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CPI da Covid, denúncia por crime de responsabilidade e impeachment

A CPI da Covid, havendo conclusão de crime de responsabilidade praticado por mandatários da República, ao aprovar e tornar público seu relatório, permitirá a qualquer cidadão – podem ser 600 mil, quem sabe? – o encaminhamento da respectiva denúncia.

1/10/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Previstas há quase um século no Brasil, as Comissões Parlamentares de Inquérito têm desenvolvido papel de protagonismo na arena cívica e política nacional.

Os principais temas do País foram e vêm sendo objeto de inquérito parlamentar no âmbito do congresso (assim como as questões locais mais relevantes, nas demais casas legislativas federadas). Mas, certamente, nenhum tão legítimo e importante quanto este tratado pela CPI da Pandemia (“nunca, em tempo algum, tivemos maior motivação para uma CPI”).

Embora os resultados de algumas CPIs anteriores possam ter gerado frustração na expectativa midiática e popular (pizza!), não é justo deixar de reconhecer que foram inúmeras suas contribuições, não somente para apuração de responsabilidades, mas também para aperfeiçoamento legislativo nas mais diversas áreas.

Havendo conclusão de prática de ilícitos civis ou criminais no Relatório Final de uma CPI, o expediente (relatório e documentos), em regra, deve ser encaminhado ao Ministério Público para, no âmbito de suas atribuições, promover as respectivas responsabilizações (CF, art. 58, §4º).

Mas o que fazer quando houver conclusão de crime de responsabilidade imputado a autoridades cuja persecução jurisdicional refuja às atribuições do Ministério Público?

Segundo matérias jornalísticas e declarações de integrantes da CPI da Covid, estão sendo delineadas conclusões que imputam prática de crime de responsabilidade ao Presidente de República. Havendo denúncia sobre fatos dessa natureza, o processo e julgamento compete exclusivamente ao Senado da República, desde que haja autorização (expressa ou tácita) da Câmara dos Deputados.

Neste caso, por falta de atribuições específicas, não há sentido em encaminhar-se o tema ao Ministério Público. A legitimidade ativa para a denúncia é de “qualquer cidadão” (artigo 14, da lei 1079/50, a lei do impeachment).

Trata-se, essa legitimação ativa, de componente do chamado “atributo cívico” conferido aos eleitores ativos.

Embora devesse ser o mais ampla possível a legitimação para defesa dos valores da Nação, a prerrogativa tem sido mantida restrita ao cidadão, pessoa física apta eleitoralmente, segundo o aval exegético do STF. Pessoas jurídicas, instituições, associações, comissões etc, a princípio, não detêm essa legitimidade.

Outra vez: no caso da CPI da Covid, havendo conclusão de crime de responsabilidade, inclusive presidencial, qual, então, a providência?

A Comissão, quanto ao aspecto, ao aprovar e tornar oficial e público seu relatório (parcial ou final), já possibilitará a qualquer cidadão a tomada de providência por crime de responsabilidade. Ela pode, inclusive, rolar a bola: trazer e aprovar em seu bojo a peça de denúncia-crime já formalmente elaborada, reservando aos legitimados, apenas, seu respectivo ajuizamento (poderá ser assinada por um só, mil ou 600 mil cidadãos).

Mas nada impede que a Comissão delibere em indicar um ou alguns cidadãos para tal fim. E não há óbice a que o indicado seja o próprio Presidente da Comissão, que voluntariamente poderia oferecer a denúncia (mas, se o fizer, tão somente na qualidade mesma de cidadão).

A denúncia por crime de responsabilidade deve ser encaminhada para a Câmara dos Deputados, para fins de sua análise e eventual filtragem técnico-política (CF, art. 51, I). Porém, como se trata de providência pré-processual, sua dicção é superável em hipótese eventual de inação.

Sob essa ótica, será tácita a autorização cameral após decorrido o prazo de 30 (trinta) dias para sua avaliação (que é prazo ordinário para tramitação da fase pré-jurisdicional, segundo o artigo 10 do Código de Processo Penal, diploma subsidiário à lei do Impeachment).

Havendo autorização, a denúncia e respectivos documentos instrutórios devem ser encaminhados ao Senado da República para que ali se dê início à sua exclusiva missão jurisdicional.

Em não havendo deliberação tempestiva na Casa popular, o cidadão-denunciante – é o que aqui se defende – poderá encaminhar o expediente diretamente ao Presidente da Casa Alta. Vale uma observação: no processo e julgamento pelo Senado, os membros da comissão investigadora, segundo os cânones jurisdicionais, devem ser considerados impedidos, todos eles, independentemente de seu posicionamento em relação ao relatório final e à denúncia eventualmente produzida.

O jogo parece aproximar-se do apito final. Falta definir quem ou quantos irão assoprá-lo ... 

Paulo Calmon Nogueira da Gama
Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio, Desembargador do TJMG.

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