Para o ordenamento jurídico brasileiro a personalidade civil de um indivíduo se inicia a partir do nascimento com vida, quando passa a ser um sujeito capaz de contrair direitos e deveres, ressalvados os direitos do nascituro (art. 2º, Código Civil).
Nesse sentido, foi elaborada a Lei de Registros Públicos (lei federal 6.015/73), sendo assim, de acordo com a referida legislação, para a criança que nasce com vida, mas acaba falecendo na ocasião do parto, é lavrada tanto a certidão de nascimento como a certidão de óbito. Por outro lado, para a criança que já nasce morta é realizado somente o registro de óbito fetal em livro próprio.
Vejamos o que diz o art. 53, da Lei de Registro Públicos, in verbis:
Art. 53: No caso de ter a criança nascido morta ou no de ter morrido na ocasião do parto, será, não obstante, feito o assento com os elementos que couberem e com remissão ao do óbito.
§ 1º - No caso de ter a criança nascido morta, será o registro feito no livro "C Auxiliar", com os elementos que couberem
§ 2º - No caso de a criança morrer na ocasião do parto, tendo, entretanto, respirado, serão feitos os dois assentos, o de nascimento e o de óbito, com os elementos cabíveis e com remissões recíprocas
Pelo aludido dispositivo legal, entende-se que o natimorto, isto é, aquele nascido morto, não tem o assento de nascimento lavrado e, por isso, acaba sendo retirado o direito dos pais de atribuírem um nome ao filho, ainda que não exista vedação expressa, é o que acaba ocorrendo na prática.
Tendo isso vista, recentemente, foi apresentado, perante a Câmara dos Deputados, o projeto de lei 4.899/20, de autoria do deputado federal Geninho Zuliani, que visa alterar a Lei de Registros Públicos para permitir o registro de nome e prenome de criança nascido morta.
A proposição sugere a alteração do art. 53, § 1º, da lei federal 6.015/73, para que não restem dúvidas que o natimorto tem direito a receber um nome, vejamos a redação proposta:
Art. 53: (...)
§ 1º - No caso de ter a criança nascido morta, natimora, será o registro feito no livro "C-Auxiliar", com os elementos que couberem, inclusive nome e prenome por livre opção da mãe ou pai.
O autor do projeto destaca a importância da matéria, dada a necessidade de maior proteção jurídica ao natimorto e aos seus pais, que durante a gestação preparam uma vida inteira para o recebimento do filho, sendo o nome do bebê uma das primeiras escolhas, restando evidente a importância desse registro.
Outrossim, sabe-se que o nome é um direito de toda pessoa (art. 16, Código Civil), mais do que isso, é uma forma de individualização e, portanto, intransmissível e irrenunciável. Sendo assim, apesar no natimorto não ter dado inicio a sua personalidade civil, tal direito lhe deve ser assegurado, sem mencionar, que para os pais, independentemente das circunstâncias, um filho é sempre uma identidade única que merece destaque.
Frise-se, por fim, que o projeto de lei 4.899/20, de autoria do deputado Geninho Zuliani (DEM/SP), prevê a gratuidade dos emolumentos para registrar o nome do natimorto, ademais, o deputado salienta a urgência da retificação dos assentos de óbito de natimortos que foram lavrados sem nome, caso os pais assim desejarem, sem a necessidade de autorização judicial, nos termos do art. 110, da Lei de Registros Públicos.
Atualmente, a matéria aguarda o despacho do Presidente da Câmara para iniciar sua tramitação.
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*Rachel Leticia Curcio Ximenes é bacharel em Direito pela PUC/SP. Mestra e doutora em Direito Constitucional. Presidente da Comissão Especial de Direito Notarial e Registros Públicos da OAB/SP - Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo. Advogada sócia do escritório Celso Cordeiro & Marco Aurélio de Carvalho Advogados.
*Patrícia Emi Taquicawa Kague é especialista em Direito Tributário PUC/SP. Membro da Comissão Especial de Direito Notarial e Registros Públicos da OAB/SP - Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo. Advogada do escritório Celso Cordeiro & Marco Aurélio de Carvalho Advogados.