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Juiz de garantias, uma realidade ou um ideal?

Só mesmo uma postura autoritária e ultrapassada pode se colocar contra essa mudança, que busca a melhora no processo penal, sendo uma experiência que se provou de ótima valia em uma das maiores e mais acionadas comarcas do Brasil, São Paulo.

2/1/2020

A implementação do juiz de garantias no ordenamento jurídico brasileiro consta no artigo 3º da lei 13.964/19,  publicada no Diário Oficial de 24 de dezembro, é uma das alterações aprovadas no famigerado “Pacote Anticrime” que é vista com bons olhos pela comunidade de juristas, a uma pois o juiz é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais, a duas pois preserva a imparcialidade do juiz que julgará o feito. 

Apesar de ser apresentado como uma novidade, o juiz de garantia já é uma realidade em São Paulo há mais de 30 anos, o Departamento de Inquéritos Policias (DIPO) que, obviamente, não é um mero gestor burocrático de cumprimento de prazos de investigação e sim, uma complexa estrutura que atua no inquérito velando pelo respeito à legalidade e impedindo abusos investigatórios. Com isso, se impõe a imparcialidade do juiz que julgará a causa, que não atuou na fase investigativa. Portanto, o juiz que atua na fase do inquérito autorizando medidas cautelares como prisões, busca e apreensões, além de escutas telefônicas e ambientais; acaba viciando seu olhar, por ter uma relação direta com o que é produzido na investigação. De certa forma sua visão do processo fica profundamente comprometida com o que viu, ouviu e produziu. Esse juiz, quando sentenciar, não será imparcial. Ele está contaminado pela própria atuação na fase investigativa.

A separação entre o juiz que atua na fase investigatória e o que ouvirá as testemunhas e julgará o processo é de extrema importância para se garantir a sua imparcialidade e um julgamento mais próximo do imparcial. “É extremamente positivo não misturar a figura do juiz que decide questões ligadas à investigação com quem vai julgar o processo”, opina o juiz substituto em segundo grau Marcelo Semer, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

“A ideia básica é distinguir o juiz que procede toda a investigação e estabelece medidas cautelares do juiz que julga propriamente. Isso existe em vários países”, define o presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) e professor da USP Renato Silveira.

A alteração, por outro lado, foi criticada pelo ministro da Justiça, Sergio Moro. O Ministro da Justiça pediu ao Presidente que vetasse a medida porque, de acordo com nota encaminhada à imprensa, “não foi esclarecido como o instituto vai funcionar nas comarcas com apenas um juiz (40 por cento do total); e também se valeria para processos pendentes e para os tribunais superiores, além de outros problemas”.

O sistema, há mais de 30 anos, funciona muito bem em São Paulo, agora em Manaus também existe um departamento com a competência idêntica a do Juiz de Garantias. Outros Estados da Federação também estão colocando em prática essa separação entre o juiz da fase de inquérito e o que julgará a causa. Garante-se não apenas a imparcialidade do último, mas a especialização do primeiro.

Só mesmo uma postura autoritária e ultrapassada pode se colocar contra essa mudança, que busca a melhora no processo penal, sendo uma experiência que se provou de ótima valia em uma das maiores e mais acionadas comarcas do Brasil, São Paulo.

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*Renato Reis Aragão é sócio no escritório Reis Aragão Advogados, pós-graduado em Direito Penal Econômico pela FGV, professor assistente em Processo Penal na PUC-SP

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