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A retomada do processo de revisão das Normas Regulamentadoras (NRs)

A sociedade anseia por menor burocratização e normas que confiram previsibilidade operacional e segurança jurídica.

5/10/2020

Após intenso debate, em 29/9/20, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) determinou a cessação, até o julgamento de mérito, da medida liminar que havia sido parcialmente concedida em 22/4/20, no âmbito da ação civil pública 0000317-69.2020.5.10.0009, em trâmite perante a 9ª Vara do Trabalho de Brasília.

A ação civil pública foi ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra a União Federal para essencialmente discutir a forma dita acelerada como estão sendo conduzidos os trabalhos para a revisão das Normas Regulamentadoras (NRs). Sob o fundamento de que não estariam sendo observados os procedimentos previstos na Portaria MTb 1.224, de 28/12/181, o MPT requereu que os textos técnicos fossem submetidos à consulta pública, de modo a promover a publicidade e viabilizar a análise e o encaminhamento de sugestões por parte da sociedade.

O argumento foi acolhido em parte pela 9ª Vara do Trabalho de Brasília, que proferiu decisão para determinar que a União passasse a cumprir, de forma imediata, os requisitos procedimentais previstos nos artigos 2º, incisos II e III, 4º, § 1º e § 2º, 7º e 9º, da Portaria MTB nº 1.224, de 28.12.2018, cujo descumprimento resultaria na imposição de pena de R$ 500.000,00 por norma editada, revogada, revisada ou alterada, em desacordo com os ditames da mencionada Portaria.

A União impetrou o mandado de segurança 0000344-79.2020.5.10.0000 para buscar a cassação da tutela antecipatória parcialmente deferida, o qual teve sua petição inicial liminarmente indeferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região. Ato contínuo, a União interpôs agravo interno, que igualmente teve seu provimento negado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região.

Em 10/8/20, a União então interpôs recurso ordinário com pedido de tutela cautelar. Os autos foram distribuídos para Subseção II da Seção Especializada em Dissídios Individuais.

Em decisão extremamente técnica, em 29/9/20, o Ministro Douglas Alencar Rodrigues deferiu a tutela cautelar para imprimir efeito suspensivo ao recurso ordinário no mandado de segurança 0000344-79.2020.5.10.0000, de modo a suspender a decisão antecipatória proferida na ação civil pública 0000317-69.2020.5.10.0009 até o julgamento final do mérito do mandado de segurança.

O Ministro aduziu que, muito embora o Supremo Tribunal Federal (STF) já tenha decidido2 ser viável o ajuizamento de ação civil pública para obter a declaração incidental de inconstitucionalidade de ato normativo, não se admite que tal declaração tenha efeito erga omnes. Trouxe ainda importante esclarecimento acerca da inviabilidade do controle genérico de atos normativos pela Justiça do Trabalho:

“(...) É preciso ter presente que a norma do art. 114 da CF não confere à Justiça do Trabalho competência para o exame de pedido de retirada de ato normativo do ordenamento jurídico, que é o que pretende o Parquet  nos autos da ação civil pública em que praticado o ato judicial censurado neste mandado de segurança. O controle genérico, objetivo ou abstrato de legalidade, convencionalidade e constitucionalidade  de atos normativos do Poder Público não pode ser exercido em ação civil pública trabalhista.

Para o reconhecimento da competência material da Justiça do Trabalho, é necessário que esteja em discussão a proteção do meio ambiente laboral numa situação concreta, como o STF decidiu na Rcl. 3.303-PI, intentada em face do julgamento de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho contra o Estado do Piauí, com o objetivo de impor o cumprimento de normas de higiene, saúde e segurança do trabalho no âmbito do IML local.

(...) Ora, na ação civil pública em discussão o Ministério Público do Trabalho não pretende resguardar interesses individuais homogêneos, difusos e coletivos em meio ambiente do trabalho determinado, para o que tem indiscutível legitimidade, mas afastar, genericamente, norma editada por órgão do Poder Executivo Federal.”

É esperado que, a partir da decisão (embora sujeita a exame colegiado), seja possível retomar o relevante e necessário processo de atualização das NRs, cujo ritmo estava em compasso de espera em respeito à decisão judicial. A sociedade anseia por menor burocratização e normas que confiram previsibilidade operacional e segurança jurídica.

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1 A Portaria MTb nº 1.224, de 28.12.2018, estabelece os procedimentos para a elaboração e revisão de normas regulamentadoras relacionadas à segurança e saúde no trabalho e às condições gerais de trabalho.

2 RE 424993, Relator Ministro Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, DJ 19/10/2007.

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*Alexandre Outeda Jorge é sócio de Pinheiro Neto Advogados.







*Ariane Gomes dos Santos é associada de Pinheiro Neto Advogados.







*Dérick Mensinger Rocumback é associado de Pinheiro Neto Advogados.







*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico. 

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