que as mercadorias são direcionadas pelo importador diretamente do porto/aeroporto aos seus clientes, não há que se falar em importação indireta.

Assim, a importância da solução de consulta 158 não decorre somente da confirmação de que as operações realizadas pelo encomendante após a aquisição das mercadorias não devem impactar a importação por encomenda, mas também da adoção de conceitos que devem igualmente aplicar-se aos casos envolvendo a desqualificação de importação direta.

Espera-se que a razoabilidade da cosit seja refletida nas futuras fiscalizações e julgamentos sobre as importações, de modo que o receio dos importadores possa, finalmente, dar lugar à segurança jurídica.

Rafael Gregorin
Sócio da área tributária do Trench Rossi Watanabe

Marcelle Silbiger
Associada da área tributária do Trench Rossi Watanabe

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