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Prazo prescricional de ação de regresso para cobrança de valores pagos na esfera trabalhista

O operador do direito que buscar jurisprudência sobre o assunto encontrará decisões com a fixação de prazo de 03, 05 e 10 anos para a mesma questão, o que acaba por causar uma total instabilidade e uma completa falta de segurança jurídica.

13/11/2020

(Imagem: Arte Migalhas)

O prazo de prescrição para ingresso com ação de regresso para fins de cobrança de dívidas pagas em ações trabalhistas é um tema que ainda atrai dúvidas recorrentes, tendo em vista as diversas decisões em sentidos contrários no âmbito dos tribunais e até mesmo do Superior Tribunal de Justiça.

O operador do Direito que buscar jurisprudência sobre o assunto encontrará decisões com a fixação de prazo de 3, 5 e 10 anos para a mesma questão, o que acaba por causar uma total instabilidade e uma completa falta de segurança jurídica.

Primeiramente, é preciso compreender a origem da ação de regresso para o fim aqui pretendido, e a hipótese posta no presente estudo cinge-se acerca do caso em que determinada empresa, condenada solidariamente ao pagamento de dívida trabalhista, quita integralmente o débito e, em seguida, busca o direito de receber da outra empresa o valor que pagou indevidamente.

Diz-se indevidamente pago, pois, via de regra, este tipo de ação deriva de relações de contratos de "terceirização" em que uma companhia contrata empresa prestadora de serviços de meio (faxina, segurança, portaria, etc.), e esta por sua vez ao deixar de pagar o funcionário, a reclamação trabalhista é dirigida em face de ambas empresas, no entanto como praxe os contratos entre as companhias possuem cláusulas de não solidariedade nestas situações, e por esta razão, ao quitar a dívida em detrimento daquela verdadeiramente responsável, nasce o direito de ação regressiva para reaver aquilo que foi pago indevidamente em favor do funcionário/reclamante da empresa contratada.

Assim, nos termos do artigo 189, do Código Civil, "violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206".

Acerca da prescrição, oportuno se fazer a transcrição das palavras do eminente ministro Napoleão Nunes Maia Filho, no julgamento AgRg no Resp 1.148.236/RN, julgado em 7/4/11, em que proferiu o entendimento de que "o instituto da prescrição é regido pelo princípio da actio nata, ou seja, o curso do prazo prescricional tem início com a efetiva lesão ou ameaça do direito tutelado, momento em que nasce a pretensão a ser deduzida em juízo".

Portanto, é possível se extrair que a pretensão para a cobrança pela via regressiva nasce com o pagamento integral da dívida trabalhista (AREsp 1.170.965/MG), e não a partir da data da exigência da dívida (transito em julgado da ação trabalhista), pois, é com o pagamento da dívida que se tem a "efetiva lesão", e é a partir de então que, pela regra do art. 189, CC, tem-se início o prazo prescricional. E vale ressaltar que se parcelado o débito na esfera laboral, o direito de regresso só tem início com o pagamento da última parcela (STJ - AgInt no AREsp 1.437.396/SC; e AgInt no AREsp 1.170.965/MG).

Desta forma, quitado integralmente o débito trabalhista, nasce, àquele que pagou indevidamente, o direito ao ressarcimento de seu prejuízo, conforme artigo 934, do Código Civil.1

E é muito importante destacar que a solidariedade declarada na justiça laboral não se estende à esfera cível, pois, por disposição do artigo 265 do Código Civil: "A solidariedade não se presume; resulta de lei ou da vontade das partes".

Portanto, não obstante a condenação solidária no âmbito da justiça trabalhista, na seara cível, a solidariedade, a princípio, inexiste, e então, é plenamente cabível o ressarcimento do valor pago por aquele que não era responsável.

Feitos tais esclarecimentos, passa-se agora a análise do prazo prescricional para ingresso da ação de regresso para cobrança de dívidas pagas na esfera trabalhista.

O tema encontra diferentes entendimentos, e é possível se deparar com jurisprudências que apontam 3, 5 e 10 anos como prazo prescricional para este tipo de ação, baseados, em síntese, no que dispõe no caput do artigo 205, no § 3º, incisos IV e V, e § 5º, I, do artigo 206, ambos do Código Civil.

