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O acordo de não persecução penal com o advento da lei 13.964/19

O modelo de justiça negocial será a tônica do momento, onde a justiça criminal não objetiva tão somente a punição do agente infrator, mas, sobretudo, a reparação dos danos causados.

11/3/2020

A lei 13.964/19, popularmente conhecimento como “Pacote Anticrime”, inseriu o artigo 28-A no Código de Processo Penal, onde permite a aplicação do instituto do “acordo de não persecução penal”.

Em linhas gerais, trata-se de um instrumento concebido no âmbito inquisitorial, a ser oferecido de acordo com a discricionariedade regrada do órgão ministerial e como mecanismo de evitar a propositura da ação penal.

Cumpre destacar que, os acordos com o Ministério Público não consistem em uma previsão recente da legislação, porquanto, com a lei 9.099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, já havia a possibilidade de transação penal para infrações de menor potencial ofensivo, ou seja, nos casos em que a pena máxima cominada ao delito não ultrapasse dois anos. Ainda nesse sentido, o artigo 89, da lei 9.099/95 possibilita a aplicação da suspensão condicional do processo, proposto pelo Ministério Público, por dois a quatro anos, para crimes em que a pena mínima for igual ou inferior a um ano, bem como, também já havia a possibilidade de acordo no que diz respeito à colaboração premiada, previsto na lei 12.850/13.

Esse modelo de justiça penal consensual já ocorria desde 2017, com fundamento na resolução 181/17 do Conselho Nacional do Ministério Público1, posteriormente alterada pela resolução 183/172.

Com a chegada do artigo 28-A do Código de Processo Penal, acrescido pela lei 13.964/19 – Pacote Anticrime, foi possível abranger o acordo de não persecução penal com o Ministério Público, em caso de infração penal praticado sem violência ou grava ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, em que não seja caso de arquivamento, bem como tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de tal infração.

Uma das finalidades do acordo de não persecução penal, além de garantir uma maior celeridade, eficiência e economia processual, tem o condão de reparação do dano à vítima, ao passo que uma das condições para a propositura do acordo é a de reparação à vítima, salvo impossibilidade de fazê-lo.

Nesse sentido, Rogério Sanches e Renee do Ó Souza lecionam que3:

O Acordo de Não Persecução Penal não implica qualquer desvantagem ao ofendido, notadamente nos crimes em que ele é bem definido, visto que o primeiro requisito para a celebração do Acordo de Não Persecução Penal é a necessidade imperiosa de reparação de danos sofridos o que atende seus interesses imediatos e à moderna tendência criminológica de revalorização da vítima no processo penal.

Para a propositura do acordo de não persecução penal, além dos requisitos acima elencados, é necessário algumas condições ajustadas cumulativa e alternativamente, quais sejam: I) reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo; II) renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; III) prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução; IV) pagar prestação pecuniária, a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito ou, V) cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.  

Há de se destacar, inclusive, que para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o Caput do artigo 28-A, nos termos do §1º, serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto.

Já no que tange a inaplicabilidade do acordo de não persecução, importante ressaltar que a lei veda a incidência de tal instituto nos casos em que: I) for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei; II) se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; III) ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo e IV) nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.

Após a formalização escrita do acordo de não persecução penal, para que haja homologação, será realizada audiência para esta finalidade, oportunidade em que o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, bem como a legalidade do acordo.

Caso o Magistrado considere inadequada, insuficiente ou abusiva as condições dispostas no acordo, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta, com anuência do investigado e seu defensor.

Após a homologação do acordo, o §6º, do artigo 28-A, dispõe que “Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal”. Nesse ponto, merece crítica, pois, o ANPP jamais poderia ser executado na Vara de Execução Criminal, tendo em vista que em tal vara se executa tão somente a pena e não medidas despenalizadoras. É tão errado colocar o ANPP na Vara de Execução Criminal, quanto seria colocar na Vara de Execução Criminal, cumprimento de transação penal e suspensão condicional do processo.

Nesse contexto, após a crítica ao legislador quanto ao cumprimento do acordo de não persecução penal na Vara de Execução Criminal, tem-se que o ANPP é uma das coisas mais bem vindas do Pacote Anticrime, notadamente pelo caráter despenalizador que possui, ao passo em que amplia uma série de medidas alternativas, porém, sem a necessidade do processo penal, mitigando o princípio da obrigatoriedade da ação penal.

Conclui-se, portanto, que o modelo de justiça negocial será a tônica do momento, onde a justiça criminal não objetiva tão somente a punição do agente infrator, mas, sobretudo, a reparação dos danos causados, numa espécie de modelo restaurativo, bem como, onde os defensores ganham espaço para se tornaram negociadores, sempre em prol dos interesses de seus constituintes.

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1 Disponível em: Clique aqui. Acesso em: 06 de março de 2020.

2 Disponível em: Clique aqui. Acesso em: 06 de março de 2020.

3 Um panorama sobre o acordo de não persecução penal (art. 18 da resolução 181/17-CNMP, com as alterações da resolução 183/18-CNMP). In Acordo de não persecução penal/coordenadores Rogério Sanches Cunha, Francisco Dirceu Barros, Renee do Ó Souza, Rodrigo Leite Ferreira Cabral – 2ed. – Salvador: Editora JusPodivm, 2018.

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*Leopoldo Gomes Moreira é advogado, vice-presidente da Comissão de Direito Penal e Processo Penal da Subseção da OAB/MG de Varginha, e sócio da banca Chalfun Advogados Associados.

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