O mercado de capitais1, como mecanismo de financiamento por meio da captação de recursos populares e institucionais, exige um ambiente de regulamentação próprio, reconhecendo direitos e imputando deveres aos agentes financeiros que nele interagem.
O tema da regulamentação, não raras vezes, provoca mal-estar, tendo em vista que se confunde, nem sempre de forma equivocada, com a existência ou exigência de procedimentos burocráticos2. Sintoma que muitas vezes é causado por um ambiente institucional ineficiente e moroso, que se confunde com a própria regulamentação e a ela atribui, de forma equivocada, a pecha de verdadeira causadora dos problemas3.
Diversos estudos já foram elaborados relativamente ao objeto e ao objetivo da regulamentação no ambiente do mercado de capitais. Dentre eles, a Organização Internacional de Valores Mobiliários (International Organization of Securities Comissions ou “IOSCO”) realiza publicação periódica de trabalho para tratar dos princípios e objetivos da regulamentação neste ambiente4.
Conforme consta no trabalho desenvolvido pela organização, a regulamentação possuiria três objetivos principais: (i.) a proteção dos investidores; (ii.) a garantia de um mercado equitativo, eficiente e transparente; (iii.) a redução de risco sistêmico5. O alcance destes objetivos, por outro lado, exigiria atenção a uma lista de deveres exigidos dos agentes que atuam no mercado de capitais, dentre eles, e ganhando papel de relevância, o dever de informar.
O dever de informação é considerado o dever de maior importância no ambiente do mercado de capitais, já que a informação é fonte norteadora do agir dos investidores e dos demais agentes financeiros. Busca assegurar que a captação da poupança popular e também a captação de recursos institucionais seja realizada de forma “justa”, por meio do acesso à informação, fomentando um ambiente de confiança que é fundamental para o desenvolvimento econômico-social6.
Sustenta-se, inclusive, que a outra face do dever, ou seja, o direito à informação7, possui um caráter instrumental8, já que, por meio do acesso à informação, o detentor desta poderá agir de forma informada, assegurando outros direitos. É por meio deste instrumento, a informação, que o investidor decidirá por agir ou deixar de agir, comprar ou vender quotas sociais (ações9), neste ou naquele momentox.
Recebeu maior relevância com a publicação dos Securities Act de 1933 e Securities Exchange Act de 193411 12 13, posteriormente reconhecido no ordenamento jurídico, com igual importância, por meio da Lei Brasileira das Sociedades Anônimas (lei 6.404/76)14 e da Lei do Mercado de Capitais (lei 6.385/76)15. Relativamente aos administradores das companhias, há inclusive tipificação de crime no que diz respeito à prestação de informações falsas, tipos dispostos no art. 177 do Código Penal16 e no inciso VII do art. 3º da lei 1.521/5117.
O sistema de divulgação de informações (disclosure18 19) passou a receber cada vez maior atenção, passando a criar debates relativos à forma, profundidade, momento e destinatários das informações a serem divulgadas pelos agentes do mercado de capitais. Questionamentos foram sendo realizados quanto à eficácia da simples divulgação e quanto à necessidade de ser adaptada ao público destinatário, à forma de publicização das informações, dentre outras questões que tornassem efetivo o dever de informar.
Esta evolução do sistema de divulgação gerou o “novo” princípio da informação no mercado de capitais, denominado de Full and Fair Disclosure. Não basta, portanto, a simples informação, devendo ser completa e “justa” (verdadeira, precisa, tempestiva, etc.).
O Princípio do Full and Fair Disclosure se caracteriza pela adoção de mecanismos de proteção do investidor relativamente ao acesso às informações necessárias para a tomada de suas decisões no mercado de valores mobiliários. Não cabe ao Estado, pois, indicar ao investidor se este ou aquele investimento é adequado, lucrativo ou com potencial de valorização. Esta é uma decisão única do investidor. No entanto, cabe ao Estado a criação de procedimentos de fiscalização e exigência de prestação de informações por parte das companhias de capital aberto (ou que pretendam abrir o seu capital), assim como de seus administradores e terceiros que com ela se relacionem e, em razão da relação, possuam acesso a informações relevantes20 21.
