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A família humana é uma produção cultural?

A família é peça fundamental da sociedade e negar seu papel natural é a destruição da civilização humana.

6/5/2020

Vivemos tempos em que as leis da natureza são observadas apenas para o que não está intrinsecamente ligada ao homem, ou seja, para explicar os fenômenos do ambiente externo ao ser humano. Pois submeter a vontade humana à lei da natureza parece um grande equívoco. Um exemplo disso é a própria existência da família humana, em que se viraliza como instituição criada pelo homem, ou seja, uma produção cultural.

Mas será? Vejamos: uma das instituições mais antigas do mundo, que tem, inclusive, sua perpetuação promovida por aspectos naturais, seria isso uma invenção cultural?

A família pode ser abordada por várias áreas da ciência: biológicas, antropológica, sociológica, filosófica, religiosa e jurídica.

Interessa-nos o debate jurídico, dado que esse nas últimas décadas vem se comportando como um definidor de conceitos, o que implica em diversos conflitos legislativos e até mesmo constitucionais, sem contar no fomento de celeumas sociais, por meio das bandeiras ideológicas que tomam contam das pautas midiáticas.

Conhecer a finalidade da família é primordial para que o direito ingresse no debate “Família”. Alguns doutrinadores, buscando a supremacia do Direito, acabam por usar a ciência do Direito partindo do que é apenas visível, ou seja, do comportamento atual das pessoas nos relacionamentos, sem considerar o que motivam os denominados novos relacionamentos, bem como esquecendo que existem verdades imutáveis.

Contribui, como premissa inegável, a abordagem religiosa sobre a finalidade da família, quando de acordo com as escrituras bíblicas o projeto originário de Deus para o gênero humano seria a vida em comunhão, paz e concórdia perfeita para os homens.

Corrobora o entendimento o teólogo Padre Paulo Ricardo quando aduz que “O ser humano, traz em seu coração, animado por uma alma espiritual, muito mais do que desejos e carências orgânicas; há nele um anseio mais fundamental, que prazer físico nenhum pode substituir, qual seja: amar e ser amado.” (PAULO RICARDO. Curso: o que é família. 2015).

Não se está usando a compreensão religiosa para fundamentar o Direito, pelo contrário, o fato de não se ter argumentos que conteste tal premissa valida essa compreensão para o mundo do direito.

Do ponto de vista antropológico, a finalidade guarda relação com a discussão sobre o parentesco (RIVIÈRE, 1995:69). A sociedade se baseia em grau de parentesco, uma vez que cada sociedade define quem é parente e o grau de parentesco que cada indivíduo desempenha, seja pela via de consanguinidade, por afinidade ou por adoção “O parentesco confere ao indivíduo a identidade social perante ao grupo”. (BERNARDI, 1974).

Assim, a finalidade da família motiva a própria existência humana, tanto no que consiste a perpetuação da espécie por meio da procriação, quanto pela sobrevivência das mesmas, em que a sociedade precisa de uma forma de organização, que atualmente denominados de Estado.

É inegável a variedade que se tem atribuído ao conceito de família, muitas vezes influenciada pela perspectiva temporal. Contudo, há um elemento chave imutável procriação e organização social.

A família pode ser considerada a unidade social mais antiga do ser humano, a qual, historicamente, mesmo antes do homem se organizar em comunidades sedentárias, constituía-se em grupos de pessoas relacionadas a partir de um ancestral comum ou através do matrimônio.

Não se pode ignorar no conceito de família a presença de um conteúdo moral e ético. Interessante é a abordagem da Professora Regina Beatriz em Moral e Família são concêntricos ou excêntricos? (disponível aqui).

Pois, a moral precede as condutas e se manifesta por meio dessas condutas, logo os relacionamentos humanos não podem ignorar esse conteúdo. Corrobora a Professora Regina Beatriz quando “a Moral do Direito de Família, são concêntricos, com o mesmo centro, embora o maior círculo seja o da Moral. Por isto, a Moral serve de base ao Direito de Família.”

A moralidade das condutas humanas já engloba diversas normas jurídicas, não sendo sua presença nas relações familiares novidade, conforme legislações e jurisprudências. Sinaliza, portanto, que o conceito de família não se restringe a criação humana, mas sim a precedentes naturais.

A linguagem jurídica já tratou de família em sentido restrito, quando o vocábulo abrangia tão somente “o casal e prole”. Houve sua ampliação, quando da compreensão dos vínculos das pessoas ligadas pela consanguinidade, segundo critério de cada legislação. E mais amplo ainda quando há os elos socioafetivo, ao lado dos vínculos de sangue, como determinantes da existência da relação familiar (Diniz, Maria Helena: 2015).

Não se contesta a abrangência que o Direito pode dar ao conceito de família, até para fins de regulamentação em outras searas do Direito, mas para o direito de família existe um regime jurídico próprio, que não é o mesmo do previdenciário, trabalhista, administrativo.

A relação familiar para fins previdenciário e administrativo envolve um aspecto tão somente de seguridade social, para o Direito do trabalho o aspecto de sustento laboral, mas para o Direito de Família envolve uma gama de interesses, obrigações, liberdades, deveres, não podendo receber a creditação de uma abordagem para a ciência do direito.

Assim, verifica-se uma narrativa de construção de novos enfoques familiares partindo de uma realidade social, econômica e cultural de auto-supremacia humana, liberdade extremada, consumismo doentio, mantença pelo poder, sem contar com a desconstrução da finalidade da instituição familiar. Devemos estar atentos aos anseios da supremacia humana, há limites, a família é peça fundamental da sociedade e negar seu papel natural é a destruição da civilização humana.

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*Grazielly dos Anjos Fontes Guimarães é bacharel em Direito, especialista e mestre em Direito, doutoranda em Ciência Jurídico Políticas. Vice-presidente da ADFAS - Associação de Direito de Família e das Sucessões no Rio Grande do Norte.

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