No processo administrativo previdenciário, a ocorrência de fato superveniente levou à criação de um instituto denominado “Reafirmação da DER”, que consiste em uma alteração da data considerada para obtenção do benefício. Na esfera administrativa, as duas naturezas de reafirmação da DER estão presentes e positivadas, quais sejam, a modificação da data para possibilitar a concessão de um benefício que seria indeferido ou para permitir a obtenção de um melhor benefício.
Nesse sentido, oportuno citar o artigo 690 da instrução normativa 77/15 do INSS:
Art. 690. Se durante a análise do requerimento for verificado que na DER o segurado não satisfazia os requisitos para o reconhecimento do direito, mas que os implementou em momento posterior, deverá o servidor informar ao interessado sobre a possibilidade de reafirmação da DER, exigindo-se para sua efetivação a expressa concordância por escrito.
Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se a todas as situações que resultem em benefício mais vantajoso ao interessado. (Sublinhou-se)
Também merece referência o recente decreto 10.410/20 no tocante ao tema:
Art. 176-D. Se, na data de entrada do requerimento do benefício, o segurado não satisfizer os requisitos para o reconhecimento do direito, mas implementá-los em momento posterior, antes da decisão do INSS, o requerimento poderá ser reafirmado para a data em que satisfizer os requisitos, que será fixada como início do benefício, exigindo-se, para tanto, a concordância formal do interessado, admitida a sua manifestação de vontade por meio eletrônico.”
Art. 176-E. Caberá ao INSS conceder o benefício mais vantajoso ao requerente ou benefício diverso do requerido, desde que os elementos constantes do processo administrativo assegurem o reconhecimento desse direito. (Sublinhou-se)
Essa natureza dupla da reafirmação da DER levou à denominação do instituto como “data da perfectibilização da DIB” no livro “REAFIRMAÇÃO DA DER”1, nome que melhor contemplaria em uma só expressão ambas as situações já mencionadas. Percebe-se que na via administrativa o instrumento da reafirmação está bem organizado: possível para concessão ou para melhoria e fixado no momento da satisfação dos requisitos, ou seja, sem causar prejuízo ao segurado.
Os princípios que norteiam a reafirmação da DER apontam para a resolução mais completa e acertada da relação previdenciária. E, na esfera administrativa, estão contemplados através da própria normatização: o segurado deve receber, se possível, desde logo o benefício formado no processo previdenciário, mesmo que as condições venham em seu curso, e, além disso, da melhor forma possível. Não se poderia esperar algo distinto, já que em face da irrenunciabilidade do benefício, há de ser oportunizado na forma mais benéfica.
Processo judicial e tema 9952
De outra banda, no âmbito judicial, muitos debates ocorriam nos tribunais quanto à possibilidade da reafirmação da DER, até que momento seria possível e quais seriam as implicações da utilização do instrumento. A discussão culminou com a afetação do repetitivo 995 pelo STJ, de relatoria do ministro Mauro Campbell. A questão submetida a julgamento fora a seguinte:
“Possibilidade de se considerar o tempo de contribuição posterior ao ajuizamento da ação, reafirmando-se a data de entrada do requerimento-DER- para o momento de implementação dos requisitos necessários à concessão de benefício previdenciário: (i) aplicação do artigo 493 do CPC/2015 (artigo 462 do CPC/1973); (ii) delimitação do momento processual oportuno para se requerer a reafirmação da DER, bem assim para apresentar provas ou requerer a sua produção.”(Sublinhou-se).
Com efeito, aqui surge a primeira consideração relevante: apenas estava em discussão o tempo de contribuição posterior ao ajuizamento da demanda. Período posterior à DER administrativa mas anterior à propositura não pautou o debate, até porque já havia sido solucionado no caso de origem.
Julgado o tema, assentou-se a seguinte tese:
É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir. (Grifou-se).
A reafirmação da DER, portanto, foi, com base no artigos que determinam deva ser considerado o fato superveniente na decisão judicial (493 e 933 do CPC/15), reconhecida como possível no âmbito judicial, nas duas primeiras instâncias, superando, por este julgado, os dois principais argumentos contrários a sua aplicação judicial: a ideia de que a reafirmação seria uma forma de acesso direto ao judiciário, contrariando a necessidade do prédio requerimento administrativo; e que se configuraria em afronta ao princípio da estabilização ou estabilidade da demanda, que não permite a flexibilização do pedido no desenvolver da ação judicial, cristalizado no artigo 141 em conjunto com o 329 do CPC.
