Migalhas de Peso

O direito ao esquecimento no mundo virtual. O atual entendimento dos Tribunais Superiores

O impulsionado desenvolvimento das mídias informatizadas, interligado à facilidade e disponibilidade no acesso à informação, trouxe consigo significativa apreensão jurídica no que diz respeito a possíveis afrontas às garantidas à privacidade, à imagem e à honra.

25/3/2021

(Imagem: Imagem Migalhas)

1. Introdução.

A mídia impressa já apresentava ao cidadão, a par de sua imprescindibilidade no que diz respeito à livre informação no viés da liberdade de expressão, certa insegurança nos casos em que determinada pessoa tivesse sido investigada, condenada ou mesmo passado por determinada situação que pudesse, no caso de veiculação ampla pelos veículos de imprensa, causar constrangimento e danos ao sujeito reportado.

Com o desenvolvimento da tecnologia, a mídia acabou por migrar para o âmbito digital, sendo que na atualidade a via materializada subsiste pela perseverança de pequena parcela da sociedade que continua a consumir o material impresso.

Diante da referida transposição, o alcance da informação chegou a lugares anteriormente inacessíveis, em uma velocidade sem precedentes. Notícias que antes demandavam dias para se propagar, hoje necessitam de segundos para chegar não mais a todos os Estados brasileiros, mas sim aos quatro cantos do globo, ainda mais com a contribuição das redes sociais.

Não obstante a velocidade adquirida pelos veículos de comunicação na utilização da mídia digital ser um ponto positivo quando o assunto é a difusão da informação, os efeitos colaterais dessa mesma agilidade se mostram ainda mais devastadores.

Isto se dá, muitas vezes, pela corrida na prestação da informação. É que, sendo o meio informático uma verdadeira “selva” para os veículos de imprensa, onde se dá melhor aquele que antes publica determinada matéria, não é crível que se aguarde, em algumas situações, a apuração de determinados fatos para uma melhor ambientação da edição a ser disponibilizada na rede mundial de computadores.

De fato, atualmente, as notícias ultrapassam fronteiras, e o acesso às informações, com a informatização, tornou-se instantânea em um mundo globalizado, conectado e digital.

Isso tudo leva a situações em que pessoas investigadas ou condenadas criminalmente, ou mesmo com outro tipo de envolvimento comprometedor, acabam sendo expostas, muitas vezes de forma puramente sensacionalista (com o único intuito de gerar visualizações), em poucos segundos perante toda a comunidade.

Em uma única oportunidade jornalística pode-se, sem qualquer pudor, devastar a vida pública e/ou privada de alguém, sem sequer lhe ofertar o direito à defesa prévia.

Ocorre que, apesar da contemporaneidade de determinadas afirmações já gerar a responsabilidade do veículo emissor, determinadas notícias passaram a ser repostadas ad eternum. E essa presença perene da notícia virtual, mesmo quando abusiva, não seria alcançada e nem teria seus efeitos mitigados, de forma prática e eficiente, por qualquer meio de responsabilização ao infrator. A constante visualização fácil da notícia renova, a cada visita que recebe por terceiros, o sofrimento daquele que lá está sendo exposto.

Por conta disso, elaborou-se a teoria do denominado direito ao esquecimento, que se apresenta como o direito inerente ao ser humano de não permitir (ou fazer cessar) que um fato, mesmo que verídico, que tenha ocorrido em determinada circunstância ao longo de sua vida, seja exposto ao público em geral, causando-lhe, por isso, sofrimento ou transtornos. 

Em outras palavras, tem-se, pela teoria em espeque, o direito do cidadão de não ser lembrado, contra sua vontade, sobre determinada situação pretérita. Ele possui o direito de ser esquecido pela sociedade e retomar a regular marcha de sua vida, de forma a minorar os reflexos de acontecimentos passados.

Por essa conceituação, a teoria do direito ao esquecimento também pode ser identificada como o “direito de ser deixado em paz” ou mesmo de o “direito de estar só”.

Tem-se a ideia que tal desejo, seja no que diz respeito aos fatos criminais anteriores, ou sobre os fatos outros pretéritos, deveria ser acolhido por meio do direito ao esquecimento. Entretanto, a jurisprudência brasileira vem demonstrando certo dissenso na pacificação do referido entendimento, sobretudo após recente julgado do Supremo Tribunal Federal, como se passa a verificar.

Luiz Fernando Valladão Nogueira
Advogado. Procurador do município de Belo Horizonte. Professor universitário em graduação e pós-graduação. Coordenador de pós-graduação em Direito Processual Civil. Advogado do escritório Valladão Sociedade de Advogados.

Israel Damasceno
Advogado. Mestre em História do Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa - PT. Sócio do escritório Valladão Sociedade de Advogados.

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