Deseja-se que todos estejam bem, pois há de se vencer (ou melhor superar) essa pandemia.
Não se sabe, todavia, quando será o final dessa triste história e, a cada dia que passa, os efeitos econômicos se tornam mais devastadores. Como já se viu em posts nas redes sociais, quando isso tudo acabar (infelizmente) haverá mais falidos do que falecidos ou, em outra versão, serão cancelados mais CNPJ’s do que CPF’s.
Esse não é, contudo, um artigo alarmista e muito menos futurologista, mas se destina a apontar que, a par de existir previsões legais, a boa fé e a mediação serão instrumentos primordiais para solução de conflitos.
Como todos já estão a discutir, as consequências do isolamento social (bem) imposto pelas autoridades não tardarão a chegar, vez que já nos próximos dias, no início de abril, alcançar-se-ão as datas para pagamento de salários, alugueis, contas de consumo, parcelas de dívidas etc.
Mas...
O lojista não está auferindo renda e não conseguirá pagar seus funcionários e nem o aluguel do shopping. O shopping não terá como pagar suas despesas e nem o salário de seus funcionários. Os funcionários da loja e os do shopping não receberão salário e não pagarão suas contas (aluguel, escola, contas etc.)... Imagine-se, agora, o que está ocorrendo com as receitas das empresas aéreas, hotéis e agências de turismo. Quantas pessoas entenderão correto não pagar a academia de ginástica, afinal, não houve uso (contraprestação), o mesmo ocorrendo com os profissionais autônomos que ganham por tarefa (diaristas, dentistas, manicures, taxistas, professores particulares, personal trainers etc.).
Os problemas atingirão a todos, indiscriminadamente, na forma de efeito dominó e, infelizmente, quando a vida voltar ao normal, muitos serão judicializados.
Há anos se debate não só as possibilidades de revisão contratual fundadas na imprevisibilidade (art. 317 NCC), onerosidade excessiva (art. 478 NCC) e também na restrição ao uso dos imóveis locados (art. 567 NCC), como também o conceito de força maior como causa de (também) revisão ou mesmo excludente do dever de cumprir a obrigação.
Seria o caso?
Sim. Todavia, seria bastante utópico imaginar que – na vida real – todos conseguissem negociar aplicando as citadas teorias e, no efeito dominó inverso, as peças caídas voltassem ao lugar, com os contratos proporcionalmente revistos e alterados sem a participação de um terceiro, outsider, que na maiorias das vezes é o (abarrotado) Poder Judiciário.
O momento não é de soluções simples ou prontas, com fórmulas matemáticas mágicas.
A pandemia não tem efeitos de curar a desonestidade e, lamentavelmente, muitos tentarão levar vantagem nessa crise. Noutras negociações, independentemente de espertezas, as partes – por suas diferentes situações econômicas e visões de vida - não chegarão a um consenso acerca da melhor forma de continuar a relação comercial. Para esses casos, a Justiça será o caminho natural e a taxa de congestionamento (índice que mede a dificuldade dos Tribunais em lidar com seu estoque de processos) aumentará, ocasionando a demora na entrega do resultado, ensejando, naturalmente a piora da situação (animosidade + gastos extras com custas e advogados + tempo indefinido sem solução).
É imprescindível pôr em prática a boa-fé e a compreensão de que todos precisarão ceder um pouco e negociar caso a caso sem tentar se sobrepor a outra parte. Talvez nunca a máxima “melhor um mau acordo do que uma boa briga” tenha se apresentado como tão verdadeira e, mais do que isso, necessária.
Estando as partes comprometidas em solucionar de forma justa o conflito, devem, no caso de não se atingir um denominador comum, procurar um terceiro que possa (profissionalmente) ajuda-las e, exatamente, para isso foram criadas as Câmaras de Conciliação e Mediação (Lei 13.140/2015).
Os Tribunais, por sua vez, terão papel importante para evitar enxurradas de ações, implementando, divulgando e incentivando as possibilidades de soluções pré-processuais (realização de sessões e audiências de conciliação e mediação prévias), bem como a criação de campanhas e programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a auto composição, tudo como descrito no art. 24 da mencionada lei.
A pandemia atingiu a todos e no futuro será exemplo corriqueiro no estudo dos contratos. Para os dias de hoje, as conclusões são de que é difícil acreditar que o Poder Judiciário esteja (instrumentalmente) preparado para resolver todas as questões (individuais) e que, quem quiser uma solução no tempo adequado deve considerar (fortemente) negociar na base de concessões recíprocas e, em não se alcançando o acordo, que busquem terceiro imparcial para auxiliar e estimular a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia.
Fiquem bem!
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