A falácia de novas leis penais contra o crime organizado (Final)
René Ariel Dotti*
Existem analogias entre alguns problemas sociais que merecem reflexão histórica para comparar e compreendê-las. Uma dessas relações assemelhadas ocorre entre a inflação e o progresso da criminalidade. O mal crônico de nosso país era caracterizado pelo aumento persistente dos preços em geral e a continuada perda do poder aquisitivo da moeda. Crescia a circulação monetária em desproporção com o volume de bens disponíveis.
Fernando Collor de Mello anunciou que o seu governo venceria a inflação com um tiro. No dia seguinte à posse (15.3.1990) lançou o programa de estabilização baseado num gigantesco e inédito confisco monetário, congelamento temporário de preços e salários e reformulação dos índices de correção monetária. Apesar de alguns aspectos positivos do Plano Collor, como a iniciativa de privatizar empresas estatais , a modernização da indústria e a abertura da economia para mercados externos, o saldo registrado pelos especialistas em geral é negativo. O autoritarismo e o intervencionismo exagerado foram violentos contra o sistema econômico.
A inflação somente foi derrotada com o Plano Real, assim chamado em face da substituição da antiga moeda (1º de julho de 1994). O ajuste fiscal, a desindexação da economia e a política monetária restritiva venceram as três décadas de inflação que nos dias correntes é mantida sob controle.
A incapacidade do Estado para impedir ou reduzir a multiplicação dos crimes violentos corresponde à continuada falta de segurança da população. A lei está perdendo o poder aquisitivo da confiança. Há um notável aumento da circulação do crime em contraste com o volume de meios e métodos estatais para enfrentá-lo.
A sociedade brasileira, vítima da omissão dos poderes públicos e refém do terror, precisa de um plano real para a segurança coletiva. Não um “plano” direcionado basicamente para o interior das penitenciárias como se os crimes hediondos e as organizações criminosas deixassem de existir fora das grades das prisões. Há determinadas cautelas que devem ser adotadas desde logo como a interdição do uso de celulares, o controle de visita de advogados suspeitos de cumplicidade e a indisponibilidade de bens do integrante de facção criminosa.
Mas a legislação de pânico ou o tiro do Parlamento visando o endurecimento das penas e a multiplicação do tempo de isolamento celular diuturno só irá agravar o cenário de terror.
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*Advogado do Escritório Professor René Ariel Dotti
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