O dever de informar não vincula apenas as companhias de capital aberto, mas todos aqueles que, de alguma forma, por meio do mercado de capitais, busquem a capitação de recursos da poupança popular. Incluem-se, portanto, as companhias e seus administradores, os fundos de investimentos e seus administradores, os intermediários e, em algumas situações, os próprios investidores22. Trata-se de um dever cooperativo, o ambiente deve estar informado para que se assegure um sistema de investimentos mais seguro e minimize, como um dos objetivos ressaltados no trabalho da International Organization of Securities Comissions, o chamado risco sistêmico.
As companhias de capital aberto23 devem divulgar informações que permitam ao investidor, de uma forma geral, a análise das atividades desenvolvidas e os riscos do desempenho dessas atividades. Segundo Warde24, o dever de informar possui os seguintes objetos:
“O objeto do dever de informação é quase sempre um dos seguintes: a situação econômico-financeira e jurídica da empresa (o seu estado); as projeções sobre esse estado; as alterações relevantes do estado da empresa ou fatos que nele se reflitam ou possam refletir; as relações de controle e de coligação; dados sobre a administração do emissor de valores mobiliários; fatos que permitam a obstaculização ou a detecção e punição de ilícitos de mercado; fatos necessários à regular administração de “vias negociais” e ao bom funcionamento do mercado de capitais como um todo.”
O Princípio do Full and Fair Disclosure, portanto, pode ser observado por meio da consolidação do dever de informar em sua forma mais completa, cumprindo os objetos supramencionados, de forma tempestiva, permitindo um agir informado por parte dos agentes financeiros e de terceiros (principalmente os investidores pessoa física). Trata-se de possibilitar o acesso amplo às informações que permitam compreender a saúde da companhia e a avaliação risco-retorno de determinado investimento.
O potencial de influência da informação nos preços de ações, commodities e outros bens negociados no mercado de valores mobiliários exige que o acesso a tais seja permitido de forma simultânea, tempestiva, sem privilegiar este ou aquele agente, sob pena de perder a sua razão de existir25. O momento de divulgação, portanto, deve ser observado pelos detentores da informação, para que não haja benefício de um agente/investidor em prejuízo de outro.
Resumindo a importância do disclosure e validando as afirmações já realizadas, CARVALHOSA e EZRIK26 expõem o seguinte:
“Neste sentido, a importa^ncia do disclosure reside na presunção de que, uma vez adequadamente provido das informaço~es relevantes sobre a companhia e sobre os ti'- tulos que ela emite, o investidor tem condiço~es de, antes de tomar suas deciso~es, avaliar o mérito do empreendimento e a qualidade dos papéis que lhes são oferecidos. (...) Dessa forma, visando a garantir a proteção ao investidor, a regulação do mercado de capitais impo~e a pronta e imediata divulgação de todas as informaço~es relevantes a respeito das sociedades com os ti'tulos publicamente negociados. (...) Em outras palavras, deve haver o “timely disclosure”, isto é, as informaço~es devem ser divulgadas tão logo a administração da companhia tenha verificado a releva^ncia da situação que deva ser de conhecimento pu'blico. (...) O timely disclosure confere a todos acesso igualitário às informaço~es que podem influenciar as deciso~es de investimento no mercado de capitais, já que possibilita que todos tenham conhecimento dos fatos relevantes ao mesmo tempo.”
Há, portanto, um dever contínuo que atinge as informações no âmbito do mercado de valores mobiliários, que é realizado em diversos momentos e em diversas situações, não sendo ato único ou isolado. Trata-se de uma exigência de constante observância ao acesso às informações.
Diante da relevância do dever de informar, devidamente destacada nas linhas antecedentes, é possível questionar o cumprimento deste dever, assim como do dever de fiscalização, no momento de preparação de oferta pública de ações na abertura de capital de companhias. A análise, no entanto, cabe ser realizada em outro momento, dedicando um trabalho próprio para o tema.
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1 “O mercado de capitais é, também, uma subespécie do mercado financeiro, caracterizada, por sua vez, por um sistema de distribuição de valores mobiliários que viabiliza, em um primeiro momento, a transferência direta, sem intermediação financeira, de recursos entre tomadores (principalmente companhias abertas) e aplicadores (investidores). Os emissores de valores mobiliários necessitam de meios financeiros para realizar investimentos, como o desenvolvimento de novos bens ou serviços, a construção de unidades industriais, a inovação tecnológica, a expansão da capacidade produtiva, a aquisição de outras empresas ou apenas o alongamento do prazo de suas dívidas; de sua parte, os investidores possuem recursos financeiros excedentes, que desejam aplicar a curto prazo, de modo especulativo, ou para que se valorizem ao longo do tempo, contribuindo para o aumento do capital investido. (...) As principais funções do mercado de capitais são: a) canalizar os recursos econômicos para transformá-los em atividades produtivas; b) oferecer fontes de financiamento às companhias; c) servir como alternativa de investimento para os poupadores superavitários, oferecendo-lhes ampla gama de instrumentos com diferentes rentabilidades, prazos e níveis de segurança.” (CAVALI, Marcelo Costenaro. Manipulação do Mercado de Capitais: Fundamentos e Limites da Repressão Penal e Administrativa. São Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 107.)
