O problema no Brasil vai além de Bolsonaro
Nos últimos tempos, o presidente Bolsonaro juntou-se a manifestações antidemocráticas, pleiteando, entre outras, a instauração de um golpe militar para fechar o congresso e o STF; forçou o desligamento de ministros, inclusive da saúde; rompeu com a figura mais popular de seu governo, Sergio Moro; viu-se rodeado de múltiplas investigações, que se estendem a seu círculo íntimo; protagonizou, junto a outros membros do governo, cenas indecorosas na reunião do 22 de abril; e foi alvo de diversos pedidos de impeachment.
Recentemente, assistiu à prisão de Fabrício Queiroz, que é apontado como operador financeiro de suposto esquema de corrupção engendrado no gabinete do filho Flávio (quando este era deputado estadual no Rio), sendo encontrado no sítio do advogado da família Bolsonaro em Atibaia. Tudo isso em meio a uma crise global de saúde pública que atinge em cheio um Brasil desconcertado econômica e politicamente.
Pode parecer a um observador menos atento que Bolsonaro estaria agora “colhendo o que plantou”, ou que o “déjà-vu” estaria limitado ao combo suposto esquema de corrupção, sítio de Atibaia, presença do Moro como peça-chave no tabuleiro político. Mas não é só. Embora o presidente tenha culpa no seu próprio infortúnio, a crise política que o país atravessa é, na verdade, o desdobramento mais atual de uma crise institucional que se protrai no tempo.
Desde que iniciou o seu primeiro período democrático legítimo, após a 2ª Guerra, o Brasil tem se debatido com o fato de que os sistemas eleitorais empregados criaram diferentes eleitorados e motivações não raro divergentes para a escolha dos Poderes Legislativo e Executivo. Essa anomalia apareceu pela primeira vez na Constituição de 1946 e continua a atormentar o país mesmo sob a égide da atual magna carta de 1988.
Legislativo e Executivo são eleitos com mandatos quase desconexos, o que complica as relações presidente-congresso e torna difícil governar com eficácia. Esse dilema recorrente tem conduzido vários presidentes por caminhos destrutivos à integridade nacional, abarcando corrupção, populismo, intimidação e apelos a soluções extralegais. Tal realidade infeliz vem levando, dia após dia, à degradação da democracia.
Independente do destino que Bolsonaro venha a ter nos anos que lhe restam de mandato, o problema vai se repetir, a menos que uma reforma institucional seja realizada.
Um problema histórico
Após a conclusão da 2ª Guerra Mundial, os militares perpetraram um golpe contra o Estado Novo. Com o fim da ditadura Vargas, um período de democratização teve início e o país adotou uma nova Constituição (1946). Pela primeira vez na história, instituições democráticas genuínas seriam combinadas a eleições realizadas regularmente. Esta fase duraria apenas 18 anos, até que um novo golpe militar ocorresse, em 1964. Foi neste período que a tal anomalia institucional primeiro apareceu.
O historiador Thomas Skidmore observou o fenômeno em trabalho datado de 1967. Segundo ele, Estados ruralistas eram sobrerepresentados no Congresso Nacional, mas esta vantagem era perdida nas eleições presidenciais. Um desequilíbrio, afirma ele, que fora criado porque, nos termos da Constituição, a representação legislativa era atribuída aos Estados com base na população, mas, o direito de voto, restrito aos alfabetizados.
No Brasil dos anos 60, quase 40% da população não sabia ler ou escrever e muitos residiam em zonas rurais. Como resultado, eleitores rurais, não raro sob a influência de latifundiários, detinham um poder enorme nas eleições para o congresso em comparação com eleitores de áreas urbanas. O mesmo, todavia, não acontecia nas eleições presidenciais, onde um sistema de voto nacional popular e first-past-the-post (pluralidade) era aplicável.
Dita divergência preparou o terreno para a deletéria desconexão entre o Legislativo e o Executivo, que viria a se tornar patente no breve termo do Presidente Jânio Quadros.