Para aqueles que defendem o prazo prescricional de 3 (três) anos, a tese se baseia no fato de que o direito de regresso tem como origem o enriquecimento sem causa (art. 206, § 3º, IV, do Código Civil)2 ou a reparação civil (art. 206, § 3º, V, do Código Civil)3.

Esta corrente é a corrente minoritária da jurisprudência pátria, tendo em vista que aplica o termo enriquecimento sem causa e reparação civil, sem qualquer distinção do tipo da relação existente no caso em concreto, como se pelo simples fato de se tratar de ação de regresso, já se teria a figura descrita nos incisos IV e V do § 3º do art. 206, CC.

Neste sentido: TJ/RS – APL: 70057892614/RS, julgado em 25/3/14; TJ/SP – APL: 0045491-55.2008.8.26.0000, julgado em 19/9/12; TJ/PR – APL: 0000428-69.2013.8.16.0045, julgado em 2/5/19.

Por outro lado, a corrente que defende a aplicação do prazo quinquenal previsto no art. 206, § 5º, I4, decorre do entendimento de que o pagamento da dívida na esfera trabalhista gera a possibilidade de cobrança de dívida líquida, seja em razão da existência de instrumento público, qual seja, eventual acordo homologado na esfera trabalhista (TJSP – APL: 10053366-56.2017.8.26.0309, julgado em 7/3/2018) ou seja em razão do instrumento particular firmado entre as partes condenadas ao pagamento na justiça trabalhista (o próprio contrato de prestação de serviços).

Neste sentido: TJ/SP – APL: 0034666-82.2011.8.26.0053, julgado em 18/9/12; TJ/SP – APL: 1007880-96.2015.8.26.0132; TJ/SP – APL: 1007405-43.2015.8.26.0132; TJ-SP, APL 1024411-31.2016.8.26.0002, julgado em 1/6/17; TJ/PR – APL: 16133907/PR – julgado em 17/5/17;

Segundo esta corrente "em se tratando de cobrança de dívida fundada em direito contratualmente previsto, o prazo para propor a ação é de cinco anos, nos termos do art. 206, § 5º, inciso I, do Código Civil" (TJ/SP – APL: 0034666-82.2011.8.26.0053), e o trecho retro destacado se refere a julgado do E. Tribunal de Justiça cujo mérito versava sobre o direito de regresso de empresa que foi solidariamente responsável em reclamação trabalhista, mas que mantinha contrato de prestação de serviço com cláusula que previa o direito ao reembolso em caso de despesas trabalhistas.

Portanto, pela corrente jurisprudencial que defende a aplicação do prazo quinquenal, o direito de regresso é derivado de relação contratual existente entre as partes, em que conste cláusula de exclusão da responsabilidade na esfera trabalhista ou então no próprio acordo homologado na seara laboral, e, portanto, com aplicação do inciso I, do § 5º, do artigo 206, do Código Civil, por entenderem se tratar de dívida liquida.

E vale apenas destacar que não se considera ilíquida a dívida cuja importância dependa apenas de operação aritmética, e, portanto, bastaria a apresentação dos pagamentos da esfera trabalhista e o contrato ou acordo para que a dívida fosse considerada líquida.

E por fim, a corrente que defende a aplicação do caput do artigo 205 do Código Civil5, ou seja, prazo prescricional de 10 (dez) anos, tem como fundamento o fato de o direito de regresso relativo a dívida trabalhista não se encontrar elencada em nenhuma das hipóteses do artigo 206 do Código Civil, inclusive, não podendo ser tratado como enriquecimento sem causa ou reparação civil pura e simplesmente.

Filiamo-nos à esta corrente, pois, pelo estudo em tela é possível se verificar que dentre as hipóteses previstas em lei, não há aquela que trata do caso de pagamento de dívidas trabalhistas como solidário em havendo exclusividade de outro que deveria pagar, até mesmo, pois, o reconhecimento da solidariedade na esfera trabalhista não afeta o direito na seara cível, como será melhor analisada a seguir.

