Na sociedade atual, conhecida como Sociedade do Big Data, a maior parte das relações são moldadas por dados, sejam interpessoais ou de consumo, por exemplo. A grande questão, neste caso, é: até que ponto o titular dos dados é afetado pelas políticas de atuação do Big Data?
O Big Data tem como característica o tratamento e criação de padrões por meio de análise massiva de informações. Tudo que está na internet, uma vez que não seja sigiloso, pode ser utilizado no processo de interpretação dos dados. As informações geradas podem ser utilizadas para diversas finalidades, como a definição de estratégias de redução de custos ou mesmo de Marketing, produzindo-se conteúdo com maior precisão de forma direcionada e assertiva.
Uma demonstração significativa disso são as pesquisas diariamente realizadas por meio de ferramentas como o Google, ou mesmo em redes sociais, como o Facebook. Os dados fornecidos são tratados e utilizados na criação do Profiling, uma das técnicas do Big Data, ou seja, na definição de características de consumo ou mesmo traçando um perfil psicológico de cada membro da sociedade.
Não é incomum, embora cause certa estranheza, que algumas palavras ditas perto de um dispositivo conectado à rede provoquem um bombardeio de conteúdo semelhante. É o resultado da criação do Profiling. Inclusive, este é o tema de um embate recentemente estabelecido entre a Apple e o Facebook, uma vez que a primeira, ao atualizar seu software, possibilitou aos usuários maiores poderes sobre os dados fornecidos por aplicativo utilizado. Já a segunda considerou a atitude inadequada, uma vez que grande parte da publicidade ofertada em sua plataforma decorre do rastreamento de dados e criação de anúncios segmentados com base no perfil de consumo estabelecido.
Pois bem. A utilização dos dados por esses mecanismos pode trazer grandes abalos à pessoa, seja através da inserção do indivíduo nas chamadas bolhas sociais, em que este se conectará apenas com pessoas de perfil semelhante, correndo o risco de se tornar alheio à diversidade social, ou ainda no que diz respeito à sua privacidade propriamente dita, que é um dos pilares básicos da própria lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Desta forma, pode-se dizer que o Big Data será significativamente impactado pela LGPD, na medida em que a obtenção de dados pessoais de forma automatizada, por meio da análise das características individuais, é essencial para a construção dos perfis citados.
A LGPD, em seu art. 20, traz regra de grande relevância no que diz respeito ao tema, ao estabelecer que o titular dos dados tem direito de solicitar a revisão de decisões tomadas, com base no tratamento automatizado de dados pessoais que afetem seus interesses, sendo, de forma reflexa, dever do controlador fazer cumprir a necessidade do titular, garantindo o pleno exercício de direitos.
O fato é que as empresas que se utilizam dos dados, como forma de impulsionar seus negócios, terão de buscar meios de adequação aos termos da lei, sendo necessária a melhor estruturação dos dados coletados, para conferir maior integridade e segurança a estes, além do desenvolvimento dos programas de Compliance.
De outro ponto, cabe dizer que todos os dados fornecidos pelo titular, por meio dos mecanismos acima citados, se utilizam da base legal do consentimento, sendo necessária a manifestação livre, informada e inequívoca.
Esta base legal é uma das mais frágeis da lei. Embora os sites tenham seus termos de uso, políticas de privacidade e de uso de Cookies, muitas das vezes estes são elaborados com linguagem complexa ou se tratam de documentos inacessíveis a parcela significativa dos usuários.
Uma solução para a questão é a simplificação dos termos, colocando-os de forma sistematizada, garantindo que o usuário realmente consinta com o uso de seus dados em todos os termos ali lançados, cumprindo todos os requisitos do consentimento conforme acima exposto. Além da simplificação dos termos, é indispensável o fornecimento de versão mais completa dos documentos.
Essas adaptações vão ao encontro com o disposto no art. 6, inciso VI da LGPD, que prevê a necessidade de garantir aos titulares dos dados a transparência por meio da clareza, relevância e exatidão do tratamento que será dado às informações.
Note-se que as soluções têm uma função de extrema importância: garantir a acessibilidade ao titular, fazendo com que este realmente saiba para qual finalidade seus dados estão sendo coletados, tratados e utilizados.
Não se pode considerar consentimento se o titular dos dados não tiver plena ciência do que está aceitando. Ambas as disposições acima enumeradas caminham neste sentido.
O fato é que os dados são a maior riqueza disponível no mercado mundial. Quem souber utilizá-los em conformidade com a LGPD ou mesmo com as leis de proteção de dados de outros países, com certeza terá vantagens competitivas.
Embora a sociedade muito tenha se modernizado, a confiança continua sendo o requisito mais importante em qualquer relação. E a melhor forma de alcançá-la é por meio da clareza no diálogo entre as partes, sejam pessoais ou na interface entre o homem e o mundo digital.