Eleito em 1960, Jânio Quadros guardava semelhanças com Jair Bolsonaro. Ele disputou a presidência baseado em uma plataforma anticorrupção e anti-sistema, não sendo produto de nenhum dos principais partidos políticos da época – embora tenha aceitado o apoio deles quando lhe era conveniente. Uma vez eleito, ele oscilou entre perseguir reformas importantes e projetos pessoais aleatórios. Sem contar com uma base sólida no congresso, Jânio entrou em linha de conflito com o Legislativo diversas vezes, pois muitos parlamentares se ressentiam das reformas anticorrupção por ele propostas.
Com somente 7 meses de governo, Jânio misteriosamente renunciou, fazendo referência a forças intransponíveis que não o deixavam governar. Historiadores citam que ele teria se inspirado no exemplo de Charles de Gaulle, na França, acreditando que seu pedido de renúncia alarmaria o congresso e o forçaria a dar-lhe poderes emergenciais. Isso não aconteceu, e sua renúncia foi aceita de pronto pelos parlamentares.
Supostamente, Jânio acreditava que a possibilidade de transição do poder para o seu vice, João Goulart, levaria o congresso e os militares a exigirem sua permanência. Goulart havia sido eleito como candidato da chapa de oposição, já que à época era permitida a votação em separado para presidente e vice, tinha fama de nacionalista econômico ardente e suspeitava-se de que tivesse inclinações comunistas. Sua ascensão causou turbulência significativa no país e ele acabaria assumindo a presidência.
Jango também impulsionou uma agenda reformista, mas, em vez de propor ações contra a corrupção, procurou combater a desigualdade com medidas controversas, sendo a reforma agrária a principal delas. Encontrando uma oposição ainda mais dura no Legislativo, optou pela via do apelo populista. Seus apoiadores construíram uma base de apoio popular formada por sindicatos e organizações de esquerda. Jango enveredou em uma estratégia de governar por decretos executivos e desafiar o congresso a recuar, enquanto viajava o país organizando comícios em favor de suas reformas.
Quando o congresso demonstrou que não iria ceder, o cunhado de Jango (Leonel Brizola, então governador do Rio Grande do Sul) e outros aliados começaram a tramar um golpe militar. Concomitantemente, lideranças militares e políticos de direita estavam orquestrando um golpe próprio, que viriam a decretar em 1964, iniciando uma ditadura militar repressiva de duas décadas no país (1964-1985).
Por óbvio, a ditadura instaurada não sofreria do mal institucional sob exame. Ao chegar ao poder, os militares impuseram um sistema bipartidário: o seu próprio partido e um partido artificial de oposição por eles criado. A ditadura suspendeu por completo as eleições populares para a presidência. Através de repressão e manipulação, os militares garantiram a manutenção do controle sobre o Executivo e o Legislativo.
O problema hoje
A questão institucional ressurgiu quando o Brasil retornou à democracia após 1985, apesar de ter havido uma renovação das instituições. A Constituição de 1988 reconheceria o direito de voto à população analfabeta, mas traria outras duas mudanças.
Primeiro, ampliou de modo significativo a arena política, permitindo uma proliferação de partidos, o que incluiu a introdução de um sistema eleitoral de representação proporcional de lista aberta. Segundo, buscou manter um grau de paridade entre os Estados e evitar que os centros urbanos populosos dominassem as zonas rurais. Assim, previu que os Estados não poderiam ter menos de 8 e nem mais de 70 representantes.
Em um país onde mais de 84% da população vive em áreas urbanas, esta aplicação de paridade significa, na prática, que os Estados rurais permanecem sobrerepresentados. Por exemplo, em São Paulo, o Estado mais populoso do Brasil, há cerca de 655.986 pessoas para cada um dos 70 representantes na Câmara dos Deputados. Em Roraima, cada um dos 8 deputados federais corresponde a aproximadamente 75.720 pessoas.
O número impressionante de partidos políticos, 30 dos quais tiveram candidatos eleitos na disputa de 2018, também demonstra que os eleitorados presidenciais e do congresso permanecem divididos. Já agora, vigora um sistema de dois turnos para eleger o presidente da República, que exige que o eventual ganhador obtenha a maioria absoluta dos votos. Um punhado de candidatos concorre à presidência e contar com apelo populista e carismático é uma necessidade virtual para que se chegue ao menos ao segundo turno, visto que afinidades partidárias costumam ser fracas no Brasil.