2 Este mal-estar não é relacionado ao modelo ideal weberiano de burocracia, que consistiria em um funcionalismo público estável, qualificado e especializado para o desempenho das atividades. Trata-se de um mal-estar causado por algo que o próprio Weber já havia percebido, a criação de grupos que defenderiam seus próprios interesses, inclusive por meio da criação de procedimentos que “engessam” o sistema e beneficiam os burocratas com a manutenção das suas funções por tempo indefinido.
3 “A primeira constatação para a consecução dos objetivos de um o'rgão regulador é a de que ha' uma opção clara pelo modelo capitalista, baseado na economia de mercado e na livre iniciativa, o que induz a` aceitação dos instrumentos de mercado. (...) A liberdade que caracteriza esse sistema não impede que a economia possa, em alguns dos seus segmentos, estar sujeita a` interfere^ncia do Estado. (...) Reconhece-se que o mercado traz dentro de si algumas ineficie^ncias. Além disso, vistas como um todo, as sociedades, e principalmente as mais livres, caracterizam-se pelos conflitos. Na comunidade como na economia, a presença do Estado importa para eliminar ou minimizar esses conflitos de interesses, ou ainda, harmoniza'-los. Dentro desse contexto, é que se inserem tanto o mercado de valores mobilia'rios quanto a pro'pria CVM, a quem a legislação delegou poderes para desenvolve^-lo e regula'-lo (...). A CVM, obedecendo aos postulados da economia de mercado, persegue um mercado de valores mobilia'rios eficiente, que, para tanto, pre- cisa ser livre, competitivo e informado, e deseja também um mercado confia'vel como resultado de uma adequada proteção e harmonização dos interesses de todos os que nele transacionam. O exercício da atividade regulato'ria da CVM, em conseque^ncia, objetiva a manutenção da eficie^n- cia e da confiabilidade no mercado de valores mobilia'rios, condições consideradas fundamentais para assegurar o desenvolvimento desse mercado” (Voto n.º 426 CMN realizado em 1978 pelo então presidente da Comissão de Valores Monetários junto ao Conselho Monetário Nacional, cujo acesso pode ser realizado no seguinte link: clique aqui)
4 O material pode ser encontrado por meio do acesso ao sitio eletrônico da International Organization Of Securities Commissions (clique aqui acessando a aba de publicações (“Publications”) e “Public Reports”, realizando o filtro de busca por meio da keyword “Principles”, ou por meio do seguinte link direto: clique aqui
5 “Portanto, o risco siste^mico per se é a possibilidade latente – desconhecida pelos participantes do mercado, ou contra a qual estes não se protegeram – de que um evento sistêmico possa ocorrer (e a economia, de fato, mova-se em direção a um equilíbrio subótimo). Os teóricos tendem a atribuir eventos sistêmicos a uma de duas hipóteses gerais sobre o funcionamento dos mercados financeiros: – Informação assimétrica em mercados de crédito (Mishkin, 1995), que conduz à subestimação do risco e ao subseqüente sobreendividamento, fazendo surgir a fragilidade financeira, que resulta em um aumento acentuado no custo da intermediação financeira e/ou num credit crunch. – Formação de preços de ativos em condições de liquidez restrita (Minsky, 1986), que descreve a alternância de euforia e desilusão gerada por fortes interações subjetivas entre os participantes do mercado, as quais fazem surgir comportamentos coletivos (conta'gio e pânico).” (Texto original de Michel Aglietta, traduzido por Maria Clara Paixão de Sousa e revisado por Antonio Carlos Macedo e Silva, cuja tradução foi publicada na revista Economia e Sociedade, Universidade Estadual de Campinas, (11): 1-32, dez. 1998, e originalmente publicado por meio da seguinte referência: AGLIETTA, M. Financial market failures and systemic risk. Jan. 1996,Document de Travail, CEPII, n. 96.01).