O julgado consagrou, de certa forma, a autonomia do direito previdenciário e processual previdenciário, de características peculiares. Adotou flexibilidade interpretativa e aplicou o princípio da primazia do acertamento do professor dr. José Antônio Savaris. Solucionou a questão envolvendo a estabilização da demanda atribuindo que o fato superveniente em questão deve guardar correlação com a causa de pedir e o pedido.
A concessão de benefício previdenciário em regra é o pedido. O preenchimento de seus requisitos, a causa de pedir. A soma de tempo de contribuição, bem como a soma de idade, dentre outros fatos, possui, assim, correlação com a causa de pedir. Ficou claro que há uma tolerância, um olhar mais flexibilizado, em direito previdenciário, em relação à análise da causa de pedir. E isto, também, em relação ao próprio pedido.
Isto porque o benefício concedido pode ser diverso do requerido inicialmente. Essa fungibilidade, extremamente relevante e condizente com todos os princípios previdenciários, restou devidamente consagrada também no julgado.
Embora o tema 995 não tenha, diretamente, enfrentado a questão da Reafirmação da DER Positiva (Reafirmação da DER para obtenção de um melhor benefício), ao consagrar a Teoria da Primazia do Acertamento e ao expressamente permitir a concessão de benefício diverso do requerido, acabou por munir com todos os instrumentos o segurado para a obtenção também de tal possibilidade.
Não há como conciliar todos os princípios que foram consagrados na Reafirmação da DER, com a ideia de que o segurado deve se conformar com um benefício previdenciário menor, verba alimentar e permanente, direito fundamental, por questão unicamente processual. Citamos trecho do voto do relator Mauro Campbell no próprio tema 995:
“O direito à previdência social consubstancia autêntico direito humano e fundamental, pois a prestação previdenciária corresponde a recursos sociais indispensáveis à subsistência da pessoa humana, colaborando para sua existência digna. A reafirmação da DER se mostra compatível com a exigência da máxima proteção dos direitos fundamentais, com a efetiva tutela de direito fundamental. Não se deve postergar a análise do fato superveniente para novo processo, porque a Autarquia previdenciária já tem conhecimento do fato, mercê de ser a guardiã dos dados cadastrados de seus segurados, referentes aos registros de trabalho, recolhimentos de contribuições previdenciárias, ocorrências de acidentes de trabalho, registros de empresas que desempenham atividades laborais de risco ou ameaçadoras à saúde e à higiene no trabalho.”
Oportuno citar pronunciamento da Turma Nacional de Uniformização sobre a matéria:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REAFIRMAÇÃO DA DER. BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. INCIDENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Prolatado acórdão pela Turma Recursal de São Paulo que negou provimento ao recurso do autor , mantendo a sentença que concedeu sua aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER em 03/09/2008, sem considerar o pedido de reafirmação da DER para a data em que implementou os requisitos necessários para concessão do beneficio integral. 2. Incidente de Uniformização de Jurisprudência interposto tempestivamente pelo autor, com fundamento no art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/2001. 3. Alega o autor que o acórdão recorrido divergiu do entendimento da Turma Recursal do Paraná, que admite a reafirmação da DER – processos 2009.70530061411 - segundo o qual é possível a reafirmação da DER quando isso resultar na concessão de um benefício mais vantajoso á parte autora. 4. Conheço do incidente para dar-lhe parcial provimento. 5. O acórdão recorrido manteve a sentença de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional nos seguintes termos:... 9. Incidente conhecido e parcialmente provido para devolver os autos à Turma Recursal de origem para que readequar o julgado e fixar a DER para a data em que o autor comprovou preencher os requisitos necessários para a concessão do benefício integral. (00092729020094036302, juíza federal Flávia Pellegrino Soares Millani, DOU 28/10/16.)
Noutro giro, o STJ também afirmou que a reafirmação da DER não se trata de burla ao prévio requerimento administrativo. Com efeito, o pedido administrativo existiu devidamente, porém fato superveniente trouxe alguns novos elementos a serem considerados.