Por sua vez, as eleições parlamentares tendem a ser uma disputa confusa entre partidos do establishment e legendas menos expressivas, com candidatos que fazem apelos personalistas ao seu curral eleitoral baseados em apadrinhamento e clientelismo. A falta de lealdade partidária dos políticos e as alianças instáveis denotam que a afiliação a uma legenda diz pouco aos eleitores sobre as ideias defendidas por determinado candidato.
Em consequência, as disputas no congresso são quase desligadas das eleições presidenciais e as motivações para os poderes eleitos sob esta realidade são igualmente díspares, ocasionando que cada um deles governe com uma agenda própria.
A natureza personalíssima das campanhas presidenciais nesta nova era da democracia usualmente significa que os eleitores têm altas expectativas de mudanças quando seus candidatos vencem, sem em geral compreender as dificuldades de governabilidade geradas pela forma de composição do congresso.
Nenhum presidente exemplifica a situação descrita melhor do que Luiz Inácio Lula da Silva. Ao alcançar a vitória em 2002, Lula tornou-se o primeiro presidente oriundo da classe trabalhadora. A sua legenda, o Partido dos Trabalhadores, é uma raridade no país como um verdadeiro partido de base, que nasceu de organizações sindicais e de sua resistência à ditadura militar. A esperança pelas melhorias que poderiam advir desta transferência de poder povo-representante eleito abundava como nunca antes.
Para muitos, Lula cumpriu suas promessas e conseguiu ser eficaz ao construir uma coalizão robusta no congresso - a qual, como no governo anterior, dependia da oferta de posições e cargos em troca de apoio no congresso, o vulgo “toma-lá-dá-cá”. O lado obscuro dessas alianças veio a público em 2005, no escândalo do Mensalão. Uma investigação no âmbito do congresso revelou um esquema massivo de compra de votos tocado pelo PT, que viabilizou o alcance desta coalizão através de pagamentos mensais feitos a parlamentares de outros partidos para assegurar seu apoio.
A investigação acabou resultando em acusações contra 40 suspeitos e derrubou membros da alta cúpula do PT e do governo Lula. A distância ideológica e histórica do PT em relação a outros partidos provavelmente tornou a compra de votos uma necessidade maior (não que isso servisse de justificativa). Independente de juízo de valor, a realidade é que o PT não inovou, “apenas” sistematizou um processo que se tornara rotina na política brasileira para permitir alguma efetividade administrativa.
Após deixar a presidência, Lula foi substituído pela sua escolhida, Dilma Rousseff. Beneficiada pelos resultados positivos da Era Lula, Dilma alcançou popularidade significativa em seu primeiro mandato. Lastreados neste apoio popular, Dilma e o PT tentaram governar com um grau menor de divisão de poder, esperando que sua administração poderia contornar as armadilhas e alcançar uma governabilidade efetiva sem trade-offs excessivos ou apelos a métodos antidemocráticos.
Não era para ser. Quando o Brasil foi abalado pelo escândalo de corrupção revelado pela Lava Jato e pela crise de 2014, a popularidade de Dilma despencou. Aliados de sua coalizão no congresso começaram a desertar e o processo de esfacelamento do governo culminou com o seu impeachment, juridicamente motivado por uma tecnicalidade orçamentária – as chamadas “pedalada fiscais”, também vistas em governos anteriores.
O vice-presidente e sucessor de Dilma, Michel Temer, pertencia a um dos partidos políticos mais tradicionalmente arraigados ao sistema, o PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro, que depois passou a se chamar MDB), o qual abandonou a coalizão que formava o governo tão logo foi instaurado o processo de impeachment.
Após a saída de Dilma, Temer assume a presidência. Apesar de sua ínfima aprovação popular, na casa dos 5%, e de enfrentar diversas acusações de corrupção, Temer contava com uma vantagem determinante. Ao contrário do que era praxe para um presidente eleito, ele compartilhava laços com o congresso. O alinhamento entre presidente e congresso, tão difícil de obter quando da escolha através de eleições regularmente efetuadas, era uma realidade no governo Temer.
