A extensão da falência e seus jurídicos efeitos a empresa pertencente a grupo econômico – Anotações
Carlos Roberto Claro*
No que se refere à primeira questão, mesmo antes de expressamente constar do artigo 50 do Código Civil de <_st13a_metricconverter w:st="on" productid="2002, a">2002 (clique aqui), a Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica já vinha sendo estudada e aplicada nos casos judiciais. Evidentemente que aqui não se descerá a minúcias a respeito de palpitante tema, mas sobreleva lembrar que desconsiderar a personalidade jurídica significa ignorar a atribuição legal de direitos e obrigações2 e a questão envolvendo o abuso de direito e a fraude, conforme exposto, no Brasil, teve como ponto de partida o texto do prof. Requião, em dezembro/1969, na Revista dos Tribunais. Esse é considerado o termo inicial para fins da discussão a respeito da doutrina da disregard theory. A jurisprudência já consolidou entendimento de que “sendo evidenciada a fraude por parte dos sócios de empresa falida, consistentes em desviar o patrimônio da sociedade para o seu próprio e para empresa sucessora, tudo com o objetivo de lesar os interesses dos credores, mostra-se acertada a decisão, proferida nos próprios autos da falência, afastando a proteção patrimonial da personalidade jurídica, determinou a arrecadação dos bens pessoais dos mesmos, reunindo-os aos da massa falida, inclusive mediante concessão cautelar de seqüestro, busca e apreensão desses bens”3. Portanto, tratando-se especificamente acerca de caso que envolva a possibilidade de desconsideração de personalidade jurídica, e tal pleito é formulado no âmbito do processo falimentar, inexiste motivo bastante para deslocar a discussão para outro processo, como poder-se-ía pensar, a princípio. De fato, caso não é de se falar em responsabilidade de participante, e aí sim deveriam ser observados os artigos 81 e 82 da nova lei falimentar. Portanto, verifica-se que a desconsideração da personalidade jurídica pode ser requerida e decidida no âmbito do processo falimentar, quando existam vínculos entre empresas outras e a falida.
Quanto à segunda situação aqui ventilada, nota-se que a redação do artigo 192 da Lei 11.101/05, é confusa, especialmente no que diz com as disposições constantes do caput e do parágrafo quarto. Ora, em linhas gerais, o caput estabelece que o novel texto falimentar não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que deverão ser concluídos com base na lei de <_st13a_metricconverter w:st="on" productid="1945. A">1945. A seu turno, diz o texto normativo constante do parágrafo quarto que a lei de 2005 é aplicável às falências decretadas quando da vigência das novas disposições resultantes de convolação de concordata ou de pedido de falência anteriores, às quais se aplicará, até a decretação, a lei de 1945, devendo ser observado na decisão que decreta a retirada da empresa do mercado, o que consta do art. 99 (da nova lei). Confuso, não? Pois é. Um pequeno parêntesis deve ser feito desde logo. O parágrafo primeiro do mesmo art. 192, que literalmente proíbe a concessão de concordata suspensiva (procedimento esse não previsto no novo texto de lei) a entes em processo falimentar regido pelo Dec.- Lei 7.661/45 (clique aqui), e que permite a alienação imediata de ativos arrecadados, assim que concluído tal procedimento (arrecadação), e ainda independentemente de formação de quadro geral de credores e conclusão de inquérito judicial, mostra-se totalmente inconstitucional. O tema será tratado noutro lugar. Prosseguindo com a análise específica do caput e do §4º do art. 192, nota-se claramente o descuido, o cochilo, quando da redação do texto normativo. Ora, em sendo clara a lei nova de que os processos antigos, e com decretação da falência anterior a 9/6/05, ou mesmo com anterior deferimento do processamento do favor legal (concordata preventiva), é de todo evidente que tais feitos não serão regidos pelo texto de 2005. Tivesse o legislador parado de descrever quando findada o caput, nenhum problema existiria. Mas foi adiante, inserido a arbitrariedade contida no §2º e piorando as coisas com a desastrosa redação do §4º, todos do art. 192. Este claramente estabelece que as falências com termo inicial antes de 9/6/05 terão prosseguimento com base no novo texto, o que se mostra incorreto. Os pedidos de falência ajuizados ao tempo da lei de 1945, mas sem decretação até junho/05 reger-se-ão pela lei antiga e a sentença deve observar os requisitos do artigo 99 do texto de 2005. Verdadeira miscelânea, como se pode perceber, existindo verdadeira antinomia, com a contradição real e evidente entre os textos <_st13a_personname w:st="on" productid="em comento. Claro">em comento. Claro e evidente que o devedor, citado em pedido de falência, com base na lei de 1945, terá menos prazo e mais prejuízo em relação ao devedor citado com espeque na lei de 2005 (lá o prazo é de 24h e aqui o prazo é bem mais amplo: 10 dias). Haverá, assim, tratamento diferenciado. Dúvida não há, consoante interpretação adequada, que o parágrafo quarto não pode ser observado, pois totalmente em dissintonia com o caput do artigo 192. As falências iniciadas antes de 9/6/05 deverão ser concluídas com observância da lei de 1945, portanto.