Não há necessidade de pedido inicial de reafirmação da DER, tendo em vista se tratar de fato que é superveniente, muitas vezes imprevisível. Não há sucumbência se, intimado, o INSS concordar com o pedido. Porém, se continuar a oposição ao deferimento do benefício, responderá pelo ônus. Embora não tenha sido dito no julgamento do tema 995, é provável que em casos excepcionais o INSS possa ser responsabilizado, mesmo concordando com o pedido, quando houver clara demonstração que deu causa a ação (aplicação do princípio da causalidade).
Importante frisar que a reafirmação foi reconhecida como possível nas instâncias ordinárias inclusive, de forma excepcional, em embargos de declaração. Caberá à jurisprudência delimitar o que seria essa excepcionalidade. O mais importante, porém, é a referência de que será possível mesmo em embargos declaratórios.
Outro conceito aberto é o de prova complexa, tendo o acórdão referido que sua necessidade seria impedimento da aplicação do instrumento da reafirmação da DER. Porém, de outro lado, mesmo em segunda instância há a possibilidade de abertura de diligência para comprovação de algum fato, o que auxiliará bastante na busca da verdade real.
Efeitos financeiros na reafirmação da der e período anterior ao ajuizamento
Após os julgamentos do segundo momento de embargos de declaração no Tema 995, houve muita discussão na doutrina sobre o a fixação dos efeitos financeiros em se tratando de reafirmação da DER, bem como à possibilidade de reafirmação com preenchimento dos requisitos antes do ajuizamento da demanda.
Primeiro, há que ser relembrada a tese fixada:
É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir. (Destacou-se).
Além disso, vale lembrar que, conforme já referido, apenas foi afetada no tema 995 a possibilidade de se considerar o tempo posterior ao ajuizamento da ação. Não estava sob a análise a hipótese de reafirmação entre a DER original e o ajuizamento.
Não estando sob análise, a problemática de tal situação não foi nem poderia ser concluída. Por consequência, a solução para a hipótese também não. Ao referir, rapidamente, que no caso do preenchimento dos requisitos anteriormente ao ajuizamento da ação não haverá reafirmação da DER, o acórdão está a se referir ao tipo de reafirmação que está a analisar (com tempo posterior ao ajuizamento), pois conforme também referiu anteriormente: “Cumpre dizer ao embargante que o fenômeno da reafirmação da DER foi enfrentado no âmbito judicial”.
Portanto, não houve enfrentamento desse período específico pelo tema 995. Em nenhum momento foi dito ser necessário, na hipótese, novo pedido administrativo. Também não foi dito, trazido tal pedido em juízo, quais seriam as consequências. De momento, em âmbito nacional, a análise específica do tema coube à TNU, conforme julgado abaixo:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO NACIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REAFIRMAÇÃO DA DER. PEDIDO DA PARTE AUTORA PARA CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO POSTERIOR À DER E ANTES DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE DESTA TNU. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO.
(Pedido de Uniformização de Interpretação de lei (turma) 0002863-91.2015.4.01.3506, SERGIO DE ABREU BRITO - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO.) (Grifou-se).
Nesses casos, entende a TNU que os efeitos financeiros se contam da citação. Na 1ª Seção do STJ, no julgamento do Repetitivo 995, portanto, em relação a este período, por expressa menção de que a análise dava-se apenas no período judicial, bem como por não ter sido verificada a solução para a hipótese de tal caso ser requerido judicialmente, não muito se há de concluir de forma objetiva.
Mas, de outro lado, se formos analisar todos os princípios norteadores da reafirmação da DER, as necessidades que levaram a sua construção e a própria prática processual previdenciária, iremos concluir que será possível a reafirmação da DER para segurado que implementar os requisitos antes do ajuizamento.
Vejamos o seguinte exemplo prático: segurado pede a aposentadoria especial (com necessidade de 25 anos de exposição) na via administrativa. O período especial não é reconhecido. Possui os demais requisitos ao benefício. Ingressa com a ação seis meses depois. Durante todo o período, permaneceu laborando. Judicialmente, lhe é reconhecida a especialidade de 24 anos na data do pedido administrativo. E quando da sentença, já passados mais de um ano do ajuizamento (um ano e meio da DER), lhe é concedida a aposentadoria especial com a reafirmação da DER para o dia em que completou os 25 anos de exposição (momento no curso da ação).
