Em uma nova reforma trabalhista realizada por meio de Medida Provisória, fingindo ser um remédio para o desemprego do trabalhador e para as empresas, a Câmara dos Deputados aprovou, na última terça-feira (10), o texto base da MP 1045/21, mudando uma série de regras para os trabalhadores.
O deputado Christino Áureo, relator da Medida Provisória, com base na permissão da redução de jornadas e salários durante a crise da pandemia, apresentou um novo relatório com uma série de modificações, além das que já havia incluído anteriormente.
São mudanças, pasmem, que fingem ter o objetivo de ajuda à crise da Covid-19, transformam em direitos permanentes com vigência além desse período crítico e que absurdamente foram aprovadas. Modificações que retiram direitos constitucionais dos trabalhadores em uma série de inconstitucionalidades que evidenciam o fim da legislação trabalhista.
Certamente que como ainda serão decididos alguns destaques, não está o texto votado em definitivo, mas vejam algumas mudanças já aprovadas:
1) A lei cria uma modalidade de trabalho sem direito a férias, 13º salário e FGTS;
2) Cria também uma outra modalidade de trabalho, sem carteira assinada (Requip) e sem direitos trabalhistas e previdenciários, recebendo o trabalhador uma bolsa e um vale-transporte;
3) Estabelece um programa de incentivo ao primeiro emprego (Priore) para jovens e de estímulo à contratação de maiores de 55 anos desempregados há mais de 12 meses. Nesses casos, o empregado recebe um bônus no salário, mas seu FGTS é menor;
4) Aumenta o limite da jornada de trabalho dos que trabalham como mineiros;
5) Reduz o pagamento de horas extras para algumas categorias profissionais, como bancários, jornalistas e operadores de telemarketing;
6) Restringe o acesso à Justiça gratuita em geral;
7) Proíbe juízes de anular pontos de acordos extrajudiciais firmados entre empresas e empregados;
8) Dificulta a fiscalização trabalhista, inclusive para casos de trabalho análogo ao escravo.
Algumas dessas medidas incluídas pelo relator foram tentadas pelo governo em 2020 na medida provisória do “Contrato Verde e Amarelo”, mas não foram aprovadas a tempo pelo Congresso Nacional.
Vejam: na contratação sem carteira (sem férias, 13º salário e FGTS), cria-se, com o nome de Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário, um trabalho para jovens com idade entre 18 e 29 anos e pessoas com mais de 50 anos.
É um programa em que haverá uma jornada máxima de 48 horas por mês, podendo ser de até seis horas por dia e de no máximo três vezes por semana, mediante trabalho temporário, com remuneração que não pode ser inferior ao salário-mínimo por hora.
De forma semelhante, a lei cria o Priore (Programa Primeira Oportunidade de Reinserção no Emprego), para jovens entre 18 e 29 anos em busca do primeiro emprego e maiores de 55 anos sem emprego formal há mais de 12 meses., com limite salarial de até R$2.200,00.
É inacreditável que a Câmara dos Deputados desconheça o artigo 5º da Constituição da República, segundo o qual, em seu item I, está expresso que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.”
Não vou nem tratar da desigualdade, da discriminação e dos demais absurdos constantes dessas alterações, como contratos com prazos de até dois anos. Ao sugerirem essas novas medidas, ao invés de se dar “vacina” ao trabalhador, querem dar “cloroquina”.
A contribuição do FGTS seria menor para esses empregados e conforme o tamanho da empresa, o Ministério da Economia, e não o do Trabalho, deverá detalhar os treinamentos para essa qualificação profissional. Então por que criaram novamente o Ministério do trabalho?
Esse tipo de trabalho do novo contrato não cria vínculo de emprego, e, portanto, não haverá carteira assinada.
Soma-se a esses remédios caseiros o aumento da jornada máxima de trabalhadores de minas e subsolo, atualmente de seis horas diárias para doze horas diárias, podendo ser negociado o prazo de descanso.
Restringe-se o acesso à Justiça gratuita e se retira a garantia constitucional do Juiz de avaliar as cláusulas de acordos extrajudiciais.
Finalmente, em casos de trabalho análogo ao escravo e fiscalizações trabalhistas, só haverá multa se houver infração da lei depois de duas visitas de orientação dos auditores do trabalho.
Escrevo essas notas entristecido porque acompanhei a evolução do direito do trabalho e da Justiça do Trabalho por mais de cinquenta e cinco anos e vejo que, enquanto o mundo se globaliza, a eletrônica avança e a nanotecnologia ajuda a humanidade, o legislador brasileiro retrocede nos direitos dos que trabalham para alcançar essas melhorias, transformando os empregados naqueles servidores fiéis e livres, mas ainda do tempo da princesa Isabel.