Não à toa que em seus dois curtos anos no poder, o congresso não apenas o salvou ao menos duas vezes de sofrer processos de impeachment, mas também permitiu que ele aprovasse uma série de reformas relevantes, entre elas uma revisão do sistema educacional, da legislação trabalhista e um teto de gastos públicos.
Bolsonaro promete acabar com a “velha política”
Bolsonaro chega à presidência em 2019, após uma campanha baseada em suas supostas credenciais anticorrupção e anti-sistema, criticando a decadência dos governos petistas e exaltando as virtudes de uma imaginada era de ouro vivida durante a Ditadura Militar.
Malgrado exibisse características da política tradicional, como seus 29 anos de carreira legislativa (1989-2018), ao longo dos quais foi afiliado a vários partidos do Centrão, não logrando aprovação de qualquer projeto de relevo; e a presença em peso do clã Bolsonaro no cenário político, a exemplo de tantas outras famílias incrustadas na política pátria, Bolsonaro prometeu inaugurar uma nova forma de fazer política.
Ele não distribuiria favores ou subornos e sequer daria cargos para assegurar apoio no congresso. Em vez de formar qualquer coalizão ou aliança, construiria maiorias para cada proposta individualmente considerada. O que, não obstante contrariasse a praxe da era do presidencialismo de coalizão introduzido durante a redemocratização, não era algo sem precedentes. O ex-Presidente Fernando Collor (1990-1992) havia tentado estratégia semelhante, em grande parte sem sucesso, até ser alvo de processo de impeachment, depois de ter sido descoberta corrupção em seu governo.
Bolsonaro ainda foi auxiliado por dois acontecimentos nesta suposta busca pela nova política. Primeiro, ele fora responsável por seu então partido, o Partido Social Liberal (PSL), garantir 52 assentos no congresso, em comparação aos 8 que detinham anteriormente. Segundo, uma mudança no sistema eleitoral recém-instituída prometia varrer o número excessivo de partidos ao retirar pequenos participantes da disputa.
Na realidade, tais eventos revelam a profundidade do déficit institucional no Brasil. Enquanto o partido de Bolsonaro ganhou 52 assentos, o total de vagas na Câmara é de 513, o que o deixa 205 votos aquém da maioria. O PT, que manteve o maior quinhão, conseguiu apenas 56 posições. Já a nova regra eleitoral conseguiu eliminar só 9 dos 30 partidos que obtiveram cadeiras nas eleições parlamentares de 2018.
O novo congresso, dominado por partidos outros que não o do presidente, nunca abraçou a ideia de uma “nova política” e a falta de coalizões e alianças. Já Bolsonaro tem se mostrado um administrador inábil e um mau negociador, notadamente em termos de relações parlamentares, com frequência entrando em rota de colisão com o Senado, a Câmara e o Presidente da Câmara. A relação de Bolsonaro com o congresso se mostrou tão difícil que ele acabou deixando o seu próprio partido e passou a sofrer oposição de inúmeros antigos colegas de legenda.
Um breve exemplo ilustra este relacionamento ruim. A ampliação do direito à posse e porte de armas de fogo talvez tenha sido uma de suas mais visíveis promessas de campanha. Logo no início de seu governo, ele tentou instituir as reformas desejadas por meio de decretos executivos, que foram derrubados pelo congresso. Conquanto certos segmentos do Legislativo defendam o relaxamento das regulações sobre armas de fogo (como a “Bancada da Bala”), os líderes parlamentares não aprovam os métodos de Bolsonaro para passar tais alterações, tampouco sua recusa em negociar. Até hoje, nenhuma legislação neste sentido foi aprovada.
Tendo falhado em contornar o congresso por decreto, Bolsonaro tem testado outras formas de desviar-se do mesmo. Ex-capitão do exército e admirador da ditadura, não é de hoje que ele patrocina táticas autoritárias. Recentemente, passou a adotar comportamentos ainda mais perigosos do ponto de vista do Estado Democrático de Direito, com ataques às instituições, especialmente o congresso e o STF.