De outro lado, esse mesmo exemplo, se judicialmente fosse entendido que na DER, ao invés de 24 anos, o segurado contasse com 24 anos e 8 meses de tempo especial, e, portanto, antes do ajuizamento teria alcançado os 25 anos necessários, seria justo não possibilitar a reafirmação da DER e extinguir o feito? Onde ficariam os princípios da efetividade, da economia processual, da primazia do acertamento? E a proteção do direito fundamental à proteção previdenciária? E a sobreposição do direito material em virtude dessa relevância e peculiaridade, conforme o próprio julgado do Repetitivo 995 referiu? Citemos trecho do voto condutor do ministro Mauro Campbell no mencionado tema, a fim de contribuir com a questão valorativa:
Em verdade, não se trata aqui de ativismo judicial, mas de efetivação do devido processo civil previdenciário. O Magistrado apoiado nos elementos de prova que lhe deram discernimento e convicção, prestará jurisdição eficiente, célere e adequada, reconhecendo desse modo a desigualdade econômica entre o segurado e a Autarquia previdenciária, permitindo com o fenômeno da reafirmação da DER, satisfazer a necessidade social esculpida na verdade material contida no processo. A exigência de proteção adequada ou integral hospeda a imposição de que a função jurisdicional se desenvolve de modo a assegurar o direito material em todo o seu significado e extensão. A jurisdição previdenciária deve satisfazer o direito de proteção social de modo célere quanto possível, fazendo coincidir a cobertura social com o imediato momento em que surge a necessidade e o respectivo direito. Este o alcance de um processo efetivo, justo, de duração razoável. Parece-me bem claro que o fenômeno da reafirmação da DER está atrelado aos princípios da primazia do acertamento da função jurisdicional, da economia processual, da instrumentalidade e da efetividade processuais, além do que atende à garantia constitucional da razoável duração do processo.
Inadmitir simplesmente a reafirmação da DER, caso o segurado implemente os requisitos antes do ajuizamento, pode gerar insegurança jurídica devido à imprevisibilidade das relações previdenciárias.
Dessa forma, diante de tudo que foi exposto, a intepretação harmônica do julgado não permite dizer que não será viabilizada a reafirmação da DER que prescinde de tempo posterior ao ajuizamento.
Quanto aos efeitos financeiros, ao já se compreender que a Reafirmação da DER abordada no tema 995 é a judicial, ou seja, com a implementação dos requisitos após o ajuizamento, é simples a conclusão. Claramente, não existem parcelas vencidas anteriormente à propositura se os requisitos para concessão foram preenchidos após esta.
Conforme a tese fixada, a reafirmação da DER será fixada “para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício””. Tal entendimento também condiz com a Teoria da Primazia do Acertamento, na forma que o próprio julgado expõe:
Outrossim, o vício da contradição ao se observar a Teoria do Acertamento no tópico que garante efeitos pretéritos ao nascimento do direito também não ocorre. A Teoria foi observada por ser um dos fundamentos adotados no acórdão embargado, para se garantir o direito a partir de seu nascimento, isto é, a partir do preenchimento dos requisitos do benefício. (Grifou-se)
Em face da adoção do princípio da primazia do acertamento, assim, não há outra alternativa senão entender que o STJ decidiu que os efeitos financeiros retroagem para a data a qual o direito foi reconhecido. Ou seja, se a reafirmação da DER se deu para uma data dentro do processo, evidente que os efeitos devem ser fixados na data do reconhecimento de tal direito. Essa é a única interpretação compatível com Teoria da Primazia do Acertamento.
Ademais, não seria possível se fixar a DER numa data e os efeitos financeiros em outra, sob pena de se desprezar o tempo de contribuição e as contribuições vertidas pelo segurado, sem reconhecer em seu favor, em contrapartida, o direito ao pagamento do benefício previdenciário.
A norma para a data de início dos benefícios de aposentadoria por idade, tempo de contribuição e especial é a data da entrada do requerimento (DER), conforme reza o art. 49, inciso II, em combinação ao art. 54 da lei 8.213/91. Quando ocorrer reafirmação da DER, a mesma regra é aplicável, ainda que com a perfectibilização do direito após o ajuizamento da ação.
