Migalhas de Peso

Reparação por danos morais e o atraso no pagamento das verbas rescisórias

Diante desse cenário, surge a discussão se o atraso na quitação das verbas rescisórias dá ensejo à reparação por danos morais.

1/4/2020

Como é de conhecimento no meio jurídico, em algumas demandas propostas perante a Justiça do Trabalho, é deduzido o pleito de reparação por danos morais, diante do atraso no pagamento de verbas rescisórias.

O fato é que o tema é bastante delicado, notadamente quando as parcelas rescisórias são de extrema importância para a sobrevivência do empregado dispensado.

Realmente, não são raras as vezes, que os valores devidos seriam ou são destinados para cobrir despesas pessoais e familiares, ou seja, para a manutenção financeira até surgir nova oportunidade no mercado de trabalho.

Já em outra direção, muitas empresas se encontravam ou se encontram com extrema dificuldade para arcar com os custos do empreendimento, compreendendo nesta situação o pagamento das verbas decorrentes de rompimento de contrato de seus empregados, o que pode levar ao inadimplemento.

Diante desse cenário, surge a discussão se o atraso na quitação das verbas rescisórias dá ensejo à reparação por danos morais.

Inicialmente, cumpre ressaltar que existe diferença quando se trata de atraso no pagamento de salário, de forma reiterada, ou no pagamento das verbas da rescisão contratual.

No caso de atraso reiterado no pagamento de salários predomina o entendimento de que, por não existir uma penalidade específica, o fato gera presunção de dano ensejando indenização por danos morais.

E, para tanto, sustenta-se que essa circunstância afeta a sobrevivência do empregado, configurando, sem a necessidade de comprovação, a ofensa à dignidade do trabalhador, levando o mesmo a uma possível situação de miserabilidade e inadimplência para com as suas obrigações.

Nesse sentido, a título de exemplo, posicionou a Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho em sede de Recurso de Revista:

RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.015/2014. ATRASO NO PAGAMENTO DE VERBAS RESCISÓRIAS. ATRASO NO PAGAMENTO DE UM MÊS DE SALÁRIO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. A jurisprudência desta Corte já sedimentou entendimento no sentido de que o atraso no pagamento das verbas rescisórias, por si só, não configura dano moral. Tal entendimento se justifica por já existir penalidade própria na lei trabalhista contra essa conduta (art. 477, § 8.º, da CLT). Assim, quanto ao inadimplemento das verbas rescisórias, deve ser demonstrada lesão que abale o psicológico do ex-empregado, apto a afetar sua honra objetiva ou subjetiva, o que não se verifica na hipótese. Por outro lado, a jurisprudência desta Corte também se orienta no sentido de que apenas o atraso reiterado no pagamento de salários evidencia dano moral in re ipsa. Contudo, no caso concreto, restou incontroverso o atraso salarial de junho de 2016, ou seja, atraso ocorrido em um único mês do contrato de trabalho. Assim, não houve reiteração da mora salarial a justificar a reparação por dano moral pretendida na inicial, sem que tenha havido registro de outros danos concretos que tenham advindo dessa conduta. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (RR-10932-08.2016.5.15.0143; Rel. Min. Delaíde Miranda Arantes, 2ª Turma, DEJT 30.05.18) (Grifo nosso).

Por outro lado, quanto se trata de ausência ou inobservância do prazo para quitação do acerto rescisório, o entendimento predominante no Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que o mero atraso ou inadimplemento, desacompanhado de prova configurando o dano, não induz afronta aos direitos fundamentais e não gera indenização por danos morais, considerando, especialmente, que existe em nosso ordenamento jurídico penalidade ou sanção a ser aplicada para quem age dessa forma.

Nessa hipótese, para dar ensejo à indenização, é necessária a demonstração da violação à honra, à reputação, à intimidade ou imagem por parte daquele que busca eventual ressarcimento. Confira-se os seguintes julgados:

RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. ATRASO NO PAGAMENTO DAS VERBAS RESCISÓRIAS. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ATO ILÍCITO. O mero inadimplemento de verbas rescisórias não induz afronta aos direitos fundamentais da personalidade do empregado, previstos no art. 5.º, X, da Constituição Federal. Para o acolhimento do pedido de pagamento de indenização por dano moral, exige-se comprovação efetiva de algum fato objetivo a partir do qual se possa deduzir o abalo moral sofrido. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido, no aspecto. (TST-RR-911- 32.2012.5.03.0018, Relator: Ministro Walmir Oliveira da Costa, 1.ª Turma, DEJT 02.07.18.)

