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Da recente decisão do STF acerca da exigência de apresentação de CND na recuperação judicial

Sabe-se que a dívida tributária de algumas empresas em recuperação judicial é milionária e equacionar referidos débitos é um desafio a ser perseguido pelas Fazendas Públicas.

11/9/2020

Em recentíssima e inédita decisão do STF, nos autos da reclamação 43.169 proposta pela União Federal, o ministro Luiz Fux deferiu a liminar pleiteada nestes autos que objetivava a cassação da decisão proferida pela 3ª turma do STJ nos autos do RE 1.864.625/SP, sob o argumento de violação da súmula vinculante 10, ou seja, afastou a aplicabilidade dos artigos 57, da lei 11.101/2005, e 191-A, do Código Tributário Nacional, sem a devida observância da regra da reserva de plenário.

Referida liminar cassou a decisão anteriormente proferida pela 3ª turma do STJ, o qual havia afastada a aplicabilidade do artigo 57 da lei 11.101/05, ora uma das regras mais polêmicas previstas na referida lei. Na origem, o processo de recuperação judicial teve o seu plano de soerguimento homologado pelo Juízo Recuperacional e, em sua decisão, desobrigado a empresa em recuperação judicial a apresentar as Certidões Negativas de Débitos Tributários.

Veja que, referida prática de dispensa da CND é prática recorrente entre os Juízos Recuperacionais, os quais afastam a aplicabilidade das normas contidas nos artigos 57, da lei 11.101/2005, e 191-A, do Código Tributário Nacional. A exigência legal, portanto, na prática é comumente afastada sob o argumento de que tal exigência contraria a finalidade precípua da recuperação judicial que é o de soerguimento da empresa em crise, bem como fere o princípio da preservação da empresa, vez que o empresário não pode sofrer prejuízos pela demora do Legislativo em editar lei específica.

Insta mencionar que a aplicação das regras previstas na lei 11.101/05 no tocante à apresentação de CND nos processos de recuperação judicial sempre foram motivos de controvérsias, de modo que, a tese defendida pela Fazenda Nacional sempre foi no sentido de que a apresentação das referidas decisões seriam imprescindíveis para a concessão da recuperação judicial.

Neste sentido é que a União Federal, nos autos da mencionada reclamação proposta perante o STF, argumentou o seu pedido liminar. Baseando-se no princípio da proporcionalidade, o ministro Luiz Fux em decisão monocrática entendeu que "A exigência de Certidão de Regularidade Fiscal para a homologação do plano de recuperação judicial faz parte de um sistema que impõe ao devedor, para além da negociação com credores privados, a regularização de sua situação fiscal, por meio do parcelamento de seus débitos junto ao Fisco. Consectariamente, a não regularização preconizada pelo legislador possibilita a continuidade dos executivos fiscais movidos pela Fazenda (art. 6º, § 7º da lei 11.101/05), o que, em última instância, pode resultar na constrição de bens que tenham sido objeto do plano de recuperação judicial, situação que não se afigura desejável."

No entendimento do ministro Fux, a exigência da apresentação da CND junto às Fazendas Públicas, ora exigência prevista em lei e que deve ser cumprida pelas empresas que estão em recuperação judicial, nada mais é do que um atestado de sua regularidade fiscal e que possui viabilidade do seu soerguimento mediante o processo recuperacional.

A bem da verdade é que, data máxima vênia, em que pese a tendência jurisprudencial se inclinar para que a norma contida no artigo 57 da lei 11.101/05 seja cumprida efetivamente e a empresa em recuperação judicial apresente sua regularidade fiscal perante as Fazenda Públicas, a realidade das empresas em recuperação judicial em nosso país é outra.

Sabe-se que a dívida tributária de algumas empresas em recuperação judicial é milionária e equacionar referidos débitos é um desafio a ser perseguido pelas Fazendas Públicas. Porém, partindo-se das premissas contidas na própria lei 11.101/05 que diz respeito à preservação das atividades empresariais, exigir a apresentação da CND para a concessão da recuperação judicial continua a ser medida temerária e arriscada.

Isto porque, seguindo a linha jurisprudencial do STJ acerca do tema – a qual nos parece mais acertada – o parcelamento tributário (consoante normas contidas nos arts. 68 da lei 11.101/05 e 155-A do Código Tributário Nacional) nada mais é do que um direito da empresa em recuperação judicial para que possa ser comprovada a sua regularidade fiscal.

A contrário sensu da decisão proferida pelo STF, a qual coloca em risco milhares de processos de recuperação judicial face a busca das Fazendas Públicas em saldarem os débitos tributários e regularizarem a situação fiscal das empresas em dificuldade, o entendimento mais acertado acerca do tema é aquele previsto pela Corte Especial do STJ (p.ex., RE 1.719.894 – RS), o qual passou a adotar o entendimento de que a inércia do legislador em editar a lei específica de que trata o § 3º do citado art. 155-A do CTN impossibilita o contribuinte de cumprir a regra do art. 57 da LFRE, não podendo ele sofrer os prejuízos decorrentes, exclusivamente, da mora legislativa.

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*Camila Crespi Castro é sócia do escritório Adriana Lucena Sociedade de Advogados, especialista na área de Direito Societário, Reestruturação Empresarial e Recuperação de Empresas e Falências, com formação pela FGV-SP. Membro da Comissão Permanente de Direito Falimentar e Recuperacional do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo; associada à TMA-Brasil; membro da INSOL; membro efetivo da Comissão de Relações Internacionais da OAB/SP.

 
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