6 “O desenvolvimento do mercado de valores mobilia'rios encontra-se condicionado à confiança que o seu funcionamento possa inspirar ao público investidor. O elemento confiança será estimulado a partir da garantia de que as informações disponíveis a uma das partes, ao negociar com valores mobiliários, devem, também, ser conhecidas pela outra parte. Tal objetivo somente poderá ser alcançado através de imediata, completa e precisa divulgação dos atos ou fatos relevantes ocorridos nos negócios da companhia aberta.” (NOTA EXPLICATIVA CVM Nº 28/84).
7 “O direito a` informação, por ser um direito fundamental do acionista, de caráter instrumental, inerente e decorrente do seu status socii, é essencial, intangível, irrenunciável e irrevogável, absolutamente indispensável para o exercício de outros direitos, em especial o de fiscalizar o desempenho dos administradores; o de examinar livros, documentos e papéis da companhia; o de debater e deliberar nos conclaves de acionistas; o de apresentar protestos e impugnações para serem arquivados na sede social, após rubricados pelo presidente da mesa dos trabalhos etc.” (LOBO, Jorge. Deveres dos Administradores das Sociedades Anônimas. Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro, n.º 68, abr/jun 2018. p. 217 - 229)
8 “Como se pode observar das anotações precedentes, é de natureza instrumental o direito a` informação, porquanto serve ele de meio ao exercício de outros direitos, inerentes a` condição de acionista.” (GUERREIRO, José Alexandre Tavares. O conselho fiscal e o direito à informação. RDM, 1982, vol. 45, p.30)
9 “As ações são os títulos representativos do capital social das sociedades anônimas, conferindo aos seus titulares o direito de participar dos resultados da atividade das companhias. (...) Trata-se do único valor mobilia'rio de emissão obrigato'ria, sendo, por conseguinte, a mais importante forma de atração de investidores por meio das companhias. As ações são títulos livremente negociáveis, que asseguram a condição de acionista aos seus titulares com todos os direitos e obrigações inerentes a tal condição. Representam, por outro lado, frações do capital social da companhia.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial v 1 - teoria geral e direito societário. 11ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2020. p. 478)
10 ORPHÃO, Renata Santiago. Direito e transparência na divulgação de informações: a regulamentação brasileira versus a americana (Lei Sarbanes-Oxley). São Paulo: Textonovo, 2003. p. 149 e seguintes.
11 Ambas as legislações podem ser acessadas pelo sitio eletrônico: clique aqui
12 “A filosofia da disclosure foi a vencedora nos Estados Unidos, em 1934, com a edição da Securities Act e a criação de Securities and Exchange Comission, universalmente conhecida pela sigla SEC. Sustentava-se que, para o investidor, essas providências deveriam produzir basicamente, dois efeitos: impedir, ou prevenir, algumas transações fraudulentas, que não resistiriam à luz da publicidade; melhorar o nível de julgamento dos experts, dos entendidos – ou dos que deviam entender os informes e os dados divulgados, especificamente, os corretores e os grandes investidores – o que, de alguma forma, deveria refletir-se no mercado, e acabaria filtrado para o investidor comum, através de seus conselheiros. Daí o Securities Act ser chamado “a lei da verdade nos títuloes”.” (LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A Lei das S.A: pressupostos, elaboração, aplicação, v. 2, 2ª. Edição. Rio de Janeiro: Renovar, 1996, v2, p. 380)
13 “(...) Congress opted for the British disclosure philosophy over the native merit philosophy of the blue sky laws. (...) Congress was conscious also of Louis D. Brandeis’s statement seventy years later in Other People’s Money, strongly urging publicity as a remedy for social and industrial diseases generally and for excessive underwriter’s charges specifically. ‘Sunlight is said to be the best of disinfectants; electric light the most efficient policeman.’ (...) He cited the Pure Food Law as an example: It does not guarantee quality or prices, but it does help the consumer to judge quality by requiring the disclosure of ingredients.” (LOSS, Louis. Fundamentals of Securities Regulation. 2. ed. Boston: Little, Brown & Company, 1988. p. 31-33)