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS ADVINDOS DA FALTA DE PAGAMENTO DE PARCELAS RESCISÓRIAS. AUSÊNCIA DE PROVAS DE DANO ESPECÍFICO, APTO A AFETAR A HONRA, A IMAGEM OU OUTRO ASPECTO DO PATRIMÔNIO MORAL DO TRABALHADOR. A jurisprudência desta Corte entende ser indevida a reparação civil quando inexiste uma circunstância objetiva que demonstre a existência de qualquer constrangimento ao trabalhador, capaz de atingir sua honra, imagem ou intimidade, causando-lhe lesão de natureza moral. Nesse contexto, a jurisprudência tem feito a distinção quanto a atrasos salariais e o rescisório. Assim, tem considerado pertinente o pagamento de indenização por dano moral nos casos de atrasos reiterados nos pagamentos salariais mensais; porém, não tem aplicado a mesma conduta quanto ao atraso na quitação de verbas rescisórias, por existir, na hipótese, apenação específica na CLT (multa do art. 477, § 8.º, CLT), além da possibilidade da incidência de uma segunda sanção legal, fixada no art. 467 da Consolidação. Desse modo, no caso de atraso rescisório, para viabilizar a terceira apenação (indenização por dano moral), seria necessária a evidenciação de constrangimentos específicos surgidos, aptos a afetar a honra, a imagem ou outro aspecto do patrimônio moral do trabalhador. Na hipótese, o Regional reformou a sentença por asseverar que ‘nenhuma verba rescisória foi paga ao reclamante, visto que o ônus de comprovar seu escorreito pagamento dentro do prazo era da reclamada, por se tratar de fato extintivo do direito autoral’. Desse contexto, portanto, constata-se que não foi evidenciada nenhuma circunstância objetiva que demonstre a existência de dano capaz de atingir a honra, imagem ou intimidade do obreiro, não há falar em dano moral a ser reparado. Julgados. Recurso de revista conhecido e provido quanto ao tema. (TST-RR-637- 23.2017.5.17.0012, 3.ª Turma, Relator: Ministro Maurício Godinho Delgado, DEJT 04.10.19.).

AGRAVO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.015/2014. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DAS VERBAS RESCISÓRIAS. A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento no sentido de que o atraso ou ausência de pagamento das verbas rescisórias, por si só, não enseja a indenização por danos morais, sendo necessária para a configuração do dano a existência de efetiva lesão à esfera moral do empregado, com demonstração efetiva dos prejuízos causados à imagem e à honra do trabalhador, o que não restou comprovado nos autos. Precedentes. Agravo não provido. (...) (TST-ARR 100809-92.2016.5.01.0451, 5.ª Turma, Relator: Ministro Breno Medeiros, DEJT 13.09.19.)

Entendemos que esse posicionamento é o que está coerente com o nosso Ordenamento Jurídico vigente.

Efetivamente, em caso de atraso no pagamento das verbas rescisórias, existem penalidades específicas a serem aplicadas, consoante artigos 477 § 8° e 467 da CLT1.

Conclui-se, portanto, que para a percepção de indenização por danos morais, quando ocorrer o atraso no pagamento das verbas rescisórias, a jurisprudência majoritária, ao interpretar a lei, entende que é necessária a comprovação do dano sofrido.

_____________________________________________________________________

1 Art. 477. Na extinção do contrato de trabalho, o empregador deverá proceder à anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social, comunicar a dispensa aos órgãos competentes e realizar o pagamento das verbas rescisórias no prazo e na forma estabelecidos neste artigo.

§ 8°: Sem prejuízo da aplicação da multa prevista no inciso II do caput do art. 634-A, a inobservância ao disposto no § 6º sujeitará o infrator ao pagamento da multa em favor do empregado, em valor equivalente ao seu salário, exceto quando, comprovadamente, o empregado der causa à mora. (Grifo nosso)

Art.467: Em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de cinquenta por cento. (Grifo nosso).

_____________________________________________________________________

*Orlando José de Almeida é advogado sócio de Homero Costa Advogados.

*Bernardo Gasparini Furman é advogado associado de Homero Costa Advogados.

 

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

“Salve o Corinthians”

24/12/2024

Comentários ao acórdão proferido no RE 107.248 sobre terço de férias

26/12/2024

A utilização da inteligência artificial no franchising

24/12/2024

Comentários ao anteprojeto do Código de Processo do Trabalho - Do incidente de declaração de grupo econômico (art. 115)

25/12/2024

Reforma tributária: PLP 68/24 é aprovado pela Câmara dos Deputados

25/12/2024