Sob crescente pressão em virtude de sua resposta falha à pandemia da Covid-19, o presidente vinha participando de protestos com demandas como "Fora, Maia", "AI-5", "Fecha o congresso", "Fecha o STF", “Intervenção militar com Bolsonaro no poder”, entre outras ilegais, inconstitucionais e antidemocráticas. Além das manifestações aos domingos no Palácio do Planalto, uma das mais emblemáticas foi a ocorrida em abril do lado em frente a um quartel-general do exército conclamando os militares a executarem um golpe. Durante o evento, Bolsonaro declarou: “nós não queremos negociar nada”.
Logo após esta manifestação, em 24 de abril, o Ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro, peça fundamental na eleição de Bolsonaro, renunciou ao cargo acusando o presidente de tentar interferir em investigações da Polícia Federal para blindar seus filhos. Citou, ainda, falta de comprometimento do governo com o combate à corrupção. O episódio acarretou ondas de choque no mundo político e levou a uma enxurrada de pedidos de impeachment de Bolsonaro, alguns apresentados por ex-correligionários.
Embora o presidente negue ter parte na organização de tais protestos, sua mera presença representa um endosso arrepiante das mesmas. Não fosse o suficiente, ele seguiu entoando declarações ultrajantes à democracia, quer em transmissões ao vivo, quer nos rotineiros bate-papos com apoiadores na entrada do Palácio da Alvorada. Fato é que o discurso vinha se arrefecendo à medida que o cerco se fechava.
Vendo-se subitamente exposto e incapaz de contornar o congresso ou minar o sistema democrático, tem restado a Bolsonaro deslizar em direção a uma presidência tão convencional quanto repudiada nos tempos de campanha. Ele então se aproxima de uma coalizão informal de partidos de centro-direita ideologicamente vagos que detêm uma porção substancial de assentos no congresso – o velho conhecido Centrão.
Forçado à submissão, começa a oferecer cargos e favores em troca do suporte e proteção desses partidos no congresso (“mais Brasília e menos Brasil”). Mesmo ao custo de barganhar com figuras como Valdemar da Costa Neto e Roberto Jefferson, ambos condenados no Mensalão; e de criar novos ministérios, como o das Comunicações – já são 23 no governo que, além de moralização e escolhas técnicas, prometera a redução do tamanho do Estado e apenas 15 ministérios.
O Centrão, habituado a circundar o Poder, independente de quem esteja nele, tacitamente parece concordar com o movimento - ao menos até que lhe seja interessante, enquanto Bolsonaro ganha sobrevida e vê seus pedidos de impeachment permanecerem parados na Câmara, não obstante a pressão da oposição.
O Foco
Retomando ao foco principal desta análise, a atual crise política do Brasil é institucional, mas também é histórica. O impeachment de Bolsonaro poderia até ser justificado do ponto de vista político ou jurídico, e é inegável que diversas de suas atitudes têm sido repugnantes do ponto de vista da democracia.
Todavia, é crucial que os brasileiros e seus representantes políticos entendam que, quer o impeachment, quer o perdão a Bolsonaro, não irão resolver a crise do país. E mais: se Bolsonaro fosse removido do poder, isto significaria que dos 5 presidentes eleitos desde a redemocratização, 3 teriam sido retirados por impeachment.
Apenas uma reforma institucional que aproxime os Poderes Legislativo e Executivo pode fornecer uma solução estabilizadora de longo prazo. Há uma miríade de reformas possíveis e cabe aos formuladores de políticas públicas escolher qual ou quais caminhos seguir. Soluções variam, por exemplo, de um reforço do sistema eleitoral à mudança para um sistema parlamentar.
Em última análise, o Brasil tem muito mais do que apenas o problema Bolsonaro a solucionar.
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*Versão em inglês também disponível no Brazil Report.
*Contribuiu Dídimo Pinheiro.
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*Jonathan Madison é doutorando na Universidade de Oxford e pesquisador de História do Brasil.
*Livia Lopes é professora e pesquisadora de Direito e Política; diretora assistente na Latin American and Iberian Initiatives (Universidade George Washington e Universidade Católica da América).