O Código de Processo Civil publicado em março de 2015, também conhecido como CPC 15, exigiu dos advogados e operadores do direito uma nova forma de pensar o processo e o contencioso, o que impactou, de forma bastante significativa, o contencioso tributário judicial e também o administrativo.
A exposição de motivos do CPC 15 evidenciava toda a problemática do antigo diploma (1973), demonstrando a necessidade de aprimoramento da sistemática processual, para garantia e satisfação do direito material pleiteado em juízo: “Sendo ineficiente o sistema processual, todo o ordenamento jurídico passa a carecer de real efetividade. De fato, as normas de direito material se transformam em pura ilusão, sem a garantia de sua correlata realização, no mundo empírico, por meio do processo.”
Em suma, a nova sistemática foi criada para buscar a solução de problemas relacionados à funcionalidade, efetividade, celeridade, coerência e sistematização do Poder Judiciário. Como resultado, viu-se ganhar força os chamados precedentes, exigindo um novo olhar para os julgamentos dos Tribunais Superiores, inclusive forçando uma advocacia mais colaborativa no julgamento dos chamados leading cases, que são posteriormente replicados pelas instâncias inferiores.
Nesse sentido, o Conselho Administrativo Recursos Fiscais – CARF (Tribunal administrativo federal), por força do seu próprio regimento, também passou a aplicar cada vez mais os recursos julgados em sede de repetitivos (STJ) e de repercussão geral (STF). Todavia, alguns Tribunais, como o Tribunal de Impostos e Taxas – TIT de São Paulo, ainda relutam em seguir os citados precedentes, mas cresce a discussão da necessidade de se positivar a vinculação dos Tribunais administrativos às referidas decisões¹
Fato é que a análise e o acompanhamento dos precedentes do STJ e do STF passou a ser primordial para prática das áreas fiscais e jurídicas, não só como medida de conformidade tributária (compliance), mas também como um importante indicador na tomada de decisão e na análise de riscos das respectivas áreas.
Nesse cenário em que os precedentes ganham relevância, é importante destacar que a sistemática processual brasileira tem suas peculiaridades e está longe de poder ser equiparada ao que conhecemos como common law².
E é justamente por conta dessas peculiaridades que devemos tratar e aplicar os precedentes com o devido cuidado e algumas técnicas como o distinguishing (distinção) e o overruling (superação) merecem maior aprofundamento.
O distinguishing refere-se à possibilidade de distinguir um determinado caso do precedente que se pretende aplicar, face às peculiaridades fáticas ou jurídicas do caso concreto. Já o overrrulling trata da superação de um determinado tema, ou seja, quando em razão de um novo posicionamento, ou de alguma situação jurídica superveniente, supera-se o precedente anterior, inviabilizando a sua aplicação.
Especialmente em matéria tributária, esses temas são importantes na medida que tem sido comum a aplicação arbitrária dos precedentes, não levando em consideração o distinguishing, não só pelo Poder Judiciário, mas também pelos contribuintes e pelas autoridades administrativas.
Como acima comentado, a força dos precedentes no processo civil brasileiro nasce da necessidade por segurança jurídica e de um anseio por eficiência, estabilidade, coerência e celeridade do Judiciário, garantindo um tratamento adequado aos jurisdicionados. E é sob este olhar que devem ser aplicados os precedentes, jamais como barreira no acesso ao Judiciário ou como impeditivo da análise concreta de cada caso.
Da mesma forma, contribuintes e fisco precisam ajustar a conduta, se de um lado os contribuintes são autuados por direcionarem suas decisões tributárias em precedentes já pacificados e que se aplicam perfeitamente ao caso, de outro, vemos contribuintes que deixam de recolher tributos embasados em precedentes (e teses) que em nada se relacionam com o caso concreto.
Essa aplicação arbitrária gera prejuízo para os dois lados, fisco, contribuintes, além de contribuir para os infindáveis conflitos tributários, o que destoa e contraria as motivações do CPC 15.
Portanto, contribuintes, autoridades fiscais e julgadores devem entender a nova sistemática processual e o impacto dos precedentes na área tributária, o que certamente contribuirá para a diminuição do conflito entre fisco e contribuintes, desafogando o judiciário e garantindo a tão almejada segurança jurídica.
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1. Tramita hoje na ALESP o Projeto de lei 367, de 2020, o qual amplia as hipóteses em que a administração pública deve seguir o entendimento do judiciário.
2. Sistema baseado em precedentes judiciais, no qual as decisões são fontes imediatas e tem efeito vinculante