14 Art. 157. O administrador de companhia aberta deve declarar, ao firmar o termo de posse, o número de ações, bônus de subscrição, opções de compra de ações e debêntures conversíveis em ações, de emissão da companhia e de sociedades controladas ou do mesmo grupo, de que seja titular. § 1º O administrador de companhia aberta é obrigado a revelar à assembléia-geral ordinária, a pedido de acionistas que representem 5% (cinco por cento) ou mais do capital social: a) o número dos valores mobiliários de emissão da companhia ou de sociedades controladas, ou do mesmo grupo, que tiver adquirido ou alienado, diretamente ou através de outras pessoas, no exercício anterior; b) as opções de compra de ações que tiver contratado ou exercido no exercício anterior; c) os benefícios ou vantagens, indiretas ou complementares, que tenha recebido ou esteja recebendo da companhia e de sociedades coligadas, controladas ou do mesmo grupo; d) as condições dos contratos de trabalho que tenham sido firmados pela companhia com os diretores e empregados de alto nível; e) quaisquer atos ou fatos relevantes nas atividades da companhia. § 2º Os esclarecimentos prestados pelo administrador poderão, a pedido de qualquer acionista, ser reduzidos a escrito, autenticados pela mesa da assembléia, e fornecidos por cópia aos solicitantes. § 3º A revelação dos atos ou fatos de que trata este artigo só poderá ser utilizada no legítimo interesse da companhia ou do acionista, respondendo os solicitantes pelos abusos que praticarem. § 4º Os administradores da companhia aberta são obrigados a comunicar imediatamente à bolsa de valores e a divulgar pela imprensa qualquer deliberação da assembléia-geral ou dos órgãos de administração da companhia, ou fato relevante ocorrido nos seus negócios, que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia. § 5º Os administradores poderão recusar-se a prestar a informação (§ 1º, alínea e), ou deixar de divulgá-la (§ 4º), se entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia, cabendo à Comissão de Valores Mobiliários, a pedido dos administradores, de qualquer acionista, ou por iniciativa própria, decidir sobre a prestação de informação e responsabilizar os administradores, se for o caso. § 6o Os administradores da companhia aberta deverão informar imediatamente, nos termos e na forma determinados pela Comissão de Valores Mobiliários, a esta e às bolsas de valores ou entidades do mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação, as modificações em suas posições acionárias na companhia.
15 A lei 6.385/76 criou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e também trouxe diversas previsões regulatórias para o mercado de valores mobiliários. Dentre estas disposições, dedicou atenção a tópicos específicos atinentes às informações e ao seu uso, determinando e criando a possibilidade de exigências impositivas na apresentação de informações por aqueles que as detenham, assim como vetando, sob pena de punições específicas, a utilização privilegiada de informações em prejuízo dos demais investidores e da coletividade como um todo.
16 Art. 177 - Promover a fundação de sociedade por ações, fazendo, em prospecto ou em comunicação ao público ou à assembléia, afirmação falsa sobre a constituição da sociedade, ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo: (...)
17 Art. 3º. São também crimes desta natureza: (...) VII - dar indicações ou fazer afirmações falsas em prospectos ou anúncios, para fim de substituição, compra ou venda de títulos, ações ou quotas; (...)
18 “(...) a política de disclosure consiste no processo de divulgação pelas empresas de informações amplas e completas a respeito delas próprias e dos valores mobiliários por elas publicamente ofertados, de forma equitativa para todo o mercado (...)” (EIZIRIK, Nelson Laks; IBMEC. O papel do Estado na regulação do mercado de capitais. Rio de Janeiro: Ibmec - SP, 1977. p. 6.)