Descabe também se afirmar que é da decisão que reconhece o direito que devam fluir os efeitos financeiros. Tal decisão que conhece o fato superveniente, somente certifica um direito que estava incorporado ao patrimônio jurídico previdenciário do segurado. De tal sorte, a DIB, que também demarca o início da obrigação de pagamentos, corresponde ao momento em que os requisitos do benefício estão presentes. Afastar a condenação do INSS ao pagamento desde a data do adimplemento dos requisitos, seria absurdo, já que a própria autarquia, na reafirmação considera a nova DER para fixar a data de início do benefício e dos efeitos financeiros. E, conforme referido, de forma plenamente positivada.
Tal interpretação do Tema 995 tornaria a decisão judicial injusta e prejudicial ao segurado, talvez tão gravosa quanto aquela que não conhece o fato superveniente. Por fim, beneficiaria somente o INSS, que deixaria, sem razão plausível, de efetuar o pagamento das parcelas devidas desde o implemento dos requisitos. É de ser lembrado que no próprio julgamento do referido repetitivo, em embargos, foi dito que: “O importante no caso é entender que os efeitos financeiros surgem quando do preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício, não se está enfrentando a hipótese de reconhecimento tardio do direito, mas sim reconhecimento oportuno no curso do processo”. Quando o acórdão cita que o momento de reconhecimento do direito postulado é a data inicial para pagamento, está se referindo ao momento dentro do processo judicial (pois a análise está sendo feita nesse tipo de reafirmação) que em que os requisitos foram implantados, e não, da posterior decisão que reconheceu esse momento. Sistemicamente, por tudo que foi dito no julgado e até mesmo a própria tese firmada, a expressão “sem atrasados”, dita em certa passagem do acórdão, refere-se ao período anterior a esse momento em que as condições foram preenchidas e, posteriormente, declaradas/reconhecidas pelo julgador.
Conclusão
Portanto, a conclusão mais condizente com todo o exposto e com a própria natureza da reafirmação da DER, considerando os apontamentos também do tema 995, é que o momento da implementação dos requisitos é o termo inicial para pagamento das parcelas, seja na reafirmação da DER administrativa, seja na judicial, mesmo que a implementação dos requisitos se dê em momento anterior ao ajuizamento. Essa é a interpretação do IEPREV, com o devido respeito à posição da TNU, que fixa esta última hipótese a contar da citação.
O instituto da reafirmação da DER não ficou plenamente resolvido com o julgamento do tema 995 do STJ. Existem elementos principiológicos e jurisprudenciais para utilizar em definições, mas não se pode afirmar que a há resolução de toda a temática, veja-se o caso da reafirmação da DER positiva (para melhor benefício), a qual deverá, por questão de justiça, também, ser reconhecida.
Definido está claramente, além da já referida situação do procedimento administrativo, de forma objetiva:
A) Que será possível nas duas primeiras instâncias, até mesmo em embargos (excepcionalmente);
B) Que pode implantar benefício diverso do requerido;
C) Que pode ser de ofício;
D) Que não necessita de pedido na inicial;
E) Que, em regra geral, se o INSS concordar com a reafirmação no momento em que intimado, não sucumbirá na ação;
F) Que deve guardar relação com a causa de pedir e não importar em prova complexa;
Considerando que sabidamente ocorrerão ainda muitos embates sobre a matéria, o IEPREV traz a presente nota técnica para que suas conclusões auxiliem na fixação dos entendimentos no Direito Previdenciário brasileiro.
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1 TRICHES, A.S. KIDRICKI, T.B. Reafirmação da DER. 1ª ed. São Paulo: LTr, 2018. Obra citada como referência doutrinária em voto no julgamento do tema 995 pelo STJ.
2 Referências ao Tema Repetitivo 995 do Superior Tribunal de Justiça, processos REsp 1.727.063/SP, REsp 1.727.064/SP e REsp 1.727.069/SP.
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*Tiago Beck Kidricki é diretor do IEPREV – Instituto de Estudos Previdenciários.
*Roberto de Carvalho dos Santos é presidente do IEPREV – Instituto de Estudos Previdenciários.