Esta corrente ganhou força com o acórdão proferido pela terceira turma do E. Superior Tribunal de Justiça que, por oportunidade do julgamento do RE 1.682.957/PR (2017/0155845-2), de relatoria da eminente ministra Nancy Andrighi, entendeu que "o pressuposto lógico do direito de regresso é a satisfação do pagamento da condenação ao terceiro. Assim, não se enquadrando a hipótese em nenhuma das espécies previstas no artigo 206 do Código Civil, aplica-se o prazo geral decenal de prescrição estabelecido no artigo 205".

Recentemente, em 27/4/20, o ilustre ministro Marco Buzzi da 4ª turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar, de forma monocrática, o agravo em RE 1.636.570/SP (2019/0368607-2), proferiu decisão seguindo o mesmo entendimento exarado pela 3ª turma.

Portanto, para esta corrente, o direito de regresso não tem natureza de reparação civil e tampouco de ressarcimento de enriquecimento ilícito, mas se trata, então, de "ressarcimento de prejuízos materiais impostos6" à terceiros que, na esfera cível, não são responsáveis por força contratual.

Aqui é importante destacar o conceito de enriquecimento sem causa previsto no artigo 884, do Código Civil, que dispõe que "aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários".

Nas lições do jurista Flávio Tartuce7"São pressupostos da ação que visa afastar o enriquecimento sem causa, pela doutrina clássica: o enriquecimento do accipiens (de quem recebe); o empobrecimento do solvens (de quem paga); a relação de causalidade entre o enriquecimento e o empobrecimento; a inexistência de causa jurídica prevista por convenção das partes ou pela lei; e a inexistência de ação específica."

E com este conceito, a eminente ministra Nancy Andrighi, em seu voto no julgamento do RE 1.682.957/PR (2017/0155845-2), citando a obra doutrinária do Jurista César Fiuza, consignou que "Em sua definição doutrinária, pode-se afirmar que "enriquecimento ilícito ou sem causa, também denominado enriquecimento indevido, ou locupletamento, é, de modo geral, todo aumento patrimonial que ocorre sem causa jurídica, mas também tudo o que se deixa de perder sem causa legítima".

Portanto, conclui-se, que para haver enriquecimento sem causa, necessário que haja um aumento patrimonial de outrem sem causa jurídica.

Ocorre que, para os casos de condenação solidária na esfera trabalhista, a causa existe, decorrente da própria decisão judicial proferida naquela seara, e, portanto, não aplicável para espécie de ação de regresso com esta finalidade, e por consequência, inaplicável a contagem do prazo prescricional sob esta ótica.

Na realidade, não se trata de enriquecimento sem causa, já que houve uma causa, mas sim, a reparação de danos via ressarcimento daquilo que pagou quando, por força contratual na esfera cível, não era obrigado.

Novamente, com esteio nos entendimentos do Tribunal da Cidadania, oportuno transcrever trecho de voto exarado pela 2ª seção8:

[...] "5. Nas controvérsias relacionadas à responsabilidade contratual, aplica-se a regra geral (art. 205 CC/02) que prevê dez anos de prazo prescricional e, quando se tratar de responsabilidade extracontratual, aplica-se o disposto no art. 206, § 3º, V, do CC/02, com prazo de três anos.

6. Para o efeito da incidência do prazo prescricional, o termo "reparação civil" não abrange a composição da toda e qualquer consequência negativa, patrimonial ou extrapatrimonial, do descumprimento de um dever jurídico, mas, de modo geral, designa indenização por perdas e danos, estando associada às hipóteses de responsabilidade civil, ou seja, tem por antecedente o ato ilícito.

7. Por observância à lógica e à coerência, o mesmo prazo prescricional de dez anos deve ser aplicado a todas as pretensões do credor nas hipóteses de inadimplemento contratual, incluindo o da reparação de perdas e danos por ele causados.

8. Há muitas diferenças de ordem fática, de bens jurídicos protegidos e regimes jurídicos aplicáveis entre responsabilidade contratual e extracontratual que largamente justificam o tratamento distinto atribuído pelo legislador pátrio, sem qualquer ofensa ao princípio da isonomia".

Do referido julgado, portanto, é plenamente possível se verificar que a utilização do termo reparação civil contido na hipótese do art. 206, § 3º, IV, do CC, não pode ser feita de forma ampla e irrestrita, ou seja, não abrange toda consequência negativa decorrente do descumprimento de um dever jurídico, seja patrimonial ou extrapatrimonial, mas tão somente abarca os danos causados por ato ou conduta ilícita em sentido estrito, ou seja, somente nos casos de responsabilidade extracontratual.