19 “O princípio do disclosure pode ser assim resumido: uma vez adequadamente provido das informações relevantes sobre a companhia e sobre os títulos por ela emitidos, o investidor tera' condições de avaliar o mérito do empreendimento e a qualidade dos papéis. Com efeito, a age^ncia reguladora do mercado de capitais brasileiro, a CVM, da mesma forma que ocorre com suas conge^neres em outros países, não escolhe as companhias que podem abrir o capital, nem realiza exame de mérito do empreendimento; cumpre- lhe basicamente exigir a prestação das infor- mações e sua disponibilização para o público. (...) Dessa forma, o postulado ba'sico da regulação do mercado de capitais é de que o investidor estara' protegido na medida em que lhe sejam prestadas todas as informações relevantes a respeito das sociedades com os títulos publicamente negociados.” (CARVALHOSA, Modesto. Modesto, e Nelson Eizirik Estudos de Direito Empresarial, 1ª edição. Editora Saraiva, 2010. p. 382)
20 “De acordo com os estudos acima realizados acerca da Ana'lise Econômica do Direito, constatou-se que o mercado não funciona de maneira perfeita, ou seja, apresenta falhas, as quais prejudicam o desenvolvimento da economia. Uma dessas falhas é justamente a existe^ncia de assimetria de informações entre os agentes econômicos, caracterizada, entre outras situações, quando uma das partes possui mais informações do que a outra no momento da negociação. É o que se verifica, por exemplo, no âmbito do mercado de capitais, em que a companhia emissora das ações possui mais informações sobre a liquidez do título do que os investidores interessados em compra'-lo. Quando as informações são assimétricas, o mercado falha e deixa de promover a maximização do bem-estar social. (...) Isso significa que o mercado, por si so', não consegue atingir o ma'ximo de eficie^ncia, razão pela qual necessita da intervenção estatal no domínio econômico. Uma das soluções encontradas para corrigir as falhas de mercado consiste no aperfeiçoamento do marco regulato'rio, que contribui, ainda, para o aumento do grau de segurança e previsibilidade e, por conseguinte, para a redução dos custos de transação, facilitando as contratações.” (BERGIT, JAKOBI, Karin, e RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. A análise econômica do direito e a regulação do mercado de capitais. Grupo GEN, 2014. p. 102 – versão digital)
21 “Considerando que um dos objetivos ba'sicos do mercado de capitais consiste em permitir o acesso das sociedades anônimas a` poupança popular, torna-se fundamental prover aos investidores um adequado sistema de proteção. Por outro lado, tal proteção aos investidores não pode restringir demasiadamente a possibilidade de captação de recursos pelas companhias, sob pena de inviabili- zar o pro'prio funcionamento do mercado de capitais. A tutela estatal, visando a conciliar esses dois objetivos, da'-se, basicamente, a partir de uma eficiente po- lítica de ‘disclosure’ de divulgação de informação. A implementação da política do ‘disclosure’ esta', a seu turno, fundamentada na existe^ncia de um sistema de registros perante a CVM, por meio dos quais são canalizadas as informações consideradas necessa'rias para o público investidor efetuar suas decisões de in- vestimento de maneira consciente.” (EIZIRIK, Nelson; GAAL, Aria'dna B.; PA- RENTE, Fla'via; HENRIQUES, Marcus de Freitas, Mercado de capitais – regime jurídico, 3. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2011, p. 140-141)
22 WARDE JÚNIOR. Walfrido Jorge. O que todo mundo precisa saber sobre o dever de informar. Revista Capital Aberto. Ed. 144, 2015.
23 “As sociedades anônimas emitentes de ações podem ser de dois tipos: abertas ou fechadas. Uma companhia é aberta quando tem suas ações distribuídas entre um número mínimo de acionistas, podendo ser negociadas em Bolsas de Valores. Essas sociedades devem ser registradas na Comissão de Valores Mobiliários como de capital aberto e fornecem ao mercado, de forma periódica, uma série de informações de caráter econômico, social e financeiro. As companhias de capital fechado, por seu lado, são tipicamente empresas familiares, com circulação de suas ações restrita a um grupo identificado de investidores.” (ASSAF NETO, Alexandre. Mercado financeiro – 14. ed. – São Paulo: Atlas, 2018. p. 206 – versão digital)
24 WARDE, Op cit.
25 “O mercado de valores mobilia'rios é um mercado que vive da sua capacidade de ser transparente, encontrando-se amplamente demonstrada a enorme sensibilidade e reactividade dos preços dos activos nele negociados à informação divulgada. Nesta medida, a confiança coloca-se com a maior acuidade, pressupondo desde logo a capacidade de o mercado operar de forma transparente e neutral, permitindo uma distribuição igualitária dos riscos de informação que lhe são inerentes. É aqui que o legislador é chamado a intervir no sentido de criar as condições para que as decisões de investimento sejam tomadas por vontades livres e esclarecidas, e de ao mesmo tempo proteger o mercado contra a formação de assimetrias informativas, impondo revelações tempestivas e reprimindo comportamentos que se materializam na ocultação ou na utilização indevida da informação.” (AVILLEZ, José João de. Os deveres de informação permanente no mercado de capitais. Revosta da Ordem dos Advogados de Portugal. Ano 6, Vol. I/II, Nov. 2004. Acesso por meio do link: clique aqui)
26 CARVALHOSA, Modesto. Modesto, e Nelson Eizirik Estudos de Direito Empresarial, 1ª edição. Editora Saraiva, 2010. p. 507