A terceira e última questão diz respeito ao seguinte tema não menos importante no âmbito falência: pode (ou não) liquidar patrimônio arrecadado em processo no qual foi decretada, posteriormente a esse ato (arrecadação), a falência de outra empresa do mesmo grupo econômico, tudo caminhando nos trilhos da lei de 1945? Crê-se que sim. E a resposta não guarda grande dificuldade. Evidente que o feito deverá, quanto à nova empresa falida, por assim dizer, observar os ditames legais, tais como envio de circular pelo síndico (lembre-se que o tema aqui é relativo ao texto de 1945), verificação de créditos, eventual inquérito judicial etc., mas também lembre-se que noutro lado está todo o patrimônio já arrecadado antes da decretação da falência por extensão, e que poderá, eventualmente, ser o único conjunto de bens relativo às duas empresas falidas. Lembre-se ainda que o processo permite a alienação antecipada, em qualquer momento e mesmo antes da fase liquidatória propriamente dita (art. 114 do antigo texto), tudo com base no art. 73 do Dec. -Lei 7.661/45. A alienação do patrimônio já arrecadado é um dever que se impõe, pena de deterioração, desvalorização etc., de modo que o juiz condutor do processo pode determinar, à vista de razões esclarecedoras, apresentadas pelo síndico, ordenar a imediata venda de bens apreendidos judicialmente. Haveria prejuízo aos “novos” credores, que participarão do velho processo, considerando a extensão da falência? Não. Ora, a alienação de bens não tem impeditivo, principalmente se o processo já está na fase do art. 114, e caberia ao síndico depositar o produto da alienação junto ao Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal, conforme art. 209, para que depois houvesse o rateio entre todos os credores (os antigos e os novos). O que não poderia ocorrer é a suspensão dos atos de alienação de bens porque novo procedimento foi instaurado no âmbito da falência. Suspender venda de bens seria, aí sim, medida criadora de sérios prejuízos a todos os credores.
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1Note-se que, possibilitando juridicamente a extensão da falência como base na Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica, e que no Brasil foi introduzida por Rubens Requião, está-se a falar na sistematização, no método hermenêutico sistemático, que tranqüilamente permite a existência de vasos comunicantes nos variados ramos do direito.
2Para adotar o entendimento, por todos, de Flávia Lefèvre Guimarães, na importante obra “Desconsideração da Personalidade Jurídica no Código do Consumidor – Aspectos Processuais”. São Paulo: Editora Max Limonad, 1998, p. 17.
3Tudo, conforme decidido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, processo 1.0312.03.900299-2?001 (1), rel. Des. Edivaldo George dos Santos, pub. 21/8/04. Há outras várias decisões na mesma linha, conforme, por exemplo, Revista dos Tribunais 631/197.
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*Professor assistente de Direito Societário e Falimentar das Faculdades Integradas Curitiba; e membro do “American Bankruptcy Institute” (U.S.).