E assim, em síntese, para a corrente que defende a prescrição decenal (art. 205, CC) para a hipótese aqui tratada, o caso de ressarcimento de valores pagos em ações trabalhistas, não se trata de reparação civil ou enriquecimento sem causa, mas sim, de hipótese de reparação de danos por descumprimento contratual decorrente de termo pactuado que prevê a responsabilidade da empresa prestadora de serviços para com o pagamento exclusivo das dívidas trabalhistas, uma vez que a declaração de responsabilidade solidária na esfera laboral não afeta a seara cível, pela qual a solidariedade não se presume, mas deve resultar de lei ou vontade das partes, nos termos do artigo 265 do Código Civil.

E por se tratar de reparação civil contratual, é aplicável o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que "Por observância à lógica e à coerência, o mesmo prazo prescricional de dez anos deve ser aplicado a todas as pretensões do credor nas hipóteses de inadimplemento contratual, incluindo o da reparação de perdas e danos por ele causados." (EREsp 1.280.825/RJ, rel. ministra Nancy Andrighi, julgado em 27/6/18; AgInt nos EDcl no AREsp 1.002.996/SP, rel. ministro Antonio Carlos Ferreira, julgado em 16/9/19; AREsp 1.639.222/SP, rel. ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 24/8/20).

E não obstante as divergências jurisprudenciais sobre o prazo a ser aplicado no caso de ação de regresso para cobrança de valores pagos em reclamações trabalhistas cuja responsabilidade contratual é da parte que deixou de pagar, inúmeros são os entendimentos dos tribunais pátrios que defendem o prazo decenal. Neste sentido: TJ/SP – APL: 1080710-30.2013.8.26.0100, julgado em 25/10/16; TJ/SP – APL: 1044746-66.2019.8.26.0002, julgado em 11/9/20; TJ/RJ – APL: 0011170-36.2011.8.19.0209, julgado em 24/6/20; TJ/GO – APL: 0372702-61.2015.8.09.0051, julgado em 1º/3/19; TJ/GO – APL: 0346201-70.2015.8.09.0051, julgado em 7/11/19.

Assim, seguindo a lógica aplicada nos julgados supracitados, tem-se que "não há previsão específica, no artigo 206 do Código Civil, de prazo de prescrição para a demanda regressiva em razão de condenação na seara trabalhista. Inexistindo hipótese específica no rol do dispositivo mencionado, aplica-se o prazo geral de dez (10) anos, previsto no artigo 205 do Código Civil" (TJ/SP – APL: 1007654-91.2015.8.26.0132, julgado em 22/4/19).

Portanto, com a devida vênia aos entendimentos diversos, mas analisado individualmente as três correntes jurisprudenciais relativas ao prazo prescricional de ação de regresso para cobrança de dívida trabalhista, na hipótese aqui tratada, qual seja, quando há contrato de prestação de serviços com cláusula de responsabilidade exclusiva da empresa contratada, tem-se que, por se tratar de questão atinente à matéria contratual, o mais acertado, é a aplicação da regra geral descrita no artigo 205 do Código Civil, pois, como bem colocado na mais recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, o artigo 206, do Código Civil, não prevê esta hipótese.

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1 Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.

2 Art. 206. Prescreve: [...] §3º Em Três anos: [...] IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;

3 Art. 206. Prescreve: [...] §3º Em Três anos: [...] V - a pretensão de reparação civil;

4 Art. 206. Prescreve: [...] § 5º Em cinco anos: I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;

5 Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.

6 TJSP – APL: 1080710-30.2013.8.26.0100, Relator: Sergio Alfieri, Data de Julgamento: 25/10/16, 27ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/10/16.

7 TARTUCE, Flávio. Manual de Direito civil: volume único. 7. Ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2017. Pág. 243/244

8 EREsp 1280825/RJ, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/6/18, DJe 2/8/18.

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*João Paulo Micheletto Rossi é advogado do escritório CMMM – Carmona Maya, Martins e Medeiros Advogados.

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